Não quero esquecer que eu fui uma mãe

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No momento que percebi que o berço estava vazio e a janela escancarada, movendo as cortinas com o vento frio da noite, meu coração disparou. Por um momento, meu corpo pareceu se atrasar antes que alguma parte animal de mim gritasse para se mover, adrenalina me estimulando com uma sensação de desespero juvenil.


Comecei a vasculhar por toda a casa, procurando nos quartos e nada. O meu marido ainda estava assistindo o resto do futebol americano, e não percebeu a minha agitação.  Não conseguir dizer nada até confirmar que o meu filho, o nosso bebê, havia sumido.


"Cadê o nosso bebê, Linklater!?" - ele olhou para mim e franziu a testa.


"Como assim? Do que você está falando...? Não deveria ter o colocado para dormir a essa hora?" - levantou-se e começando a ficar pálido. Foi até a cozinha onde o casal, os nossos amigos, estavam lavando os pratos da janta.


Ele começou a perguntar o que havia acontecido com bebê, nitidamente contagiado pelo meu desespero. Eu estava bem atrás dele, segurando as lágrimas. Kate e Zach ficaram confusos e atordoados, disseram que a última vez que viram o bebê, eu estava o levando para dormir.


Começamos a procurar pela casa mais uma vez por algum vestígio. Então, os detalhes começaram a surgir: havia um prato cheio na mesa como se estivesse aguardando por alguém. Não havia nada além de nós quatro o dia todo. Fizemos a coisa mais sensata para o momento: ligar para as autoridades.


Enquanto falava com o despachante e contava minha experiência da melhor maneira possível no meu estado, percebi quando o rosto de Zach empalideceu, e a sua namorada acompanhou a expressão de horror, eles disseram milhões de coisas quando fitaram na minha direção. Eu senti que tem alguma coisa a ver com o desaparecimento. De repente, o celular se tornou pesado e difícil de segurar, e eu fui na direção dos dois, chamando o meu marido que logo me acompanhou.


Kate disse que tinha alguém estranho nas fotos do piquenique. É normal por aqui as famílias irem para próximo do bosque para acampar, aproveitando os dias ensolarados.


Kate começou a passar o dedo na tela do celular, mostrando dezenas de fotos. Logo percebemos a presença de um homem com a pele bronzeada e roupas surrados, ele estava em pé nos observando longe, depois estava próximo e se juntou ao grupo. Estávamos concluindo isso pela sequência dos registros. Depois ele começou o que parecia interagir conosco. Um latejar na cabeça denunciou as lembranças que começaram de forma surreal. Comecei a lembrar daquele cara, achei que fosse uma nova amizade dos nossos companheiros, e eles disseram, enquanto estamos observando perplexos, que acharam que eu e o meu marido havíamos convidado uma terceira pessoa.


O meu marido lembrou, ou as memórias que foram apagadas de alguma forma das nossas mentes, começaram a voltar, de um vídeo que havia gravado. Disse que era para as "recordações do primeiro piquenique do bebê" e, para o que eu não posso dizer que era uma surpresa, aquele homem estava também lá.


Linklater estava animado falando sobre o dia ensolarado e fazendo piadas sobre os nossos amigos o tempo todo agarrados, soltando beijos e com aquelas piadinhas de início de um relacionamento, e lá estava um homem sentado com as pernas cruzadas próximo do bebê dentro da caminha. Ele estava mordendo e engolindo um pão plastificado para espantar as formigas de forma selvagem. A gravação se aproximou do sujeito, já que o meu marido estava tentando filmar o bebê, e ele levantou-se rapidamente como se tivesse sentindo ameaçado: em seus olhos, não vi nada além de veneno, era algo predatório, parecida com um cão. Ele pareceu ter percebido que estava saindo do seu personagem e sorriu para a filmagem, entrando na conversa. Era surreal, quase impossível, como nós estávamos interagindo com o estranho, como se fizesse parte do nosso círculo, e ele sabia muito bem fazer isso.

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