Capítulo 9

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O telefone que não parava de tocar há cinco dias finalmente silenciou.

E o primeiro dia de trabalho havia sido comum.... Havia chegado antes das oito, vestia calça preta e uma regada elegante sem decote, um colar com uma esmeralda falsa enfeitava seu pescoço. Recebeu uma sala ao lado da do prefeito, uma sala toda de vidro no grande prédio da prefeitura. Elaborou toda campanha de marketing das quatro próximas semanas, uma abordagem de atender a todos no um a um e o máximo de divulgação possível de fotos humanizadas.

Por volta das quatro horas da tarde foi chamada para fotografar uma reunião. O café que serviam era bom, mas ela temeu tomar mais de três copos e mais uma vez sofrer com insônia.

Ela distraiu-se tanto no trabalho que por breves momentos esqueceu de como estava se sentindo sozinha e assustada.

Quando chegou em casa por volta das dezoito horas, jogou a bolsa no sofá e analisou a geladeira, carne congelada, leite, cereal, ovo e quatro barras de chocolate light, devia se dar ao luxo de sair para jantar.

Aos poucos estava reaprendendo a arte de apreciar sua própria companhia. Havia uma arte que Carlos havia a ensinado em vida, pegar algo quebrado e reconstruir colocando ouro, tornando aquilo mais preciso e mais bonito do que era antes, ela tentaria, só precisava achar algum ouro para derreter.

Se apressou em tomar um banho e por uma calça clara e uma blusa azul de ombros caídos, não fez maquiagem, cada dia que passava detestava mais ficar sozinha dentro daquela casa.

Na noite de sexta o delegado havia dado o número de telefone para ela, pensou em ligar e convidar para um jantar, agradecendo por ele ter feito companhia em uma noite horrível, mas aquilo parecia intimo demais.

Precisava se reconstruir sozinha – Disse para si mesma.

O destino pareceu discordar. Pois quando entrou no restaurante Cassiano estava lá e todas as mesas estavam ocupadas.

Sua única companhia eram três garrafas de cerveja vazias na mesa.

- Se beber não dirija delegado.

Ele ergueu os olhos e lhe deu um sorriso. Ela ergueu uma barreira no coração. Não permitiria se apaixonar por ele.

- E por isso você gentilmente veio me oferecer uma carona.

- Preciso retribuir pela noite de sexta.

- Sente-se. – Ele falou enquanto lhe servia um copo de cerveja.

- Obrigada... Por ficar comigo quando não precisava.

- Não é todo dia que uma mocinha de camisola vermelha está em apuros. – Ela sentiu vontade de jogar o copo de cerveja na cabeça dele.

- Já lhe chamaram de irritante hoje?

- Não.

- Você é a criatura mais irritante e autorreferente que eu já conheci.

- Não deve ter conhecido muitas pessoas então.

Talvez fosse a cerveja começando a fazer efeito, mas ela tomou uma atitude que em outro criticaria, mostrou a língua para ele. O delegado gargalhou e aquela muralha que ela ergueu ameaçou cair.

- O que lhe traz aqui?

- Eu estou evitando comer minha própria comida e você?

- Comemorando meu emprego novo. Assessoria de imprensa do prefeito.

- Parabéns! Agora estou comemorando seu novo trabalho também. – Por um breve momento a animação do delegado pareceu sumir e ele acrescentou – Políticos são sujos, se alguma coisa suspeita acontecer, se eles se olharem de modo estranho para você, deve me ligar imediatamente.

- Eu sei me virar.

- É um pedido, e uma ordem.

- Eu tenho seu número.

- Não só pra emergências.

- Espero não ter mais nenhuma emergência, a última coisa que eu preciso é que minha casa seja invadida mais uma vez.

- Ser levada em casa depois de tomar cerveja também é considerado uma nova espécie de emergência.

- Como se você não houvesse bebido mais do que eu... Diga-me uma coisa, você não devia estar por ai prendendo quem dirige alcoolizado?

- Estou mais ocupado em salvar mulheres que tem a casa invadida, e em jantar com uma bela mulher.

- Está dando em cima de mim delegado?

- Não... Só tentando fazer com que se sinta incrível mais uma vez. – Aquelas palavras lhe atingiram no fundo do peito.

Para seu alivio, para evitar que o silencio reinasse diante de uma resposta que ela não tinha, o garçom chegou na mesa trazendo os dois pratos que haviam pedido.

Passaram a maior parte do tempo em silencio, poucas foram as amenidades que falaram. Quando terminaram Cassiano não permitiu que dividissem a conta, ele era um homem de respeito, não importava os protestos de Helena.

- Quer que eu a leve em casa? –

- Não precisa, estou de carro.

- Boa noite Helena.

- Boa noite Cassiano.

Ela entrou no carro, enquanto ele seguiu parado no estacionamento, a cabeça virada para cima. Helena o observou sem entender.

- Helena... Olhe as estrelas. – Ele disse e sorriu.

- Estão lindas...

- Olhe de verdade mulher, e faça um pedido.

Naquele instante, pelo brilho nos olhos dele, Helena descobriu que o delegado durão e sarcástico amava ver as estrelas, que tinha um coração tão bonito.

Devia mesmo continuar olhando para as estrelas, se continuasse olhando para ele não seria capaz de evitar se apaixonar.  

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⏰ Última atualização: Jan 03, 2023 ⏰

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