Capítulo 20

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Lobo

Já estava acordado quando o dia amanheceu. O tempo
estava nublado e se parecia com o humor da minha alma naquela
manhã.
Na madrugada passada, fui do céu ao inferno em questão de
minutos.
Desci os dedos pelo braço de Anastácia  e sondei seu rosto,
agora tranquilo, relembrando o exato momento em que ela teve
mais uma crise de terror noturno. Os gritos estavam mais agudos,
dolorosos. Talvez atiçados por tudo o que passamos no dia anterior,
não sabia. Mas tinha a plena convicção de que meu coração ainda
parecia com defeito, tamanha a dor que o atingiu.
Por que alguém com tanta luz precisava sofrer daquele jeito?
Não conseguia entender.
— Aconteceu de novo, não foi? — A voz de Anastácia  surgiu
arrastada quando ela me flagrou velando seu sono.
Ergui a mão e acariciei seu rosto com cuidado, ela fechou os
olhos quando sentiu o toque e fui tomado por uma necessidade
absurda de protegê-la até mesmo dos próprios pensamentos.
Sabia que o que aconteceu entre nós foi errado, sabia que
nem sequer deveria estar naquela cama quando ela acordasse, mas
como impedir a necessidade absurda que sentia de presenciar
aquele par de olhos de jade se abrindo logo cedo? Como afastar
minhas mãos dela?
— Acho que ficou impressionada com o que aconteceu
ontem — suavizei.
— Sinto muito. Não deve ter sido nada fácil. — E não foi
mesmo. Vê-la sofrer, perdida em seu próprio subconsciente me
deixava com uma sensação de impotência terrível.

— Fiquei preocupado com você, Ana. — Acariciei sua mão. —
Existem alguns tipos de tratamentos que talvez possam ajudar. —
Não mencionei que quase sequestrei meu irmão para que ele me
dissesse todos os tipos de recursos possíveis para quem sofria com
terror noturno.
— Não quero me dopar de remédios, Christian. — Ouvir
meu nome da boca dela fazia uma sensação estranha transpassar
meu peito. Algo bom. Bom até demais. — Sei que pode não
entender, mas garanto que é pior tomá-los.
— Há tratamentos que não envolvem medicação. Terapia, por
exemplo — indiquei.
— Ora, ora. Um guarda-costas durão como você está mesmo
me indicando terapia? — Ela abriu um sorriso lindo que varreu a
expressão cansada do seu rosto.
— É importante — soprei. — Deveria tentar. Consulte um
médico de sua escolha e faça o mesmo com a terapeuta. Não deixe
que ninguém escolha por você. — Tentei manter a boca fechada a
todo custo.
Precisava manter minhas suspeitas escondidas por
enquanto, ou acabaria colocando em risco a verdadeira identidade
de quem estava por trás daqueles ataques.
— Vou considerar seu conselho — disse por fim. — Agora...
será que podemos ir comer alguma coisa? Ai! — Dei um peteleco
bem leve na ponta do seu nariz.
— Podemos. — Ela subiu os olhos para os meus, deitada
entre meus braços tão relaxadamente que parecia algo comum e
rotineiro.
Envolvi seu rosto em concha, atraído pelos olhos verdes
profundos que brilhavam mais à medida que a luz do dia invadia a
cabana. Seus lábios inchados roubaram minha atenção e foi
naquele instante que decidi quebrar a promessa que acabara de
fazer.
Tomei sua boca com a minha em um beijo suave. Anastácia
arfou quando nossas línguas se encontraram. Enlacei sua cintura,
puxando-a para baixo de mim.

— Chris... — soprou em meus lábios quando sentiu o peso
do meu corpo, já duro pra caralho, sobre ela.
Rosnei, devorando sua boca. Comprimindo seu corpo, tão
pequeno perto do meu e então percebi que se continuasse ali,
daquela forma, acabaria perdendo o controle e os gemidos que
aquela mulher dava a cada segundo não facilitavam em nada minha
decisão.
Desfiz-me do beijo, repentinamente e me sentei na cama.
— Isso, precisa mesmo parar — soltei o ar.
— Já te disse. A solução dos nossos problemas é fazer...
você sabe. — A safada deu de ombros e mordiscou o lábio inferior.
— Não me provoque, senhorita Stelle . — Ri e me levantei. —
Teremos um dia cheio pela frente. — Anastácia  revirou os olhos e
bufou, insatisfeita.
— Aonde vamos agora? — ela questionou, saindo de debaixo
das cobertas.
— A um bar de um amigo meu.
— Um bar? — Sua voz fina e chocada quase me fez rir.
— Sim. Tenho uma casa de fuga mais segura do que essa
para nos abrigar.
— Tem aquecedor e comida? Posso até dormir no chão com
essas duas coisas — disse esperançosa.
— Tem muito mais que isso. — Sorri, analisando minha arma
sobre a pequena bancada que ficava aos fundos na cabana. —
Mantenho casas assim por toda a cidade, para clientes especiais e
tenho contatos que mantém as chaves em segurança.
— Não era mais fácil esconder a chave em algum lugar perto
da casa? — Anastácia  começou a amarrar minha roupa ao redor da
cintura, para ficar um pouco menor em seu corpo e acabou
estilizando parte da peça, que por sinal, ficava muito linda nela.
— Não é só a chave que esse amigo guarda — revelei. —
Ele também é um ponto de contato. Através dele, vou conseguir
falar com as únicas duas pessoas em quem confio cegamente.
— Que são?
— Meus irmãos.

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