CAPITULO DEZ

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No final da cidade tem uma rua abandonada que dá em uma velha construção tomada pelo tempo e pela flora. A ideia da prefeitura era fazer uma enorme biblioteca, mas por conta da distancia eles desistiram do projeto, e por isso o local ficou conhecido como: a rua do farol, formato que ia ser o prédio. Atrás das arvores e plantas de onde seria a obra, existe um pequeno caminho que dá em uma ponte de madeira segurada por cordas. Todos sabem da ponte, mas ninguém sabe como ou desde quando ela foi parar ali. Do outro lado só se ver a enorme paisagem verde, como se a mesma não chegasse a lugar nenhum.

A velocidade em que meus pés correm a tal direção é um tanto questionável para o desespero que estou sentido. Correndo nas calçadas, penso em dar uma de CJ pra chegar mais rápido de carro, mas não acho que seria uma boa ideia. A dificuldade em achar um contato chega a ser bizarra, é como se o celular estive todo escrito em alemão. Diminuo a carreira pra pegar fôlego, mil e um pensamentos avulsos passam na mente que mal ouço o celular tocar.

— onde você tá? — quase engasgo a dizer a frase

saindo pra escola, por quê? — Afonso responde confuso

— o Álvaro é o suicida, ele...

o que? Tá maluco? De onde cê tirou isso? — ele me corta antes que eu termine

— liga pra Selena e vão pra rua do farol, rápido!! — desligo a ligação e aumento a carreira de novo

O céu nublado revela uma bela duma chuva se aproximando. Álvaro sempre foi o mais esperto e inteligente do grupo, e colocar o código binário na publicação foi uma jogada de mestre se ele queria que eu focasse cem por cento no Nathan. Ele — assim como Selena e Afonso — sempre soube do sentimento de duvida quanto ao meu irmão. Eu sempre enchi todo mundo de perguntas, sempre com a pulga atrás da orelha com todos, e segurar o lance da hipnose, creio eu, deve ter sido complicado pra eles, mas acima de todos pro Álvaro.

Enfim chego à rua sem fôlego algum, o vento cada vez mais forte balança os galhos das arvores, o frio sobe do pé até a cabeça me fazendo tremer. Avisto de longe um fino caminho de terra entre as plantas e sigo as pressas.

Com passos leves e sorrateiros sigo caminho na bizarra e tenebrosa ponte suspensa da rua do farol. Meus olhos por si só evitam encarar a enorme descida de rochas que se despencam metros e metros abaixo até a água.

Observo meu amigo tremulo com as mãos agarradas a corda que suspende nossa atual superfície. Seu olhar vermelho — e fixo ao precipício à frente — entregam lágrimas de uma noite inteira.

— sai dai! Por favor! — peço em um tom nervoso e aflito dando mais alguns passos.

— não! — ele responde calmo sem sair de sua posição atual.

— não faz isso com você! Eu te peço — chego um pouco mais perto, porém não o suficiente para o alivio.

— eles fizeram isso, não eu. Você tem uma vida pela frente, eu não. Deixe-me morrer!

— Álvaro, por favor! — meu nervosismo me impede de pensar no que falar

O som que a ponte faz contrasta com os trovões no céu e com a ventania dando um ar bizarro de filme de terror

— vem pra cá... Vamos conversar! — meu corpo treme por inteiro

— a gente tinha uma vida... — ele diz encarando o horizonte — e eles estragaram tudo

— como eu falei, fazer isso não vai trazê-lo de volta... Ele não ia querer isso pra você — ele me encara — ele quer que você seja feliz

— não posso ser feliz sem ele...

Deixe-me morrerOnde histórias criam vida. Descubra agora