Capítulo 4

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A cidade está deserta. Procuro um lugar vazio para que eu possa deitar e passar a noite. Caminho em silêncio pelas calçadas, escutando as risadas e conversas das famílias que estão em suas casas, abrigadas e à espera do jantar. Às vezes me pergunto se elas notam que ao anoitecer, eu sorrateiramente reviro seu lixo procurando restos de comida para me alimentar.
Uma porta se abre. Um homem que aparenta ter trinta anos aparece, irritado, apontando um pedaço de madeira em minha direção.
– Você! – Grita. – Saia daí agora!
Eu estou na frente de seu portão, segurando em minha mão uma sacola que estava na lixeira.
– Você está querendo me roubar, é? – Diz, se aproximando. – Deixe isso ai!
Eu seguro um pedaço de hambúrguer já mordido, que alguém da sua família havia jogado fora. Olho para aquele homem que se aproxima com os olhos carregados de raiva e tenho medo do que poderá acontecer a seguir. Penso em fugir, correr, mas estou cansado demais para isso. Tudo ao redor parece parar.
– Ei, garoto. Eu não mandei você largar isso?
– Eu já estou indo embora. – Tento andar, mas quando dou o primeiro passo sinto sua mão segurando meu ombro.
– Você é surdo? Eu mandei você deixar isso aí.
– É só lixo, senhor.
– É o meu lixo.
O homem então se aproxima, puxa a sacola da minha mão e bate com a madeira em minha perna. A dor me faz cair de joelhos urrando de dor, finalmente soltando o que viria a ser o meu jantar.
– Obrigado. – Diz ele, pegando a sacola e jogando novamente no latão de lixo.
Eu permaneço deitado, observando-o se afastar, indo em direção à sua mulher e filhos. Ali com toda certeza vive uma família rodeada de porta-retratos pela casa e mágoas guardadas embaixo do travesseiro.
Eu poderia ter dormido no abrigo e não ter dado a vaga para aquela senhora e não ter passado por nada disso. Mas quando se conhece o que é ruim, fazer o bem é necessário.

Palavras de rua (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora