o convite.

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Peggy Carter e Dottie Underwood se conheceram na igreja, em outubro de 1998, quando ambas tinham 16 anos. Margaret era do coral, e Dorothy havia acabado de se mudar da Rússia. As duas se aproximaram e criaram uma amizade leal e cheia de amor. Com o tempo, essa amizade acabou se tornando algo a mais. O primeiro beijo foi algo mágico e revelador para as duas jovens. Os pais de Margaret a desprezaram, então no auge dos seus 18 anos, elas decidiram morar juntas.

No começo não foi uma coisa fácil; construir um lar do zero, em uma época em que pessoas do mesmo sexo não podiam se relacionar. Mas ambas já estavam no mercado de trabalho, Peggy com seu estágio na polícia e Dottie como bailarina profissional, elas conseguiram, aos poucos, construir esse lar. Em um apartamento alugado, com móveis de segunda mão, Carter e Underwood selaram o amor uma pela outra.

Com a legalização do casamento homoafetivo nos países baixos em abril de 2001, elas alimentaram a ideia de viajar até Amsterdã para oficializarem seu relacionamento. Depois de seis meses economizando seus salários, as mulheres conseguiram juntar dinheiro suficiente para a viagem e para o casamento. O casório não foi nada grande ou espetacular, mas certamente foi um dos melhores dias na vida das mulheres. Naquela mesma noite, deitadas em uma cama de hotel, olhando nos olhos uma da outra, elas velaram seus votos. A primeira noite como um casal oficialmente casado.

Em 2002 elas sentiram que faltava algo em suas vidas. Já haviam mudado para uma casa um pouco maior, Peggy já havia sido efetivada na polícia federal; mas algo estava faltando. Um dia, andando de mãos dadas pelo central park, Carter viu uma moça chamar seu bebê até ela. A criança de poucos meses andou em passos desengonçados até a mãe, que o abraçou quando ele a alcançou. Underwood notou os olhos castanhos da esposa brilharem. Era isso. Elas queriam ser mães.

A adoção de crianças por casais homoafetivos já acontecia nos Estados Unidos naquela época. Claro que não era muito comum, e muito menos fácil, mas elas não estavam dispostas a desistir. Peggy e Dottie passaram um bom tempo procurando por agências privadas de adoção, até que encontraram uma que as acolheu perfeitamente. No começo, a ideia principal era adotar uma criança pequena, talvez um recém nascido, mas quando conheceram Violet, uma menininha canadense de cinco anos e com um sorriso encantador, elas souberam. Ela era a filha delas.

O processo de adoção levou quase seis meses. A agência de adoção e o conselho tutelar faziam visitas constantes à casa do casal. Até que, por fim, decidiram que as duas estavam, finalmente, aptas para se tornarem mães. Elas levaram Violet para casa, e então se tornaram uma família de três.

Nada do que elas já haviam vivido em casa, na igreja, na polícia ou no balé as preparou para ter uma criança em casa. Aos vinte anos elas já eram mães, mas elas não entendiam muito bem como tudo isso funcionava. Foi aí então que Dottie absorveu o amor pelos livros. Ela passava o dia lendo livros sobre maternidade, infância e saúde mental. Geralmente isso a ajudava bastante. Ela lia livros infantis todas as noites para Violet, que mais a frente também desenvolveu uma paixão pela literatura. Os livros ensinaram as mães a entender sua filha, a ajudar quando precisasse ou a deixar que ela resolvesse seus problemas sozinha quando necessário. E logo a criação de Violet não era mais um problema para o jovem casal.

O casamento das mulheres sempre fora algo de dar inveja. Amigos próximos costumavam dizer que nunca haviam conhecido um casal que se amasse tanto quanto as duas. Durante 15 anos, pode-se dizer que elas viveram um conto de fadas.

Até que, no ano do seu décimo sexto aniversário de casamento, as coisas começaram a mudar. Não existia mais aquela conexão de casal. Peggy trabalhava demais, e quando chegava em casa Dottie já estava dormindo. Elas andavam na rua separadas, geralmente uma mais a frente da outra. A paixão havia... Esfriado. E depois que Violet havia entrado na faculdade, aquela casa pareceu grande demais, e sufocante demais, para as duas.

Elas tentaram se manter juntas, mas pareciam estar forçando algo que não iria dar certo. Em 2017, aos 35 anos, Peggy Carter e Dottie Underwood se separaram. O divórcio foi algo recíproco. Ambas decidiram que seria a coisa certa a se fazer, mesmo não acreditando cem por cento nisso.

Como Violet já estava na faculdade quando elas se separaram, ela não precisou escolher juridicamente com quem ficar. Elas venderam a casa e dividiram o dinheiro por igual. Dottie se mudou para Minnesota, enquanto Peggy continuou em Nova York. A russa pegou metade do dinheiro e abriu sua própria escola de balé. A inglesa continuou no seu trabalho, mas começou a tirar um tempinho nos dias para cuidar de si mesma.

Vez ou outra elas se comunicavam por mensagens. Mas, na última vez que se falaram, há pouco mais de quatro anos, tiveram uma das primeiras brigas em todo o tempo de relacionamento. Desde então, elas nunca mais trocaram palavras.

Até o natal. Desde o ano do divórcio, os natais em família eram comemorados separadamente, o que foi uma experiência nova para ambas as mulheres, já que elas estavam acostumadas a passar o feriado juntas desde 1998. No primeiro ano, Violet estava de férias da faculdade e resolveu passar com Dottie, porém visitando Peggy no dia seguinte. Nos outros anos, ela fez a mesma coisa, porém alternando a ordem.

Mas, esse ano, ela decidiu fazer algo diferente. Violet e seu (até então) namorado, Daniel, haviam acabado de se mudar para a casa nova, então ela queria que o natal de 2022 fosse realizado lá, para comemorarem. E ela sabia que não conseguiria fazer isso sem suas duas mães.

Peggy estava receosa sobre recusar ou não o convite, mas ela jamais poderia deixar sua única família na mão por conta de um relacionamento mal resolvido.

Dottie também estava receosa, não porque guardava mágoas de sua ex-esposa, mas porque sabia que ainda a amava.

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