Capítulo 2

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Domenico

O sonho de perseguir uma carreira na advocacia está no sangue da minha família. Meu bisavô, meu avô e meu pai foram advogados. Eu e minha irmã decidimos pelo curso de Direito antes mesmo de sermos alfabetizados.

A diferença entre mim e eles é: o que me move não é somente a paixão; é também a obsessão.

Sou obcecado por trabalho. Se não estou trabalhando no escritório, fundado por meu avô trinta anos atrás, que, ao longo dos anos, se especializou em Direito Empresarial e Tributário, estou debruçado sobre processos, documentos investigativos, pareceres, no meu apartamento.

Aperto as pontas dos dedos nos olhos, projetando as costas contra o encosto da cadeira.

Devo ter batido meu próprio recorde de horas trabalhadas nas últimas sete semanas. Isso explica minha enxaqueca incurável e minha insônia crônica. Dormir quatro horas por noite está longe de ser suficiente para descansar um cérebro hiperativo como o meu.

Levanto-me e me encaminho até a máquina de café no fundo da minha sala. Não são nove horas da manhã e estou na terceira xícara.

É me entupir de cafeína ou fumar. E eu larguei o cigarro faz seis meses, quando meu pai — que fumou como uma chaminé por mais de vinte anos — descobriu o câncer de pulmão. Abandonei o vício porque Nicolas Vieira Souto me pediu. E eu nunca neguei nada para meu pai. O cara era meu herói. Ainda é.

Beberico o café, enquanto prendo a atenção no tráfego pesado que trava a Avenida Paulista, quinze andares abaixo. Mas minha contemplação não dura muito. Bárbara Vieira Souto, a advogada que atua na área tributária do Vieira Souto Advogados, adentra minha sala.

— Ei, você já está aí! Bom dia, maninho.

Babi — uma cópia minha na versão feminina (à exceção dos olhos esverdeados), alta e com seus cabelos escuros espessos (cortados um pouco abaixo dos ombros), cinco anos e nove meses mais nova — também é conhecida como minha única irmã que vale por dez.

— Bom dia — respondo, sucinto.

— Domenico e seu mau humor crônico, um não anda sem o outro — Bárbara me cutuca, sardônica. Ela é mestra nisso.

— Desisti de conciliar o sono às quatro da manhã e vim para o escritório. — Bebo o resto do café e volto à minha mesa, sentando-me de frente para minha irmã. Nunca caio em suas armadilhas. Encerrei nossas briguinhas na minha adolescência, quando nosso pai se viu perdido, sozinho, na criação de dois filhos.

— Você veio para o escritório às quatro?

— Às cinco.

— Domenico, excesso de trabalho pode matar, sinto te informar e estou repetindo essa informação há semanas, mas você não me leva a sério. Faz mais de um mês que você não treina comigo na academia. E você não é mais um menino. Já vai fazer trinta e seis anos daqui a quatro meses!

Não impeço meu sorriso. Bárbara me provoca, mas é protetora em relação a mim; como sou com ela. Nós nos amamos do nosso jeito.

— Eu pretendo pisar no freio... mas não será agora. Estou no meio do processo de investigação de uma fraude licitatória, você sabe.

— Esse caso está complicado, não? — Ela franze a testa e as sobrancelhas, num tique muito semelhante ao que possuo.

— Pra caralho. Meu cliente está escondendo de mim algo importante, mas, por mais que o pressione, não consigo descobrir o que é.

— Eu te entendo. Esse tipo de coisa acontece para todos os advogados de todas as áreas. Estou incluída nessa estatística, claro.

— Você falou com a mãe? — decido mudar de assunto.

Quando o amor chegou [DEGUSTAÇÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora