(...) Hades então fez um acordo: em uma parte do ano Perséfone ficaria no submundo e na outra parte, ficaria na Terra, com sua mãe.
Nua sob os lençóis, com o braço de Hades em volta de sua cintura acomodando-a gentilmente contra o peito, Perséfone acordou com batidas à porta.
– Eu terei que fazer um certo arauto desaparecer – foi o resmungo de Hades, enquanto aninhava-se ainda mais perto dela, afundando o rosto em seus cabelos.
– Pode ser importante... – sussurrou Perséfone, ouvindo novas batidas.
– Garanto que nada é mais importante do que ficar exatamente onde estou – ele lhe respondeu, mas suspirou frustrado quando bateram à porta mais uma vez, soltando-a com relutância antes de vestir-se e seguir para as portas duplas do enorme quarto, onde Hermes aguardava – Espero que você esteja aqui por um motivo mais importante do que sua própria vida, se não quiser perdê-la.
– Zeus está vindo... – deu uma olhada rápida pelo quarto, desviando o rosto ao ver Perséfone sentada na cama, apenas com o lençol cobrindo-a – ... com Deméter.
Perséfone até tentara ensaiar mentalmente aquele reencontro, mas sempre sentia um aperto tão forte no peito e uma tristeza tão intensa, que fugia dos pensamentos. Sentia que não era capaz de prever as reações de Deméter – ou pior, que podia prever, e que as reações que antecipava a machucariam profundamente.
Estivera certa num ponto, ao menos: ela realmente não conseguiria imaginar que também teria que lidar com a presença de Zeus ao reencontrar Deméter.
Hades, de uma calma absoluta, sugeriu que os aguardassem no Salão de Julgamento, onde poderiam ter mais privacidade – e se ele esperava necessitar de discrição para aquela conversa, era porque não tinha bons pressentimentos.
Em pé, no meio da Salão, Perséfone esperava. Não conseguiria aguardar sua mãe sentada no trono que fazia par com Hades – sentia que estaria se colocando numa posição de superioridade que sua mãe não merecia ter de lidar naquele momento. Mesmo a ínfima ideia de impor sua posição a Deméter fazia Perséfone ser acometida por uma culpa sufocante.
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Perséfone, Deusa Selvagem
RomanceO mito de Perséfone se dedica a falar dos sentimentos dos outros: da mãe, que a priva de ter sua própria vida por tanto querer protegê-la; e do amante, que, por tanto amá-la, a rapta do seio materno para torná-la sua esposa. No entanto, uma deusa a...