(...) Deméter amaldiçoa os arredores e o mundo inteiro, priva a Terra da fertilidade, estraga as sementes, mata os animais e os pastores juntos. Ao ver essa vontade destrutiva e irrestrita, a ninfa Aretusa, que por meio de suas muitas conexões no Mundo Inferior sabia sobre a estadia de Perséfone no Submundo, emerge de sua fonte com a coroa de flores de Cora em suas mãos. Ela pede que Deméter poupe a terra inocente e diz que sua filha agora é a Rainha dos mortos.– Por favor, entregue isto a Aretusa... – Perséfone pediu ao rio, depositando em sua superfície a guirlanda de flores do campo que usava nos cabelos desde que se recordava e que simbolizava seu vínculo com o nascer terra-acima – Ela saberá como contar à minha mãe.
Observou o Rio Alfeu, repleto de luzes azuladas da água refletindo ondulantes nos paredões que o ladeavam, enquanto ele levava sua guirlanda para longe, correnteza acima, até o local onde sairia do Submundo e emergiria na Superfície, para, enfim, unir-se à sua amada Aretusa, a quem Deméter tinha imenso apreço.
Tinha muita esperança que, com o tempo, sua mãe se conformasse com a sua decisão e voltasse seu olhar materno para os humanos, que tanto necessitavam dela para a sua sobrevivência.
Uma cabeça canina gigante de pelos negros apareceu ao seu lado interrompendo seus pensamentos melancólicos, logo antes de outras duas acompanhá-la, para alternarem-se entre lamber seu rosto, braço e pernas. Ela riu, sentindo cócegas com o cumprimento carinhoso de Cérbero.
– O que vocês estão fazendo aqui? – perguntou em meio a risadas.
– Viemos procurá-la – soou uma voz feminina um pouco mais distante – Eles estavam ansiosos para seguir seu rastro.
– Oh, Hécate, não tinha visto você – Perséfone respondeu, após conseguir olhar através de um feliz rabo balançando euforicamente – Estou atrasada?
– Um pouco... Mas é compreensível que seus pensamentos estejam dispersos, os rumores de que o Submundo agora tem uma rainha se espalharam rapidamente...
Ela sentiu o rosto ruborizar ferozmente. Percebera uma intensa movimentação no Palácio de Hades quando saíra de seu quarto, com os servos invisíveis do Rei movimentando inúmeros objetos de decoração, comida e bebida, além das demoradas reverências que recebia das outras deidades que encontrava em seu caminho.
– Hades ainda não retornou do Olimpo, então decidi andar um pouco e ocupar o tempo – informou ela a Hécate, aproximando-se dela com Cérbero acompanhando-a de perto e finalmente percebendo a luz suave que emanava da pele da outra deusa – Oh, você está especialmente radiante hoje.
– Ah, sim, hoje passei muito tempo sob o olhar de Hélios – Hécate respondeu com uma risada tranquila.
Perséfone amava quando a encontrava naquela forma: uma mulher no auge de sua vivacidade, com curvas macias, seios fartos, pele resplandescente, um rosto sedutor adornado de cachos dourados.
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Perséfone, Deusa Selvagem
RomanceO mito de Perséfone se dedica a falar dos sentimentos dos outros: da mãe, que a priva de ter sua própria vida por tanto querer protegê-la; e do amante, que, por tanto amá-la, a rapta do seio materno para torná-la sua esposa. No entanto, uma deusa a...