Acordei com Kang chamando meu nome repetidas vezes, eu estava deitado no chão da sala de testes e ele me encarava com aqueles grandes olhos arregalados. Meu ouvido estava baixíssimo, mal conseguia escutá-lo, mas conseguia sentir o desespero na vibração da sua voz.
Logo meus pensamentos foram inundados pela memória do que eu acabara de descobrir. Senti meu coração apertar e pisquei diversas vezes tentando acordar desse pesadelo nojento. Mas não é possível acordar da própria realidade. "Beomgyu, o que está acontecendo?"
"Kang, você pode emitir mandado de prisão, certo?" Foi a primeira coisa que falei assim que adquiri minha consciência outra vez e minha visão tinha parado de rodar. "Posso. Mas o que aconteceu? Por que você está falando disso agora?"
"D.J.S, Kang. Johnny Suh." Sussurrei, seus olhos que estavam arregalados se arregalaram ainda mais. Kang havia ficado pálido mas recuperado a cor rapidamente, sua áurea havia mudado completamente, conseguia sentir a fúria que estava borbulhando dentro dele agora.
Ele se levantou e estendeu a mão para mim em silêncio, eu aceitei a ajuda e logo estava de pé. "Não temos provas o suficiente, mas eu posso emitir um mandato temporário. Teremos 72 horas para fazer ele confessar. Mas isso deixa comigo." Nunca havia visto Kang daquela maneira, ele tinha uma áurea soberba que nunca havia carregado desde que eu o conhecera.
"Tudo bem, vamos na casa dele então. É uma viagem longa."
"Vamos nos trocar primeiro. Não tem como prender o delegado mais famoso da Coréia vestindo t-shirt." Ele passou pela porta sem nem me lançar um olhar. Senti meu coração errar uma batida e afastei todo e qualquer tipo de pensamento impuro relacionado aquela versão autoritária de Kang.
Não demorou para estarmos completamente vestidos como aquelas duplas dinâmicas de filme de policial, e não vou negar que Kang Taehyun de jaqueta de couro deveria ser considerado um dos sete pecados capitais. Toda aquela luxúria que carregava nos olhos enquanto dirigia me deixou intimidado, uma mistura de sentimentos em direção ao Kang. De vez em quando ele me lançava um olhar e eu engolia em seco, dei uma boa supervisionada na roupa que usava e a arma posicionada em seu coldre deixou tudo ainda mais convidativo.
Desviei o olhar para o painel, no relógio batia 00:00 e praticamente escutei Feeling Good do Chilled Jazz Masters tocar de fundo quando estacionamos na frente da casa do delegado. Eram 3h30 de viagem de Samcheok até Seul, se Johnny fosse uma pessoa no mínimo esperta já teria saído daqui a décadas. O problema é que ele queria ser pego, ele queria esse drama, então provavelmente estava deitado em seu leito esperando pela campainha tocar.
"Faz seu show, Kang. Eu não posso fazer nada." Sorri de lado e ele revirou os olhos como resposta. Saltamos do carro do mais novo e ele tocou a campainha, segurava seu distintivo na mão esquerda, a mão direita no coldre. Uma onda de adrenalina e medo me invadira naquele momento, me lembrei de todos os momentos que tratei Johnny como um pai para mim, de todos os momentos que ele me encorajou nos meus estágios na delegacia da capital e quis acordar daquele pesadelo maluco outra vez.
Também segurei minha arma, não deixaria Johnny machucar mais ninguém. Muito menos Kang.
Quando a porta se abriu e a imagem do homem mais velho, mais musculoso e mais frio se revelou, ele tinha um sorriso no rosto como se soubesse o que estava prestes a acontecer. Meu sangue esquentou e todas as memórias boas que eu tive com ele se esvaíram naquele momento.
Kang levantou seu distintivo, e puxou a algema que pendia em seu coldre. Meu medo aumentou quando Johnny desceu o olhar para a arma no quadril de Taehyun, saquei a minha mas não apontei, ele desviou o olhar para mim e voltou a sorrir. "Polícia de Samcheok, Delegado. O senhor está preso temporariamente em nome da lei. O senhor está sendo acusado de ser o suspeito do assassinato de Xu Minghao, Lee Minho e Choi Jongho." Falou, puxando os pulsos de Johnny que aceitou em silêncio sem parar de sorrir. "O senhor tem o direito de ficar calado e tudo o que você falar aqui pode ser usado contra você no tribunal."
Senti atrás de mim o barulho da viatura, me surpreendi, quando foi que Kang tinha chamado reforços? Então tudo fez sentido quando Oficial Nishimura desceu do banco do motorista. Ele não tinha chamado, mas tenho certeza que quando Niki nos viu sair correndo, desesperados, nos seguiu até aqui. "Bota ele no camburão, investigador Kang."
Ele obedeceu. Nishimura me encarava com os olhos semicerrados. "Você foi imprudente em sair sem me avisar. Esperavam levar um assassino em série para a delegacia no banco de trás do carro? Vou te dar uma bronca mais tarde, mas agora vamos para a delegacia que vocês precisam fazer esse homem confessar a tempo." Revirou os olhos, eu sabia que tinha feito uma merda sem tamanho em meter Kang nessa burrada de prendê-lo sem provas concretas, mas era necessário. Minha intuição nunca falhou, não iria ser agora que falharia.
Assim que a viatura sumiu pela esquina, suspirei. Ele me encarava sem expressão. "Como se sente?" Questionou.
"Horrível. Aquele sorriso debochado deixou meu sangue quente, eu nunca imaginei que seria ele." Me sentei no meio-fio, Kang se sentou ao meu lado e acariciava meu joelho. "Ele era como uma inspiração para mim, isso é horrível. Ele sempre me apoiou, sempre me incentivou, sempre cuidou de mim. O quão terrível uma pessoa consegue ser para chegar a esse ponto?" Meu coração apertou.
"Eu sinto muito, Beomgyu. Eu sei que é difícil de acreditar e difícil de lidar, mas vai passar. Se quiser, você pode ficar fora do interrogatório... por mais que eu ache que ele só vai confessar se você estiver junto."
O encarei, deixando-me prender e me distrair nos grandes olhos castanhos de Kang. "Obrigado."
"Pelo quê?" Questionou, parecendo genuinamente confuso. "Por ter confiado em mim. Por ter se colocado em risco prendendo ele."
Ele sorriu. "Não precisa agradecer, somos parceiros. Claro que eu confio em você... agora." Acrescentou dando um peteleco no meu ombro. Retribui o sorriso. "Poxa, agora que lembrei. Eu pedi uma pizza e o entregador deve ter ficado tão bravo."
Kang gargalhou e o som de sua risada inundou meus ouvidos de forma agradável, não controlei um sorriso maior de aparecer. "Acho que se a gente contar para o entregador que estávamos prendendo um delegado que na verdade é um assassino, ele não acreditaria."
"Por que será que ele estava sorrindo?" Questionei, ele se levantou do meio-fio. "Ninguém sabe o que se passa na cabeça dessa gente. Mas, amanhã iremos fazer o interrogatório!"
"Só amanhã?" Me levantei também, ele assentiu com a cabeça. Kang ainda tinha aquele aspecto policial de filme, mas sua área não brilhava vermelho-fogo dessa vez, parecia mais calmo. "Sim, vamos deixar ele apodrecer um pouco antes de confessar. E além do mais," ele disse alongando o pescoço.
"Precisamos descansar também. Quer que eu te leve em casa?"
Abaixei a cabeça. "Posso dormir na sua?" Perguntei, quase num sussurro. Eu sentia seu olhar queimar em cima de mim. Não recebi uma resposta, apenas senti a mão quente de Kang sobre os meus dedos gelados, me conduzindo pela rua até o carro. Acho que isso era um sim.
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Misteri / ThrillerKang Taehyun é um investigador renomado, conhecido por desvendar casos misteriosos da capital arquivados sem solução a décadas. Mas ele era o segundo melhor detetive de Samcheok, ficando atrás apenas do perito criminal Choi Beomgyu. Quando um assass...