"mulherzinha"

21 3 0
                                    

    Estava sentado em sua cama sem camisa, olhando para o céu azul através da janela aberta. O céu estava sem nuvens à vista, o dia estava com o clima moderadamente quente e uma brisa fria entrava pela janela e balançava levemente a cortina de seu quarto. Já tinha se acostumado com a sensação fria do estetoscópio em contato com a pele quente de suas costas.

    — Respire fundo— o doutor falou e Deidara o fez.

    Não via a necessidade de receber visitas do médico, sendo que poderia apenas ir até a cidade e se encontrar com ele em seu consultório. Quando sugeriu isso, sua mãe lhe repetiu diversas vezes que sua saúde era frágil e que aquilo deveria ser ideia do garoto estranho de quem o filho era amigo. Deidara já havia desistido de conversar com os pais sobre a maioria dos assuntos com os pais e apenas aceitava as vindas do médico em silêncio. Porque não tinha outra opção.

    Esperava que o homem fosse embora logo que terminou e pendurou o estetoscópio no pescoço. Estava errado.

    Sentiu as mãos asquerosas do velho roçando em sua nuca enquanto ele mexia nos seus cabelos. Tencionou todos os músculos do seu corpo e prendeu a respiração. Seu coração começou a acelerar e cogitava correr e pular pela janela ou atirar o homem pela janela.

Passava os dedos pelos fios loiros, e Deidara se segurava para não chorar. Sentiu a respiração quente em seu pescoço e sentiu o gosto de bile subindo pela garganta. Deu uma cotovelada enquanto se virava rápido, e o homem balançou a cabeça atordoado.

— Não encoste em mim de novo, seu merda. Nojento do caralho— se afastou rápido, vestindo a blusa. Abriu a porta e saiu gritando— MÃE, TERMINAMOS!

O loiro foi ao banheiro e ficou lá até ter certeza de que estava sozinho no andar superior, foi para o quarto e se trancou. Se jogou na cama e ficou lá olhando para o teto, com raiva e nojo. Não queria descer e dar de cara com o homem e sua mãe o enchendo com as mesmas perguntas de sempre sobre seu estado clínico; se fosse para o andar debaixo teria que responder algumas perguntas direcionadas para si, além de olhar para o sorriso pervertido direcionado para si. Na lâmpada havia uma teia de aranha com um único inseto preso a ela, Deidara de certo modo sentia empatia pela mosca.

Na hora do jantar se viu obrigado a sair de seu quarto, descer e se juntar aos pais para comer. Praticamente se arrastou até chegar ao meio dos degraus onde parou, ainda atrás da parede, por escutar seus pais conversando. Quando notou que o assunto era ele, acabou percebendo que era uma discussão.

— Já te falei, querido. Nosso filho não tem condições para ir à guerra, não importa o quanto você queira— a voz feminina falava com certo alívio enquanto se escutava barulho de louças e panelas, provavelmente, pondo a mesa.

— Não é questão de eu querer. É questão de ser uma honra servir o país! Proteger nossa nação e acabar com os ratos que querem destruir ela!—— falou com tom de repreensão— É questão de ser um homem de verdade!

— Nosso filho é um homem!

— Se você não tivesse me dado um filho doente, ele seria um homem de verdade— acusou a voz masculina subindo o tom.

— Eu não tenho controle da saúde dele— a voz feminina soou como se estivesse se desculpando.

— Não estou falando só sobre as condições físicas deploráveis dele. Tô falando de tudo. Do corpo magrelo, do cabelo grande e de não conseguir nem respirar direito; isso tudo já é um grande problema e, para piorar, ainda tem aquele garoto estranho que vive grudado no seu filho. Ao menos ele consegue servir ao país como um homem.

— Nosso filho— corrigiu exasperada— o Deidara é nosso filho!— colocou uma panela de maneira mais forte sobre a panela— E agora que aquele garoto se foi, Deidara vai ficar melhor agora. Sem ele para o influenciar.

Deidara ouvia tudo irritado. Mantinha os punhos fechados com força sobre o joelho, o maxilar cerrado, as próprias unhas sendo fincadas nas palmas de sua mão, a respiração pesada, o olhar desfocado e a falta de atenção às palavras que estavam sendo ditas para poder controlar sua raiva.

Se levantou de uma vez e desceu o restante das escadas pisando pesado para que os dois notassem que estava chegando e tivessem a decência de trocar de assunto. Passou pelo pai sem o olhar e se sentou à mesa em silêncio. Colocou pouca comida em seu prato já que a raiva tinha acabado com seu apetite e queria subir para ficar sozinho em seu quarto o mais rápido possível.

A maior parte do jantar foi quieto, com o silêncio sendo preenchido apenas pelo som dos talheres em contato com os pratos. Antes que Deidara pudesse terminar, seu pai quebrou o silêncio.

— Que bom que cortou o seu cabelo. Assim não fica mais parecendo uma mulherzinha.

A mulher pigarreou irritada, não gostava de brigas e não queria uma discussão na hora do jantar. O marido apenas a ignorou e continuou focado em Deidara.

— A ida daquele seu “amigo” pro exército serviu de alguma coisa. Você deveria ter ido também, assim tomava jeito logo e virava um homem de verdade— falou com tom de desdém.

— Chega! Não quero esse tipo de conversa durante o jantar— a mulher falou já irritada com o rumo que sabia que aquele diálogo tomaria.

— Ora, mulher! Pare de passar a mão na cabeça desse moleque!— bateu o punho na mesa com força, fazendo algumas louças se sacudirem e assustando a moça— Por sua culpa esse menino é frouxo desse jeito! Se não fosse por você, esse menino seria normal— apontou irritado para Deidara.

— Deixa ela de fora disso!— Deidara finalmente se pronunciou, falando baixo e firme— Ela não tem nada haver com eu ser assim.

— Se ELA— acusou furioso e apontou para a mulher que já estava com os olhos marejados— fosse capaz de gerar um filho saudável, eu não teria o desgosto de ter essa família— praticamente cuspiu as palavras que escorriam como veneno seus lábios.

Deidara bateu as mãos na mesa com força e se levantou de supetão. O rosto dele estava avermelhado pela raiva.

— Se quiser culpar alguém por eu ser assim, culpe você mesmo! Por que se você não fosse a porra de um viciado em cigarro eu não seria doente!

Um tapa estalado fez com que Deidara se calasse. Sua mãe implorava para que ambos parassem de discutir. E seu pai voltou a se sentar, acendeu um cigarro e soprou a fumaça em seu rosto.

Saiu a passos pesados para seu quarto e bateu a porta com força antes de a trancar. Encostou na porta, colocou os dedos entre os fios loiros de seu cabelo e se agachou lentamente até o chão.

A uma carta de distância (Obidei - TobiDei)Onde histórias criam vida. Descubra agora