Estamos passando todo o caminho em um silêncio constrangedor. Isso é desconfortável, mas tudo que penso em falar soa idiota. Zoe me olha de relance às vezes, desviando o olhar para outra direção quando a encaro de volta.
Para quebrar o silêncio, resolvo falar algo:
— Então...— Então... — Disse ela, ao mesmo tempo.
Nos encaramos quando percebemos que interrompemos uma a outra, e não consigo conter minha risada.
— Pode falar primeiro — disse a loira.
— Há quanto tempo você está aqui?
— Por volta de três dias. E você? — A garota falou, claramente curiosa.
— Quatro anos.
Seus olhos demonstraram uma expressão de choque. Com isso, o silêncio retornou.
O sol estava quase se pondo quando estávamos prestes a chegar. Decido avisá-la.
— Falta pouco para chegarmos. É logo ali — aponto a direção da casa, é possível vê-la ao longe.A moça me olha, observa a casa e dá um sorriso sem mostrar os dentes. Seguimos em silêncio o resto do caminho.
Entretanto, eu sei.
Posso ver em seus olhos, suas palavras, seu modo de agir.
Ela não é uma pessoa cruel. É uma pessoa boa. Com um coração bom.
Pouco tempo depois, finalmente chegamos.
— Chegamos — digo, mesmo sendo óbvio.— Casa bonita — ela diz enquanto entramos.
— Aqui é a cozinha. Vou fazer algo para comermos. Se precisar, o banheiro é a primeira porta do corredor — indico a direção.
— Obrigada — ela anda até o banheiro. — Aqui?
— Sim — respondo, sorrindo.
Enquanto preparo a comida, ela volta e me observa. Olho para ela e digo:
— Se quiser, pode explorar a casa. Quando ficar pronto, chamo você.
— Muito obrigada, Íris.
Assim que termino de preparar a comida e arrumar a mesa, vou procurar Zoe. Ela não está no banheiro. Não está na plantação, nem no jardim. Procuro em todos os lugares, e não encontro-a. Decido procurar no meu quarto, e a vejo olhando meus desenhos.
Ela não percebeu que eu estava ali. Fico observando-a por alguns segundos. Ela é linda. Meu coração acelera novamente.
Queria "pausar" o tempo e ficar observando ela andar e olhar cada desenho, um por um, com muita atenção. Mas ela deve estar fome. Melhor chamar.
— Zoe? — Chamo. — O jantar está pronto.
A garota me olha, assustada.— Ah, sim, claro. Desculpa. Seus desenhos são incríveis — comenta, sem fazer contato visual.
— Fico feliz que tenha gostado.
Ela anda na direção da cozinha, de cabeça baixa. Depois de comer (em silêncio novamente), ela parece meio perdida sobre o que fazer em seguida.
— Vou tomar banho e escovar os dentes. Depois você pode também — disse, tentando ajudá-la.
— Certo, mas eu não tenho roupas...
— Use as minhas, não se preocupe — Zoe me olha, envergonhada.
— Ah... Tudo bem. Você é muito gentil.
Assim que terminei de tomar banho, encontro Zoe perto da minha estante de livros, lendo um de fantasia. Caminho lentamente até ela e falo:
— É bom?Ela olha pra mim com as sobrancelhas levantadas.
— O livro?
— Claro.
— Sim, é muito bom. — ela ri enquanto fala.
— Agora é seu.
— Quê? — Ela diz me olhando surpresa, sorrio com sua reação.
— O livro. É seu.
— Mas eu não tenho como agradecer você.
— Você estar aqui é um presente. Fique com o livro.
— Obrigada, você é muito gentil.
— Vem, pode escolher um pijama no meu armário.
Fico esperando ela no meu quarto, para mostrar o dela, após arrumar a cama. Escuto a porta do banheiro se abrir e vou em sua direção.
— Arrumei um quarto para você.
— Certo. Obrigada.
Ela me segue até lá.
— Boa noite, até amanhã — digo.— Boa noite, até.
Vou até o quarto e deito pensando no dia de hoje. Ainda não nos conhecemos bem, mas Zoe parece uma pessoa incrível. É a primeira vez que me sinto tão feliz em muitos anos. Sinto que as coisas estão prestes a melhorar!
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momentos antes do caos
FantasiPessoas cruéis, corações bons e... borboletas? Um lugar vazio, problemático e isolado além de pequenos animais encontrados pelo caminho de uma semideusa que fora injustiçada por alguém que deveria ser gentil. Anos se passaram em uma rotina entediant...