Carta 3: Je suis Luna!

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23/01/18

Amada Elles,

Amei o presente da última epístola. Guardei a Rapadura para tomar com café e não me arrependo de lembrar das saudades sempre que penso no doce da cana açucarada.

O cheiro do café me traz lindas lembranças de uma época boa. Os nomes de Abner e Lucyane também me despertam lembranças gostosas. Espero que Lucy esteja feliz com aquele menino. Abner já não me surpreende a solidão, se for o caso. Desde que a noiva dele, Alba, morreu no acidente com o trem, sinto que o amor nele se esfriou. Cuide deles com diligência e paciência.

Monseur perguntou por ti. Carinhosamente disse que estava te escrevendo agora pouco. Ela mandou lembranças e disse estar com os teus livros. Ela amou a literatura brasileira de maneira a não soltar dos braços Tudo é Rio. Sinto que ela levará esse livro para o túmulo com ela.

Quanto a minha toalha no varal. Pode colher pois não tenho tempo para voltar agora. Sinto sua dor ao ler, mas não posso retornar sem concluir meu tratamento. Me parece uma eternidade até que Dezembro chegue para nós.

Eu estava admirando o relógio hoje. Lembrei-me do tic tac insistente dos mecanismos e eles me transportaram para a tarde de abril de 2017. Alucinei com a tua voz me chamando de volta para o mundo tão cruel onde eu estava. Ando estranha esses dias, mas ficarei bem.

Sua carta demorou tanto a chegar que tenho novidades para lhe contar. Luna veio me visitar enquanto estava fora. Madame Monseur me deu o gentil recado que uma moça ruiva de pele pintada veio a minha procura. Agradeci mas não prestei atenção. Logo ouvi Monseur chamar meu nome mais uma vez e me dar uma cesta de palha com um bocado de croissants quentes e muito bem feitos. Tinha uma rosa e um cartão preso a ela escrito "Para a mulher mais encantadora de toda a Paris."

Meu peito acelerou e senti arrepios até a base da espinha. Minhas mãos suavam e meu rosto se encheu de uma quentura agradável. Acho que ela quer conversar mais sobre o mundo. Combinamos de ir ao bar do Alberto.

Falando no bar, finalmente o conheci. Ele diz lembrar de você com muito carinho. Quando citei teu nome, me deu uma garrafa de cerveja preta e sorriu dizendo que era a tua preferida. Boas lembranças que não cabem mais nos gargalos das garrafas.

A filha dele se casou e teve uma menina que chamou de Ellis em homenagem a ti. Achei bobo, mas amei a referência ao teu nome. Não só isso, mas o casório foi com tuas cores preferidas também. As fotos ficaram lindas. Ela e o marido amaram casar com tema vinho.

Voltemos a Luna, já não quero me desgarrar de um gesto tão singular quanto ao que ela me fez. O passeio foi muito bom. Fomos fazer piquenique na Torre Eiffel e depois resolvemos voltar para a pousada onde ela morava.

Ela me convidou para entrar e tomar um vinho. Neguei educadamente. Sinto que ainda não é a hora de tamanha intimidade, mesmo que eu esteja conversando com ela a algumas semanas.

Sara me mandou lembranças da Alemanha ontem. Recebi um cartão postal de um castelo magnífico e os mesmos dizeres suaves e doces ao verso do cartão. Ela empenha muito tempo na faculdade, mas amou ficar pela velha Berlin. Não pude deixar de sublinhar tua última carta que dizia "Tem amores que é melhor manter longe." e sinto que esse seja mesmo o teu caso. Pena que não descobriu isso a tempo de mandá-la embora sem estragos maiores.

Luna e eu marcamos de sair hoje, outra vez. Já é a terceira vez só essa semana. Hoje vamos ao cinema e planejamos fugir do carnaval para uma pousada no interior. Ela me recomendou algo na área que você costumava andar. O nome da pousada é "Je Suis Luna". Ela jura não ser da família ou de algum conhecido.

Ela já chegou para o encontro e já está gritando em francês na minha sala. Vou enlouquecer.

Sempre sua,

Elisa.

Ps.: Achei uma blusa tua nas minhas coisas. Ainda tem teu cheiro. Sinto muito tua falta.

O Que Você Faz As 3 da TardeOnde histórias criam vida. Descubra agora