O silêncio costumava ser o meu grito mais alto..
Estou aqui no meio do escuro fitando com dificuldade o lugar espaçoso que um dia palco de um sonho e uma trajetória, se eu tivesse a chance de escolher o que melhor define meu coração seria o que está aqui diante dos meus olhos, esse local bagunçado com poeira até no teto e onde tudo está quebrado, desde os móveis velhos ao que sobrou da pequena vidraça no canto esquerdo. Não há nada que possa reutilizar, nada que valha pena dar atenção, nada. Tudo está em ruínas e quebrado.
Quebrado assim como eu.
Puxo a vassoura e a pá de plástico os colocando de lado e arrasto o saco plástico preto por todo o piso rachado, é um tremendo esforço e o suor escorre por minha espinha. Há cacos de vidros espelhados em cima de uma mesa inutilizada. Encosto na madeira olhando o que deveria ter sido um copo, se eu encontrasse cada pedacinho que falta e com toda a paciência do mundo o colasse, ele voltaria a ser o que foi antes?
Não, não voltaria.
Por um minuto, um minuto inteiro finjo que nada está me abalando e ferrando com a estrutura da precária vida que construí, sou mesmo uma tonta por seguir fingindo e caindo? Sou uma fraca por não conseguir me erguer por conta própria? Sou uma manipuladora com monstros de companhia?
Quem é você? Você não é a Helena porque ela não seria tão cruel a esse ponto.
Eu entrei mais uma vez no quarto com o Thiago ontem de noite e chorei por horas até não aguentar mais, eu sucumbi de novo e de novo e mais uma vez enquanto seu contato quente na minha pele amenizava aos poucos o meu desespero. E depois, depois eu peguei o celular e chequei o que estavam falando ao meu respeito.
Mentirosa e oportunista, sem caráter e destruidora.
Não consegui contar as mensagens onde afirmavam que Bia não deveria ter uma irmã como eu, nem as que relatavam a hipocrisia do Thiago e a minha covardia. Eu deveria dar importância para pessoas que desconhecem à trama na qual sou a tola protagonista?
Volto ao trabalho na tentativa frustrada de esquecer os acontecimentos recentes, como sou ingênua, todos eles estão na minha cabeça projetando um filme ruim, um lembrete de que tudo pode piorar. Ainda vejo os olhares desconexos de todos e ainda sinto a pena ganhando força ao escutar o relato do Thiago, nenhuma ajuda. Nada.
ㅡ Está sujo aqui. – voz soou atrás da minha orelha e um sorriso vai tomando conta do meu rosto.
ㅡ Duvido você encontrar um local que não esteja um desastre. – desafio com ares de que sei que vou ganhar, ele se move ficando na minha frente e sem distribuir um olhar sequer ao sótão. ㅡThiago?
ㅡ Aqui não está sujo. – tocou meus lábios com os dedos gelados. ㅡ Acho que ganhei.
ㅡ Isso não conta. – empurro seu corpo pra trás, o beijo rapidamente esquecendo todo o resto. ㅡ Você é bem espetinho Kunst.
ㅡ É um dom. – suspirou um tanto aborrecido e sei que a razão é o que aconteceu antes. ㅡ Você está melhor?
ㅡ Se eu disser que sim você acreditaria? – faço uma piada para descontrair e ganho outro beijo que sacode minha estrutura. ㅡ Foi o primeiro baque Thiago, sei que tem mais.
ㅡ Uma volta antes do jantar? – pondero dando uma conferida no estado da minha roupa, estou com as calças sujas de poeira ㅡ Espero você.
ㅡ Cinco minutos. – Thiago me lança aquele seu olhar de que sabe que vou demorar mais do que isso. ㅡ Talvez dez.
No meu quarto troco de roupa tentando ser o mais breve possível, ponho outra calça, uma blusa de moletom surrada e um tênis. Tranço o cabelo na lateral e desço encontrando o Thiago na sala.