HEITOR FALCÃO
Enquanto seguíamos para o noroeste em direção à cachoeira, num dos pontos mais afastados da fazenda, eu tinha certeza de que Pedro me levava para alguma aventura. Não era de hoje que eu conhecia aquele sorriso matreiro e aquele olhar brilhante, ele sempre ficava agitado quando tinha alguma ideia. E eu podia jurar que agora tinha a ver comigo.
Cavalgando em um galope rápido, com o chapéu bem enterrado na cabeça, eu me divertia. No fundo confiava no meu irmão e sabia que, o que quer que fosse, era algo para me agradar. Mesmo sendo safado, arredio e debochado, era meu melhor amigo e pensava sempre no que fosse melhor para mim. Acho que ele acreditava que, sendo um ano mais velho, tinha certas responsabilidades comigo. Mal sabia que muitas vezes era eu quem cuidava dele, mesmo quando nem percebia.
Às vezes eu achava que era um velho num corpo de rapaz. Minha mentalidade não era boba como de meus amigos. Eu já tinha minhas responsabilidades, meus desejos, minhas prioridades. Observador, normalmente mantinha longas conversas comigo mesmo, refletia sobre o que acontecia ou me cercava, gostava de ponderar os assuntos e normalmente só tomava uma decisão depois de analisar o melhor caminho.
Pedro era totalmente diferente. Ele se jogava de cabeça nas coisas, agia por instinto, pensava depois, geralmente quando a merda já estivesse feita. Enquanto eu era controlado e precavido, ele tirava rápidas conclusões de tudo e se estressava, muitas vezes metia os pés pelas mãos. Talvez por isso nos déssemos tão bem, um conseguia um pouco mais de equilíbrio se espelhando no outro. Nossa convivência muitas vezes me deixava mais arrojado e ele mais prudente. Se é que se podia ser prudente com 17 e 16 anos, ambos no auge da idade hormonal e do descontrole.
Eu entendia Pedro melhor do que ele poderia imaginar. E sabia que, de todos nós, parecia ter sido um dos mais afetados com os acontecimentos de dois anos atrás na nossa família. A descoberta da traição da minha mãe e sua consequente tentativa de suicídio tinham causado uma desgraça para cada um.
Como mais velho, Theo mergulhou ainda mais no trabalho e nas suas responsabilidades. Aos 21 anos, já era o braço direito do nosso pai e assumia praticamente sozinho o escritório da cidade. Joaquim era pequeno demais para entender. Sentia falta de nossa mãe, mas tinha Tia para suprir suas necessidades. Eu sofria com tudo, mas há muito tempo compreendi que o ser humano era capaz de coisas inomináveis. E que cada um tinha seus defeitos e qualidades. Minha mãe me decepcionou e entristeceu, mas não a culpei ou deixei de amá-la por isso. Não a julguei. Só tentei entender.
Micah foi afetado porque não perdeu só nossa mãe naquele processo, mas se tornou alvo do ódio e do desprezo do nosso pai. Eu desconfiava que havia mais coisa ali, que talvez ele fosse fruto daquela traição, embora não tivéssemos certeza de nada disso. As datas do nascimento dele batiam com uma possível gravidez após nossa mãe ter se envolvido com Pablo Amaro. E por tudo, aquela era uma desconfiança minha, que eu achava que Theo e Pedro também tinham.
E Pedro mudou demais depois de tudo. Ele sempre foi louco por nossa mãe. Fazia de tudo por ela, era realmente apaixonado. Acho que a via como um anjo, um ser de luz, algo além de erros e defeitos. Talvez isso explicasse sua decepção tão grande, sua dificuldade em aceitar que ela pudesse trair e ser infiel. Talvez se ela tivesse assumido e tentado reverter, as coisas se ajeitassem. Mas tentar se matar foi como nos abandonar de vez, deixar de se importar com os próprios filhos, ser covarde e fria. E isso o tinha nocauteado, como um marco na vida dele. Eu sabia que ali Pedro tinha mudado radicalmente e se fechado emocionalmente.
Eu esperava que com o tempo ele se abrandasse e deixasse de ser tão cínico. Vivíamos uma idade difícil, mas eu acreditava que, tão logo fosse adulto e conhecesse uma boa mulher, se apaixonaria e esqueceria aquela decepção, seguindo em frente. Cada um sabia como lidar com suas próprias dores e eu tentava entender as dele, aliviar suas angústias, ser seu amigo sem falsos moralismos ou me meter demais.
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Rendida (Livro 4 da Série Segredos)
RomancePedro e Heitor Falcão são irmãos e grandes amigos. Sempre dividiram tudo, inclusive mulheres. Um é mulherengo e foge de relacionamentos; o outro é sedutor e romântico. Ambos pertencem à poderosa família Falcão, em Minas Gerais. Na pequena cidade de...