1. O Marquês de Canterbury

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O canto dos passarinhos naquele fim de tarde era a melodia da hora do chá. O céu azul tinha poucas nuvens de algodão espalhadas aqui e ali e a brisa morna daquela hora do dia soprava em suas bochechas como se fosse um beijo de mãe, caloroso e confortante. Os arbustos espalhados pelo jardim estavam floridos, a paisagem estava colorida e o cheirinho de bolinhos recém saídos do forno subia da tigela de porcelana francesa delicadamente pintada à mão com motivos de flores e ouro. Vez ou outra era possível ouvir um relincho dos cavalos que passeavam na rua na frente do casarão e a sombra provocada pelas árvores fazia com que a mesinha de chá fosse um lugar agradável para se estar sentado.

Mexeu a colher de prata dentro da xícara, diluindo o cubinho de açúcar, e logo a pousou no pires, pegou a xícara pela alça e a levou aos lábios róseos e gordinhos. Deu um gole breve na bebida e fez uma careta de desgosto antes de colocar um pouquinho de leite e finalmente aprovar o sabor. Sorriu amoroso para o garotinho do outro lado da mesa, que bebia de seu chá com um dedinho levantado.

Aquele tinha se tornado um momento corriqueiro desde que chegaram a Londres, há apenas uma semana. Apreciavam tomar o chá da tarde ali – nos dias em que não chovia – e era ótimo sentir a brisa gostosa em seus cabelos longos. Seus dedos pálidos e compridos repletos de anéis pegaram um bolinho e ele deu uma mordida generosa, não havia comido nada desde o almoço e estava com muita fome.

— Milorde. — ouviu e virou a cabeça para Rose, sua empregada mais leal e também uma grande amiga. Ainda não devia ter trinta anos, dona de cabelos loiros presos em um coque apertado e suas expressões rígidas e severas escondiam uma mulher de coração muito doce. Embora nascida na Inglaterra, sua ascendência era escandinava e às vezes ele pensava que Rose era a personificação de uma valquíria. — Prefere veludo ou pele para o baile desta noite?

— Pele, por favor. — falou com graça. — Quero que meu retorno à sociedade seja... impactante.

Rose assentiu e retornou para dentro do casarão. Harry sorriu ao olhar para a moradia grande e luxuosa muito bem equipada com tudo que existia de tecnologia doméstica em 1902. Soltou um suspiro ao se lembrar de quando pisou ali pela primeira vez, logo após seu casamento, e ergueu o olhar para a janela do quarto principal, onde foi sua noite de núpcias, mas no momento era um cômodo ocupado por um ômega solitário. Seu casamento durou pouco, apenas cinco anos, porque seu marido contraiu febre tifoide em uma viagem para o continente e faleceu antes mesmo de retornar para casa.

Harry vinha de uma família rica e pertencente à baixa nobreza, seu pai era barão e tinha grande prestígio na alta sociedade londrina. Sua irmã mais velha, Gemma, e ele, ambos ômegas, foram criados como o esperado para o período, seus pais investiram milhares de libras em sua educação para que estivessem preparados para o evento mais importante na vida de um ômega: o casamento. Desde cedo aprenderam normas de etiqueta, livros cultos e a tocar instrumentos musicais, foram ensinados a serem graciosos e muito educados, elegantes e finos. Sua mãe era muitíssimo exigente e não aceitava as reclamações dos filhos quando as crianças diziam que os tutores estavam sendo severos demais, mas mesmo assim continuaram e praticaram e – na força do ódio – se tornaram ômegas requintados, graciosos e muito bem preparados para o matrimônio.

Sua irmã, por ser mais velha, foi apresentada à sociedade antes dele e foi doloroso ver Gemma, sua melhor amiga e pilar, se casar com um duque de algum lugar que ele não fazia questão de lembrar. Não que não estivesse feliz por sua irmã, gostava bastante do cunhado e ele a tratava muitíssimo bem, mas foi horrível para o rapaz ver quem mais amava sair de casa para seguir sua própria vida. Felizmente, mantiveram-se em contato frequentemente, trocaram muitas cartas e foi ótimo quando o telefone finalmente chegou às casas dos mais nobres, uma ligação para a telefonista e estavam conectados, poderiam ouvir a voz um do outro mesmo longe e aquilo era maravilhoso. Ela estava casada há dez anos, seu duque era um bom alfa, embora tivesse certo problema com a competitividade, mas fora isso era uma pessoa agradável, um bom marido e ótimo pai para os dois filhos que tinham.

De Volta a Londres | Larry Stylinson Onde histórias criam vida. Descubra agora