2 - Curral

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Quando alguns predadores sentem o gosto de uma nova iguaria pela primeira vez, correm o risco de ficarem viciados nela e passam a caçar aqueles que normalmente não faziam parte de sua cadeia alimentar.
De certa forma isso aconteceu comigo. Pois depois de comer Gustavo tantas vezes naquele verão, tive certa dificuldade em me acostumar as minhas transas habituais. Nunca tive problemas em arrumar parceiras. E tive uma dieta sexual bem satisfatória depois de Gustavo. Mas algo faltava.
Me masturbei muitas vezes lembrando daquela bunda carnuda, de nossos jogos de força e do prazer que sentia cada vez que me empunha sobre meu amigo. No começo, cheguei a acreditar que tivesse me apaixonado por Gustavo, mas logo caí na real e entendi que o que me dava saudades era o desafio da caça.
Pois por mais conservadora que fosse aquela sociedade, não era difícil descolar uma companhia, mesmo que na surdina. Mas agora, caçar um homem para transar. Aquilo sim era arriscado, difícil, pois como falei anteriormente, minha cidade natal não via com bons olhos tipos como eu.
Com o passar do tempo, a abstinência foi me consumindo. Eu precisava descolar um rabo para fuder, de qualquer jeito.
Na história da evolução do homem, houve um momento em que ele foi retirado de sua vida nômade e inserido em uma vida em comunidade, criando assim seus primeiros vínculos com um lugar e o permitiu estabelecer raízes. Umas das coisas que o permitiu tal façanha foi a prática da pecuária, que lhe proporcionou o fim da necessidade de ter de correr o mundo atrás de alimento. Tratando de sua presa em sua própria residência, superou assim a necessidade da caça. No meu caso, eu não queria abandonar o prazer da caça, mas tinha de admitir que seria bom ter uma opção para os dias em que haveria escassez de alimento.
Um amigo com benefícios, cu fixo, uma marmita pronta, um curral. Não interessa o nome, era disso que eu precisava. Gustavo me foi esse amigo durante todo nosso verão, mas infelizmente ele partiu e eu teria de conseguir outro.
Foi nesse instante que voltei minha atenção pela primeira vez para Breno, irmão caçula de um de meus amigos mais íntimos.
Na época, Breno era dois anos mais novo. A situação de Breno era delicada, no que diz respeito a sua sexualidade. Todos ali sabiam que havia algo de diferente nele. Que ele, inevitavelmente, viria a gostar de homens, se já não gostasse. Tal fato, entre sua família, era considerado um tabu e ela procurava na igreja uma forma de evitar o inevitável. Talvez, embutindo em sua cabeça a ameaça do fogo infernal seria uma forma de conter seus impulsos
Com Carlos, meu amigo e irmão mais velho de Breno, não tocávamos no assunto. A verdade é que ele tinha vergonha do irmão e evitava a todo o custo qualquer menção a sua sexualidade.
Lembro que Breno idolatrava o irmão e tentava imitar, sem sucesso, seus jeitos. Insistentemente, ele tentava andar conosco, os caras mais velhos, e Carlos procurava de mil formas dissuadi-lo e expulsá-lo. Porém, bastava sua mãe entrar na discussão e ele era obrigado a aceitar sua companhia. A mãe de Breno acreditava que Carlos pudesse ensinar algo do universo masculino para o irmão e tal fardo incomodava meu amigo. Assim, Breno estava sempre junto da gente, mas nunca aceito no bando.
Naquele contexto, Breno era como um filhote de gazela largado na savana, e eu o guepardo faminto. Tinha que admitir que o garoto tinha se tornado bem bonito nesses tempos de adolescência. Cabelos lisos e bem penteados. Pele branca e olhos cor de mel. Um corpo magro e uma bundinha bem saliente davam o toque juvenil maroto que me fez sentir verdadeiro desejo.
Acho que a única coisa que me impediu de investir nele de cara foi o fato de Breno ser um garoto muito chato. Era mimado, manhoso e bastava a brincadeira engrossar que ele chorava. Eu definitivamente não tinha aptidão para ser babá.
Lembro de uma tarde em que os garotos foram um pouco cruéis com Breno. Estávamos na época de bolinhas de gude na cidade. Todos estávamos brincando de búrica, na praça, quando Breno chegou. Ele vinha com uma lata cheia de bolinhas novas, algumas bem caras, e queria brincar
Os garotos não o queriam ali, mas em solidariedade a Carlos, que não poderia estar ali sem o irmão, aceitaram. Então, resolveram brincar valendo. Todas as rodadas valiam bolinhas e, como Breno jogava mal, foi perdendo até seu potinho esvaziar quase que por completo.
Observar ele ali me atingiu de uma forma maior do que eu pude supor. Pois pela primeira vez, entendi como ele devia estar se sentindo. Era claro que ele era gay. Os garotos podiam não notar, mas eu via como ele reparava nos corpos dos garotos mais velhos. O peguei me olhando quando tirei a camisa por causa do calor. Ele, assim como eu, sabia como aquele lugar podia ser cruel e tentava se enturmar.
Aguentava as zoações, da melhor forma que conseguia, mas era óbvio que se sentia sozinho. O via perder bolinha atrás de bolinha, segurando o choro pois sabia que, se começasse a chorar, o jogo terminaria e ele e o irmão teriam de ir pra casa.
Nesse momento, respirei fundo e resolvi tomar uma atitude. Peguei todas as bolas que tomei de Breno e devolvi ao seu pote.
- Que isso, Fábio? - Marcelo, um dos garotos, questionou.
- Ora, não estávamos brincando? Vocês vão mesmo tomar as bolas de um moleque? - fiz pouco caso.
Carlos aceitou a deixa e também devolveu as suas, mas Estevam, resolveu fazer uma piada e ia aprender que não se deve cutucar um leão com vara curta
- Acho que o Fábio gamou no teu irmão, Carlos. Ta comendo ele, Fábio?
Carlos na hora se ergueu para tirar satisfação, como sempre fazia quando o assunto da sexualidade do irmão vinha a tona. Mas eu fui mais rápido. Caminhei até Estevam, bem sério e falei, voz calma e ameaçadora, como um rosnado.
- Ta me chamando de viado? - sibilei e já foi o bastante para o sentir encolher. Nunca fui de brigar, mas meus amigos sabiam que quando eu começava, não parava até um deles sair chorando - Quer que eu arregace esse teu cu aqui e agora pra tu ver quem é viado?
Estevam tentou rir.
- Relaxa, leão. Tô brincando.
Leão era meu apelido no bairro. Além de ser do signo de leão, tinha meus cabelos encaracolados e bem volumosos. Uma vez, quando tive especial preguiça de cortá-los, nasceu esse apelido e eu nunca mais me livrei dele.
Mas a verdade era que eu gostava do apelido, ainda mais quando dito com tanto medo e respeito, como Estevam fazia naquele momento. Era bom eles saberem que eu era o superpredador, o rei, dali.
Ao final, todos devolveram as bolinhas. Carlos me agradeceu, sem palavras, e Breno enxugava os olhos.
- Tenho que ir almoçar - Estevam anunciou e foi seguido por Marcelo.
Carlos também se despediu e deixou o irmão pra trás, que terminava de catar as bolinhas espalhadas.
Eu então me acheguei para Breno e falei:
- Olha, se tu vai querer andar com os mais velhos, precisa aprender a se defender. Virar homem. Nós podemos ser muito mais cruéis que isso.
Ele não respondeu, com vergonha de me encarar.
- E não seria ruim você aprender a jogar direito essa merda antes de querer apostar - e respirei fundo, avaliando a situação - Vou te ensinar a jogar.
Breno parecia não ter entendido bem e me olhou interrogativo.
- Mas não agora - completei. - To com fome e vou pra casa. E prometi ajudar meu pai com o carro agora de tarde. De noite eu passo na tua casa e viemos pra cá. Teu irmão vai sair com a Viviane, né? Eu vou estar de bobeira.
- Sim, mas não sei se minha mãe vai deixar eu sair tarde.
- Passo lá umas nove horas. Não vai ser tão tarde. E amanhã estamos em casa, ponto facultativo na escola - lembrei - Ela vai deixar. Deixa comigo - garanti e saí.

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