Prefácio

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— Line? – a típica voz rouca do meu primo me chamou.

Eu despertei do meu transe e reparei que me sentava em cima da mala, estacionada no chão. Meus olhos presos à Tevê que anunciava que a escalação gerida por Tite seria revelada em alguns minutos, mas eu pouco prestava atenção nisso quando o camisa dez surgiu entre a porta e o batente de seu quarto de hóspedes, onde eu estava alojada.

Eu apenas olhei para ele em resposta, como se indicasse que ele deveria continuar.

— O teu vôo, criança – ele avisou, apontando o óbvio motivo de eu estar sentada e pronta em cima de uma mala enorme e preta.

— A escalação é em alguns minutos, Ney, por favor... – fiz cara de chorosa, mesmo que eu soubesse que ele não tinha nenhum controle sobre isso.

— Você já sabe que eu vou ser escalado, modéstia à parte – disse arrogante, com um sorriso que contribuísse para a característica. – E, além do mais, foi você quem escolheu um vôo normal. Se o jatinho fosse meu... –

— Não vem com esse papo de jatinho 'pra cima de mim, por favor – choraminguei falsamente, sabendo das suas intenções em gastar dinheiro comigo mais uma vez.

Neymar fez uma carranca pois, assim como eu, estava acostumado a ter essa pequena discussão sobre valores.

— Criança, qual foi?! – ele cerrou os olhos, mas não parecia profundamente chateado, apenas inconformado. – Eu tenho dinheiro, qual o problema?

— Nenhum – encolhi os ombros inocentemente. pois realmente não via problema em ele estar rico em resultado de seu próprio esforço –, mas o use em você.

— E por que não em quem eu amo? – ele embirrava feito uma criança, o que o fazia hipócrita por atribuir esse apelido à mim, mesmo que fosse por ele ser mais velho.

— Porque o seu amor não é normal, Neymar – eu tive de rir enquanto gargalhava. – Até ontem, você estava querendo me oferecer um Tesla de presente e nem era meu aniversário.

Ele cruzou os braços, mais pilhado com o assunto.

— Não entendi qual é o problema – ele fez bico.

— Exatamente.

Meus olhos retomaram à enorme tela, aguardando o começo da coletiva de imprensa que certamente levaria mais tempo à acontecer. Mas não me daria ao luxo de ceder logo às instruções do mais velho, pois havia sempre um prazer embutido em contestá-lo.

— Ah, é? – ele me viu ignorá-lo após a resposta seca. – Então pode ir vazando que a hora do teu vôo já chegou.

Eu me mantive imóvel, mesmo sabendo que o que estava em jogo era a minha viagem e o valor que tinha gasto nela.

— Mais um pouco e você sobe meu jatinho, pirralha – ele rosnou. – É sério, quem você quer tanto ver me acompanhando?

Eu respirei fundo, como se estivesse prestes a explicá-lo, mas não pretendia. Nem naquele momento, e nem tão perto dele. Bastava tudo correr como tinha planejado. Bastava ele não ser convocado.

— Os outros jogadores, ué – menti, sabendo que ele provavelmente tinha pensado que o suspiro fosse de exaustão ao vê-lo insistir.

— Vê no seu celular – ele se aproximou, finalmente mostrando seu corpo inteiro e parecendo pronto a me colocar em seu ombro e me levar ao aeroporto.

— Não é tão emocionante.

— Vê a transmissão ao vivo, idiota.

Eu revirei os olhos e me apropriei do apelido atribuído a mim com destreza, levantando da mala e a posicionando verticalmente, para sair do cômodo.

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