Um passado amoroso

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Amanheceu.

Acordamos com o despertador dela, umas oito e meia da manhã. Ela se levantou bocejando para desligar os sinos, enquanto eu me espreguiçava debaixo do lençol. Ela estava só com uma calcinha de renda vermelha. Uma luz matinal entrava pela janela e acentuava o quão poético era aquele corpo. Isso, pois tento não ser tão explícito quanto à essa beleza, não darei tamanho privilégio ao leitor.

— Ta dormindo ainda? — perguntou-me. Neste momento ela estava se vestindo.

— Estou bem acordado, minha linda — agora levantei também. Peguei o lençol para dobrá-lo.

— Então... — ela vestiu um cropped nessa hora, e um shortinho. — Normalmente, eu faria um café, mas meus pais devem chegar logo, logo. Cê vai ter que vazar.

— Sem problemas — me aproximei dela e abracei-a por trás. Aproximei-me do seu ouvido suavemente, lançando uma provocação — E se seu despertador tivesse desligado?

— Ai estaríamos com problemas sérios — respondeu-me ela com um sorrisinho dissimulado. Beijei-a em protesto, mas ela deve ter percebido minha intenção, então se desvincilhou dos meus braços.

Comecei a me arrumar, com um ótimo humor. Eu havia apenas avisado minha mãe que iria em uma resenha e que dormiria na casa do... Tiago. Nem o incomodei com a informação, não era longe e minha mãe não iria perguntar pra ele. No fundo, eu ainda desconfiava que a coroa sabia que eu estava mentindo. Mas eu não pretendia ter essa conversa com ela, embora logo após Dani sair do banheiro eu descobrisse uma nova discussão.

— Sabe, senti saudades de você — disse ela, com uma voz dócil, na porta do banheiro. Eu estava sentado na cama, esperando ela. Senti o coração acelerar com aquela frase.

Olhei bem fundo em seus olhos.

— Eu... Também senti. Mesmo!

— Então, por que não veio falar comigo?

Eis aí uma coisa que não contei ao leitor.

Dani, por algum tempo (uns três meses, talvez) namorou com um cara do bairro, um pouco mais velho e do tipo punk. Aconteceu do nada, ao menos pra mim. Simplesmente pisquei e eles haviam assumido o relacionamento, e eu acabei ficando sozinho. Não me entenda errado, eu estava confuso, não soube o que sentia por aquela mulher, naqueles meses. Confesso que eu deveria estar cometendo o pecado de enrolar ela, mas tinha boa intenção.

Contudo, ele apareceu: o Alex. Agora, só ex.

— Você já estava namorando. Foi muito rápido. Você parecia ter mudado... — justifiquei-me, enfim.

— Eu? Sempre que eu te via, você fechava a cara. Parecia que chupou um limão.

— Tu fazia o mesmo!

— Não, eu retribuía — retorquiu. — Além do mais, já faz um mês, repito, um mês que terminei, e você esperou eu ir falar contigo.

Eu esfreguei o rosto.

— Eu estou aqui, agora, após toda nossa noite. Agora você tá zangada comigo?

— Não estou zangada — ela parecia estar. — A questão é que não entendo você. Não sei ainda o que o impediu de vir falar comigo.

— Eu também não sei!

No fundo, eu sabia. Era medo, mas não falei. Eu achava que ela não me queria mais, que perdi a vez e agora ela estava em outra vibe. Mas estando ali, depois daquela noite, ela não estava em nenhuma outra sintonia. O que mudou nela não era problemático, mas talvez fosse imperceptível para alguém que não se atentava à ela tanto quanto eu. A maneira de olhar ainda era vibrante, mas seu modo de tocar, alguns trejeitos, e a sua autoestima mudaram. E eu diria que foi para melhor. Ela penetrava meu interior, enquanto me encarava esperando respostas.

— Você não falou sobre ele comigo. Senti-me usado e trocado. Fiquei mal por um tempo, e pensei que você me faria mal novamente. Achei que te superei, e aqui estou eu!

— Quem eu fico ou fiquei, não interessava. Não sou fiel a ficante, mas eu esperava uma iniciativa de você, Miguel — disse ela, um tanto quanto decepcionada.

— To vendo que não aguentou a ansiedade — ela esperava minha iniciativa? Então simplesmente foi pros braços de outro?

Ela fechou o cenho.

— Estou achando que cometi um erro — afirmou ela, secamente.

— Sobre mim? — me levantei lentamente, como se estivesse cansado.

— Sim. Você está diferente, mas não sei se isso é bom.

Eu não mudei muito. Nem ela. Era bobagem toda essa discussão. Nós não estávamos nos entendendo, obviamente. Podia ser mais simples, mas naquele momento eu não simplifiquei, e nem ela.

— Idem. Até mais, Daniela. Melhor eu ir logo — suspirei, tentando acalmar meu coração. Eu não queria brigar. Ela não falou nada, apenas ficou me olhando com um olhar estranho; desapontada, talvez?

Me doeria menos se fosse xingado. Mas fui-me dali, com um gosto agridoce na boca, no coração.

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