♛ 002.

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Nasci em Chicago.

E, antes dos meus doze anos, quando pude aproveitar a presença de meu pai com tranquilidade, eu me divertia muito em sua companhia, pelos arredores da tão famosa Cidade dos Ventos.

Podia não gostar totalmente da vida que eu tinha até então, mas, eu não poderia negar o carinho que sentia por tudo que envolvesse Chicago. Por mais que a cidade fosse considerada uma das maiores dos Estados Unidos, eu chegava a me gabar por conhecer boa parte dela.

Papai me mostrou tudo o que pôde.

E mesmo quando ele se foi, eu continuei a explorar tudo que consegui.

Mas, olhando ao meu redor, enquanto o carro - depois de longos vinte e cinco minutos - finalmente parava aos poucos, achei estranho o fato de não reconhecer absolutamente nada do lado de fora.

Apesar de que dentro do automóvel tivesse parecido uma eternidade torturante, eu tinha a plena noção de que era um tempo curto demais para termos saído de Chicago assim, tão rápido. Esse foi mais um dos meus alertas para o desespero, no fim das contas, nada naquela noite estava sendo normal.

- Saímos de Chicago? - perguntei após meu silêncio mortal durante todo o caminho. A pergunta era meio idiota, eu sabia. Porém, as árvores imensas com folhas totalmente imóveis e o céu levemente avermelhado acima de nós, não me deixaram ficar calada.

- Tecnicamente não - ouvi Cassandra responder de forma breve, desligando o motor do carro que dirigia. Ergui uma das sobrancelhas com a palavra "tecnicamente", entretanto, quando abri mais uma vez a boca, a morena continuou. - Enfim, chegamos!

Uma coisa que reparei nesse curto espaço de tempo que fui obrigada a passar dentro do carro, era que Cassandra e Carmélia estavam sempre sorridentes.

Quero dizer, pelo menos quando se dirigiam à mim.

Seus olhos castanhos formavam um par perfeito com o sorriso cativante e voz angelical que as irmãs possuíam. Era estranho o fato de eu achá-las tão gentis e genuinamente boas, já que nem às conhecia - literalmente havia visto elas pela primeira vez à quarenta minutos atrás.

- Chegamos aonde, exatamente? - perguntei mais uma vez, observando os jovens à minha volta se espalharem a medida que abriam suas portas, sem me darem uma resposta.

O garoto de cabelos azuis foi o único - além de mim - que ficou inteiramente dentro do automóvel. Em uma ação rápida, ele segurou meu pulso, com a intenção nítida de me puxar para fora, sem que me deixasse sozinha e eu tentasse correr novamente.

Eu recuei, sentindo a dor no local voltar com tudo. Realmente não devia ter socado a cara do loiro e agora as consequências estavam me atingindo com força, eu admitia.

O azulado me olhou, confuso.

Segurei de leve meu pulso, o massageando ao desviar meu olhar para longe. O garoto correu seus olhos, procurando algo de errado onde eu agarrava. Suspirando, ele pareceu finalmente notar o que aconteceu e sorriu de lado.

- Foi um grande erro socar o Darlan - ele falou, balançado a cabeça, sem deixar o sorriso morrer. - Às vezes acho que aquele cara é feito de pedra.

Ignorei.

- Meu nome é Levon - se apresentou, mesmo notando que eu continuaria em silêncio. - Entendo que está assustada, mas, não vamos machucar você - tentou tranquilizar. - Vamos apenas levá-la para conhecer alguém e aí, quem sabe eu não consiga um gelo para colocar nisso aí? - gesticulou com a cabeça em direção ao meu pulso.

Me senti uma idiota por vê-lo falando comigo como se eu fosse uma criança novamente. Só que, não vou negar que eu estava realmente agindo como uma, me fazendo de surda e muda diante ele.

- Que alguém? - enfim olhei para o de cabelos azuis, mantendo-me o mais afastada que pude. Ele pareceu procurar por uma resposta certa. - Olha, vocês não podem simplesmente me arrastarem para um lugar qualquer, falando umas coisas totalmente sem sentido e esperarem que eu vá colaborar! Ninguém com um pingo de consciência confiaria em vocês, mesmo dizendo "não vamos te machucar".

- Eu sei! - retrucou o garoto. - Mas, não existe um jeito fácil de fazer isso aqui, Eve - gesticulou, agitado. - Acredite em mim quando eu digo que não está sendo fácil para nenhum de nós...

- Mãe - interrompi. - Você disse algo sobre minha mãe. Ela quem mandou me pegarem? O que ela tem a ver com tudo isso? E, porque ela não podia agir como alguém normal e usar a droga de um telefone?

Levon revirou os olhos.

- Não podemos dar as respostas que você quer - respondeu, soando cansado. - Se quer realmente saber, precisa vir conosco... por favor, vamos acabar com isso logo.

De repente, notei que tudo em mim também gritava cansaço. Não sabia mais o que fazer, simplesmente não havia volta naquilo tudo. Eles já me tinham, eu já estava provavelmente muito longe de casa, sozinha, sem ajuda e sem ninguém para que eu pudesse gritar.

Não havia o que ser feito.

Me dando por vencida, eu assenti lentamente. Levon pareceu nem acreditar, arregalando um pouco os olhos ao se arrastar para fora do carro, me deixando sair sozinha. Quando me coloquei de pé, minha cabeça latejou e um suspiro pesado saiu por meus lábios.

Observei os seis adolescentes em pé à minha frente, me encarando curiosos. Notei também o que me rodeava e entendi o porquê das árvores estarem tão paradas. O vento que corria era tão pouco e fraco, que eu senti como se a qualquer momento eu fosse respirar muito fundo e o oxigênio se esvaísse.

Girei meus calcanhares, observando para onde me levaram, afinal. Talvez fosse por conta da noite, não sei, mas... o céu estava realmente avermelhado, com uma lua minguante pequena iluminando de longe. Pousei minhas íris no portão preto enorme que cobria toda uma residência mais à frente. Os detalhes em vermelho eram deslumbrantes, seguidos de um gigante "R" calculadamente encaixado no topo do portão metálico.

O que conseguiu me impactar ainda mais, foi a residência. Aí vocês devem estar pensando: "Eve, mas disso tudo que você viu, uma casa que foi seu ponto principal de atenção?".

Ah, meus amigos.

Esse era o problema.

Não era uma casa qualquer. Era a porra de um castelo. Um castelo tão grande e cheio de janelas, que eu tive que dar alguns passos para trás, para ter uma visão melhor e mais ampla de todo ele. Meu queixo foi ao chão e de repente meu pulso e minha cabeça nem pareciam mais doer.

Me virei para o lado ao sentir uma mão em meu ombro.

- Eu te disse que levaríamos você para casa - Carmy sorriu.

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𝐢. 𝐓𝐇𝐄 𝐇𝐄𝐈𝐑𝐄𝐒𝐒. ! ༉ originalOnde histórias criam vida. Descubra agora