Aquela que Deve ter Coragem

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(...) Perséfone foi levada para o inconsciente, para um mundo sombrio. Arrancada do mundo de Deméter, o sentimento é de um imenso vazio emocional. Tudo aconteceu de uma forma muito rápida, sem nenhum preparo. O rapto de Perséfone representa, acima de tudo, a morte da menina que não irá mais existir após o casamento; o corte dos laços com a família em que nasceu.

Perséfone observava, atônita, uma imagem que jamais pensara possível, ao menos não depois de conhecer a natureza taciturna dos súditos do Submundo: milhares de almas se aglomeravam em volta do Palácio de Hades, o qual se erguia imponente do topo d...

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Perséfone observava, atônita, uma imagem que jamais pensara possível, ao menos não depois de conhecer a natureza taciturna dos súditos do Submundo: milhares de almas se aglomeravam em volta do Palácio de Hades, o qual se erguia imponente do topo de uma colina escura, repleta de pontos brilhantes de diamantes e outros cristais que surgiam da rocha, fazendo parecer que o Palácio se assentava sobre sua própria galáxia de estrelas.

No pouco tempo que passara ali, percebera que os mortos, em sua maioria, preferiam uma existência solitária –  a vida após a morte era mero prolongamento de suas experiências em carne; era a espera pelo dia em que, finalmente, não houvesse mais lembranças que prendesse a alma ao que vivera.

No entanto, por algum motivo, ali estavam elas: exultantes, no limite do que era possível para os mortos, trazendo ramos de oliveira enfeitados com pendentes que brilhavam, refletindo a luz suave do Submundo, para enfeitar a escadaria que levava até o Palácio.

– Vieram honrar a nova Rainha – explicou Hécate, contagiada pela felicidade que as cercava, enquanto andavam entre a multidão, quase duas cabeças mais altas que todos presentes.

A cada passo que Perséfone dava, deixava raminhos de lírios-do-vale florescendo de sua pegada.

Não era intencional.

Os súditos de Hades sorriam, inclinavam-se e tentavam tocar sua túnica enquanto ela passava, e Perséfone jamais se sentira tão querida e acolhida em sua existência.

Observou a animação de Cérbero, correndo entre as almas, causando gritos e agitação, enquanto lambia e se esfregava no máximo de pessoas que conseguia – espelhando o sentimento da própria Perséfone, ele jamais estivera tão contente antes, pois amava, amava, amava receber visitas no Palácio de Hades, só não era muito bom em deixá-las partir.

Com um sobressalto, Perséfone percebeu, ao subir os últimos degraus da escadaria, que o próprio dono do Palácio a aguardava. Ela perdeu o fôlego por um momento com a visão de Hades, imponente em cada milímetro do grande corpo, mas com um sorriso enorme que se refletia nos olhos escuros, enquanto conversava com duas almas – as quais reconheceu, mesmo à distância, como sendo as melhores tecelãs do Submundo, com quem muito conversava quando ia aos campos de linho para ajudá-los a crescer.

Quando os olhos dele finalmente a encontraram, incontáveis flores surgiram perto de seus pés, irradiando por vários metros à sua volta; e ela torcia para que ele não houvesse percebido o efeito que causava nela, muito embora nada escapasse ao olhar atento do deus.

Perséfone, Deusa SelvagemOnde histórias criam vida. Descubra agora