An boró na ton do, boreí na me dei kai aftós

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Se eu posso vê-lo, ele também consegue me enxergar

A luz solar atingiu parcialmente meu rosto insistindo em transpassar as folhas da árvore cuja me apoiava em suas raízes. Abri meus olhos lentamente, senti minha garganta clamar por água, sentia-a seca e arranhando.

Levantei-me com dificuldade, uma vez que todo o meu corpo doía intensamente, talvez fosse a pior do que senti até hoje, até mesmo pior do que quando fraturei a clavícula, que nem mesmo para engessar podia.

Voltava para a casa após um longo dia exaustivo na escola, tinha preso em meus lábios uma música, como sempre. Passei saltitante à frente de um parque, naquele horário costumava estar vazio, e neste dia não foi diferente. Decidi desviar rapidamente de meu rumo para balançar em um dos brinquedos, cinco minutinhos de intervalo de caminhada não seria problema. Sentei-me na tábua pintada com tinta vermelha suspensa por correntes metálicas, com o impulso dado pelos meus pés fui para frente e para trás, para frente e para trás, para frente e para trás, repetidas vezes, até perceber que além do som das correntes rangendo e do vento sussurrando contra meu ouvido existia miados, parei bruscamente e me coloquei de pé, olhei ao redor buscando os vestígios do emissor e notei de que na copa de uma árvore tinha um animalzinho, me aproximei lentamente, tentei estender a mão e fazer um caminho seguro para o gatinho descer, todavia ele parecia assustado demais para tal coisa, além da minha baixa estatura de um pré adolescente de 11 anos não ajudar em nada. Respirei fundo e escalei aquela o tronco, com muita dificuldade, não existindo muitos apoios para me ajudar em minha tarefa, em pelo menos seis minutos estava pendurado no mesmo galho que a criatura. Com cuidado envolvi o gato em meus braços, ganhei de presente naquele instante alguns arranhões pelas unhas afiadas do bicho, mas não me  importei, o problema veio o momento de descer, eu parecia estar muito mais alto que antes, e senti que não ia conseguir sair dali, tão pouco com somente uma mão, decidi não pensar muito e pulei, mas infelizmente não aterrissei de maneira correta, acabei enfiando meu ombro na terra para proteger o ser em meu colo, que no mesmo instante que toquei o solo saiu correndo em disparada para alguns arbustos, eu, por minha vez, fiquei mais um tempo deitado daquela forma gemendo de dor.

Com dificuldade consegui levantar-me, coloquei a mochila apoiada no ombro esquerdo, e retornei com lágrimas em meus olhos para casa, quando cheguei minha mãe já estava sentada na sala, impaciente preocupada com o motivo de meu atraso, quando contei o que ocorrera ela botou-me no carro e dirigiu até o hospital, o caminho foi pautado de um sermão chato que me fez ter vontade de revirar os olhos várias vezes, mas por educação não o fiz.

Aquela fratura doeu muito, e ficou naquele estado por muito tempo, mas foi suportável, já que tinha minha consciência limpa por ter feito algo que me orgulhava, sabia que aquele gatinho estava bem em algum lugar, então valeu a pena. Além da presença de minha progenitora, que levava comida ao meu quarto, me ajudava a me trocar e eu não me sentia sozinho.

Não tinha certeza de minha atual localização, segui em busca do rio a partir de minha intuição e da experiência adquirida no dia anterior, não me aproximei do centro do vilarejo não vi estradas ou pessoas, preferi evitá-las ao máximo, caminhei entre as árvores que pareciam maiores que antes, mais densas, mais assustadoras.

Com minha mão esquerda nas costas fiz uma figa, e torci para não me perder ou ser encontrado por um animal selvagem.

Achei o caminho com facilidade depois que escutei o som de água corrente, a minha atual audição é esplêndida.

Bebi do líquido ajoelhado à margem e aproveitei para lavar meu rosto e desembaraçar os cabelos sedosos com os dedos.

Encarei fixamente meu reflexo um pouco tremido, devido ao movimento do lago, nos olhos, e senti como se realmente fosse o meu rosto, mesmo com a aparência totalmente distinta a minha anterior, falei baixo "Noé", e o nome soou bem em meus lábios, este é o meu nome, de alguma forma parecia se encaixar.

Eu Vou te TrairOnde histórias criam vida. Descubra agora