Capítulo 15

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Enquanto Sam mordiscava algo sem ânimo aparente, Deena criava teorias mirabolantes sobre o que acontecia dentro da cabeça de sua esposa. Sam andava quieta ultimamente, mais do que o normal. Ela parecia triste, como se as horas não importassem; como se tudo tivesse perdido a graça.

-- Você está bem? -- Deena perguntou, visivelmente preocupada. Haviam se casado quatro dias atrás e o aparente "entusiasmo" de Sam quanto a isso era notório.

-- Sim. -- Sam se limitou a dizer apenas isso. Seus olhos acompanharam o exato momento onde Deena se levantou, deixando suas coxas à disposição dos olhos de Sam novamente. Usava apenas uma camisa larga que ia até o meio de suas pernas e o que usava por baixo disso não dava para ser visto; provavelmente um short curto.

Deena caminhou até a geladeira e pegou leite, entornando o líquido numa leiteira e pondo a mesma para esquentar.

-- O que está fazendo? -- Sam perguntou curiosa. Rosália geralmente era a única pessoa da casa a tocar no fogão, mas a mulher havia ido à feira de domingo e por isso não estava presente. Deena não gostava de ter outros empregados na cozinha, Rosália mesmo fazia questão de ser a única a cozinhar e, caso houvesse casos onde Rosália saía, Deena não se importava de cozinhar. Havia aprendido muita coisa com a doce senhora, afinal, passara maior parte de sua infância com a mulher.

-- Meu pai me dizia quando eu estava triste... -- Deu uma pausa para pegar mais algumas coisas. -- Que um pouco de chocolate quente ajuda.

-- Mas não estou triste. -- Sam protestou.

-- Isso é o que você, minha cara, diz. -- Deena disse sorrindo e Sam suspirou, fitando-a.

-- A Lele costuma dizer que chocolate quente é a melhor coisa do mundo. -- Sam disse sorrindo amplamente diante da recordação da amiga.

-- Lele? -- Deena perguntou confusa, enquanto entornava uma barra de chocolate na leiteira, juntamente com um pouco de açúcar e começou a revolver o líquido.

-- Sim. Minha melhor amiga. -- Explicou.

-- Estava no casamento? Eu a vi?

-- Não. Mamãe achou melhor ela não aparecer por lá. -- Disse.

-- E por quê? -- Perguntou ainda sem entender.

-- Ela não se encaixa na nobreza, de acordo com a minha mãe.

-- Vocês... se conhecem há muito tempo? -- Perguntou assim que despejou o líquido na xícara e estendeu para Sam. A mesma ia beber um pouco, mas Deena se apressou em falar. -- Cuidado! Está quente.

-- O nome é "chocolate quente" Por alguma razão. -- Sam disse brincalhona e Deena sorriu, vendo Sam rir antes de começar a soprar o vapor de cima do líquido, experimentando logo em seguida.

-- E então?

-- Uma delícia. -- Sam disse sorrindo. -- E quanto a sua pergunta...Conheço desde que tinha treze anos.

-- Parece gostar muito dela. -- Deena analisou.

-- A amo. -- Apontou. -- Como a irmã que nunca tive.

-- Quase consigo imaginar vocês duas correndo entre as barracas do povoado enquanto sua mãe gritava seu nome enfurecida. -- Falou rindo. -- "Samantha, volte aqui sua insolente. Não foi essa a educação que eu te dei." Fez uma voz imitando Danielle e Sam arregalou os olhos, rindo. Eram exatamente as palavras de sua mãe.

-- Isso era algo que ela diria, com certeza. -- Sorriu. -- Eleonora, nome da Lele, sempre foi aventureira e, bem, correr da minha mãe era uma das melhores aventuras. -- Deena não podia imaginar o porquê da mãe de Sam impedir sua amizade, mas ela não se importava com a mesma, porque era nítido a importância da garota para Sam. Sem perceber levou sua mão até uma das mãos de Sam e apertou, de uma maneira respeitosa.

-- Você fica tão mais linda sorrindo. -- Disse genuinamente. -- E não estou tentando parecer galanteadora, pois falharia miseravelmente. -- Assumiu rindo. -- Digo porque é a mais singela e pura verdade. -- Sam enrubesceu e baixou seu olhar para sua xícara.

-- Obrigada. -- Sam não desfez o contato das mãos. Deena tinha um aperto calmo e mãos macias, deveriam tranquilizá-la, mas a imagem de Deena a desejando como esposa ainda a assustava, apesar de jamais ter sido desrespeitada. Deena nunca havia dito que se interessava por ela, mas a forma como a olhava deixava bem nítido isso. -- Me sinto em débito com você. -- Sam confessou sem perceber que as palavras saíam em voz alta.

-- Por quê? -- Perguntou surpresa.

-- Você se casou comigo, porém não tem uma esposa que cumpra...você sabe. -- Terminou corando.

-- Mas tenho uma esposa que cumpre o papel de amiga. Estou mais do que satisfeita. -- Sam se sentiu pior ainda. Não tratava Deena como uma amiga e sim como uma ameaça. Dizia para si mesma que deveria se sentir confortável perante àqueles castanhos intensos, mas não conseguia nada além de sentir-se intimidada.

As palavras de Deena, ao invés de trazerem conforto, vieram como um soco na boca do estômago de Sam. Claro que havia momentos onde ela esquecia que era casada e ria com leveza das coisas ditas por Deena, mas isso era apenas em uma fração de minutos. Logo estava ela sofrendo interiormente de pânico pela aproximação ou por algum toque de Deena. Um simples esbarro em suas mãos já fazia Sam achar que Deena mudaria de ideia e reclamaria seus direitos como esposa.

-- Ambas sabemos que não sei exercer esse papel com você. -- Sam confessou envergonhada.

-- Ainda. -- Deena não disse mais nada, apenas tratou de se concentrar em não encarar Sam. Sabia que seus olhares assustavam a garota, no entanto, não podia evitar sempre. Às vezes se pegava fitando os lábios de Sam enquanto ela falava alguma coisa.

-- Ainda. -- Sam repetiu após algum tempo, decidida a tentar dar a Deena sua amizade. Tentaria se livrar de seus medos e confiaria que Deena realmente só quer sua amizade, sem maldade, sem segundas intenções. Apenas sua amizade, no jeito mais puro e sincero. -- E você, não vai tomar chocolate quente?

-- Depois.

-- Por quê? Não te agrada chocolate quente pela manhã? -- Perguntou curiosa.

-- Adoro chocolate quente a qualquer hora do dia. -- Sua risada rouca fez Sam sentir-se confortável com sua presença. -- Mas a última barra de chocolate preparei para você. Vou esperar Rosália retornar. -- Sam não entendia como Deena podia ser tão prestativa e gentil o tempo inteiro. Se permitiu examinar as feições da mulher sentada a sua frente e enxergou satisfação.

Como poderia ela estar satisfeita tendo se casado com alguém que não a ama, quase foge dela e ainda toma sua última barra de chocolate com leite?

Desviou o olhar de Deena quando viu que a olhava por tempo demais. Era natural olhar para Deena, Sam pensava. Todos ali perdiam longos minutos fazendo isso com suas expressões embasbacadas, provavelmente um efeito colateral por ter essa beleza cativante, pensou novamente Sam, voltando a tomar seu chocolate quente no silêncio intimidador do ambiente.

Over The Rainbow - Sameena -Onde histórias criam vida. Descubra agora