Capítulo 3

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AVISO: 

Gente, vocês vão notar que transformei o capítulo 1 em prólogo. Fiz isso para deixar bem marcada a passagem de tempo de sete semanas entre os eventos ❤

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Heloísa

POSITIVO

Meus olhos estão passando por essa palavrinha, escrita no resultado do exame beta HCG que estou segurando, há incontáveis segundos. É como se eu estivesse tentando decifrá-la. Como se ela estivesse num idioma que não domino.

Eu estou mesmo grávida.

E já devo estar na nona semana de gestação.

Busco o rosto da minha avó. Eu e ela estamos sentadas na recepção do hospital de Recanto do Sossego. Viemos para cá depois do almoço e já passou do horário da janta (não podíamos arredar o pé daqui enquanto o exame não ficasse pronto). Marcelo está, como um cão de guarda, nos vigiando do lado de fora. Essa foi a condição que Arcanjo estabeleceu para nos deixar sair da fazenda. Mas meu padrasto acredita que vó Carlota estava precisando de atendimento médico urgente. Se falássemos a verdade, só Deus sabe o que poderia acontecer a mim e ao meu bebê.

Só Deus sabe o que vai acontecer agora.

— Não vou conseguir esconder essa... — olho ao redor; a sala está vazia — gravidez por muito tempo, vó. Logo entro no terceiro mês. E preciso começar o pré-natal.

— Aquele demônio não vai deixar você sair da fazenda pra ver um médico, minha menina. Você tem que aproveitar que estamos longe do domínio dele e fugir. Vá pra São Paulo e procure a Lizete na Vila Ré. Ela deve morar lá ainda. E era nossa vizinha mais querida.

— Não vou a lugar algum sem a senhora. E nós não temos um centavo pra ir a canto nenhum. — Encaro o teto, segurando as lágrimas. — Como pode em pleno século vinte e um as mulheres ainda terem a liberdade tolhida por um homem? Como um homem pode se achar dono da vida de uma mulher?

— Os homens que são o tal do sexo frágil, meu bem. Eles são inseguros e sabem o quanto nós, mulheres, somos fortes e inteligentes. Por isso nos calam, nos prendem e nos matam. Eles têm medo de nós. A maioria deles, pelo menos.

Suspiro, encostando a cabeça na parede atrás da cadeira.

— E eu não tenho muita noção de como é o pai do meu bebê. Parece um bom homem, apesar de mal-humorado. Mas a gente não conversou muito naquela noite. O cara não estava a fim de conversa, eu é que fiquei puxando papo, a senhora sabe como eu sou.

— Uma maritaca.

Rio. Devo ser a única mulher que ri numa situação como esta: grávida, sozinha, sem dinheiro, sem experiência profissional consistente e escravizada na fazenda de um boçal.

— Nada pode garantir que o Domenico vai querer assumir a paternidade do nosso bebê. Ou... se ele vai acreditar que o filho é dele. Não desejo casamento, vó. Eu jurei que não me casarei enquanto não adquirir minha independência financeira. Além disso, nem conheço direito esse advogado. Mas... criar uma criança sem apoio nenhum vai ser dureza.

— Eu estarei ao seu lado, Helô. Estou velha, não sou de muita utilidade, mas não te deixarei só.

— Não fale assim. A senhora tem toda utilidade do mundo! E eu te amo demais. — Abraço-a, fungando. Já chorei tanto nos últimos três dias que não sei como ainda tem água para sair do meu corpo.

Quando o amor chegou [DEGUSTAÇÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora