II

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Assim,

Depois ficou assim

Quis fazer um carinho,

Receber um carinho,

E você percebeu


"Sucedeu assim"

(Tom Jobim e Marino Pinto, 1957)


A cada noite na qual WIK se apresentava na casa, sentia-se ignorado por aquele homem de óculos.

A cada vez, também, surgia uma misteriosa dose de gin na mesa de Porchay. Este questionava Vegas frequentemente:

— Mas quem é que me enviou esta bebida? Eu não a solicitei. — Encarava o pequeno copo para shot diante de si, com estranhamento evidente no olhar.

— O remetente não gostaria de ser identificado, senhor, mas posso te garantir que não há o que temer; afinal, as bebidas estão sob minha supervisão. — Respondia-lhe o garçom com um sorriso no rosto, abraçando a bandeja de metal que empunhava.

— Agradeça a quem me enviou, por favor, mas gostaria de gentilmente recusar a bebida. Afinal, não sei por que razão isto me foi enviado e tampouco quem é a tal remetente. — Pousou uma das mãos no vidro do objeto, empurrando-o discretamente para mais distante de si.

— Como desejar, senhor, mas a deixarei aqui, se porventura você mudar de ideia. — Vegas despediu-se com um aceno de cabeça.

Porchay bufou, mantendo o olhar sobre aquela pequeníssima dose de mistério. "Quem a teria enviado para um homem inútil como eu?"

Enquanto isso, ecoando a partir do palco, ouvia-se uma melódica e já familiar voz entoando versos de amor, numa harmoniosa dança entre cordas vocais e fluxo de ar:

Meu coração

Não sei por quê

Bate feliz

Quando te vê

E os meus olhos

Ficam sorrindo

E pelas ruas

Vão te seguindo

Mas mesmo assim

Foges de mim...[1]

Kimhan encarava discretamente aquela esguia e esquiva figura, que não o encarava de volta, enquanto toda uma gama de homens e mulheres desfalecia com seus versos.

Aquilo irritava-o, pois não havia quem antes o tivesse rejeitado.

A recusa de seus presentes, em soma a isso, era-lhe ainda mais desgostoso.

Entretanto, percebia que a dificuldade tornava o jogo da sedução ainda mais interessante.

♤~♤~♤

Era um galanteador.

Após suas apresentações, não precisava fazer muito: eles e elas viriam até ele voluntariamente. Sempre tinha quem o acompanhasse durante a madrugada — na embriaguez e, quase que consequentemente, na cama. Perdera a conta de quantos seios macios e robustos pusera entre os dedos e os lábios, bem como de quantos homens levaram-no até uma ruela escura para oferecerem-lhe o veludo de suas bocas.

[PT-BR] Fade-a bohemian love story.Onde histórias criam vida. Descubra agora