Capítulo 19

409 56 5
                                    

Anastácia Stelle

Pegamos a estrada por um longo tempo. A chuva ficou mais
forte e as gotas, agressivas e muito grossas, nos encharcaram da
cabeça aos pés, mas não podíamos parar. Minha mão, assim como
todo o meu corpo, estava muito gelada, mas as mantinha segurando
firme ao redor da cintura de Lobo, que pilotava o mais rápido que
podia, entrando em curvas sinuosas em um controle muito
habilidoso. Era como se a moto fosse a extensão do seu corpo.
Depois de um tempo, meu queixo começou a bater
incontrolavelmente, assim como meu corpo tremia sem controle.
Subimos uma estrada alta, onde a neblina ficava mais densa e as
poucas luzes transformavam a estrada e em um túnel sem fim.
Viramos em uma rua de cascalho, escondida sob um
amontoado de árvores e não demorou muito até que uma casinha
singela, de paredes triangulares e toda de madeira, surgisse no
horizonte nublado.
Lobo parou a moto na pequena entrada da cabana, que não
tinha mais do que uma janela e uma porta.
— Consegue descer? — ele questionou quando estacionou.
— Acho que minhas pernas congelaram. — Forcei-me a
passar as pernas por cima do banco. Lobo me estendeu a mão
gentil, mantendo o equilíbrio da moto com suas próprias pernas
enquanto me ajudava a descer.
Entramos correndo na cabana logo em seguida e não me
surpreendi ao notar que ela era tão pequena por dentro, quanto
aparentou ser por fora. Não havia mais do que uma cama de
solteiro, uma porta aos fundos, que eu imaginava ser o banheiro, e
um armário ao lado de um fogão muito antigo, tudo no mesmo
cômodo.

Imediatamente tirei o blazer de Lobo, a fim de me livrar do
tecido encharcado.
Havia um cheiro estranho no ar, como se a casa estivesse
fechada há muito, muito tempo. Estremeci quando uma brisa fria
entrou pela porta junto com Lobo. Meus dentes estavam batendo.
Lobo se aproximou de mim e tocou meu maxilar com a ponta
dos dedos até que nossos olhos se encontrassem.
— Precisa tomar um banho quente. — Ele observou meu
rosto com cuidado. Uma sombra transpassou as íris coloridas e me
deixou em alerta.
— O que foi? — Levei os dedos ao rosto e senti uma pontada
assim que toquei a pele abaixo da bochecha. — Ai!
— Não toque. Está machucado. — O rosto compenetrado do
homem foi tomado por uma seriedade e uma raiva contida que me
fez temer. — Entre no chuveiro, guardo algumas mudas de roupa
minhas aqui e pegarei algo quente para você vestir. Está longe do
ideal, mas vai servir, por enquanto.
— E-e você? — Estremeci. — Também precisa tomar um
banho e se livrar dessas roupas molhadas.
— Vá primeiro, eu estou bem — garantiu e começou a revirar
o único móvel que tinha no lugar, além do pequeno armário embaixo
do fogão. — Tome. — Entregou-me uma toalha.
Fui até o banheiro sem ter certeza de que minhas pernas
suportariam o trajeto até lá. Por mais que tentasse, não conseguia
parar de tremer. O vestido parecia ter se tornado parte da minha
pele, de tão grudado. Entrei no banheiro, que por sinal era tão
pequeno quanto o resto da cabana, com uma pia, um vaso sanitário
e um chuveiro, sem boxe ou qualquer divisa.
A janela, que na verdade era um basculante, ao menos me
passava tranquilidade. Ninguém conseguiria entrar por ali. Liguei o
chuveiro e senti minha pele arder pelo contato da água, que graças
ao bom Deus, era mesmo quente. Logo a sensação deu espaço a
certo relaxamento, mas não me demorei. Sabia que Lobo só tomaria
banho quando eu saísse e ele estava tão, se não mais, molhado
quanto eu.

Desliguei o chuveiro poucos minutos depois e saí do banheiro
enrolada na toalha que Lobo me deu. Assim que abri a porta, notei
que a cabana em si era muito fria, e a tempestade que agora caía lá
fora não ajudava em nada.
— Separei uma calça, uma blusa e... uma cueca, caso queira
usar. — Quase caí para trás quando me deparei com Lobo enrolado
em uma toalha que cobria apenas sua cintura. — Já deve imaginar
que não tenho calcinhas por aqui.
Santo deus dos músculos bem definidos, a minha calcinha
ele teria a hora que bem entendesse... quis dizer, mas me contive
diante dos desenhos em ondas marcados em seu peito. Lobo era
forte, muito forte. A pele clara contrastava com as cicatrizes
espalhadas por sua pele, e por um instante fiquei eufórica por ter
aquele homem ali comigo, sozinha.
Um efêmero segundo que foi do céu ao inferno quando vi o
corte na lateral do seu braço.
— Lobo... — chamei e levei a mão à boca. Um misto de
sensações estranhas me atingiu ao vê-lo machucado. Queria ser
capaz de protegê-lo, assim como ele parecia disposto a dar sua vida
para me manter em segurança.
— É mais feio do que parece, não se preocupe. — Ele tentou
sorrir quando viu minha expressão assustada, mas podia sentir a
tensão em cada palavra que dizia. Lobo me estendeu as roupas e
as segurei sem tirar os olhos do machucado. Sentia-me culpada ao
extremo. — Vou tomar um banho. Tranquei a porta, não ouse
chegar perto dela. Se ouvir alguma coisa estranha, me avise
imediatamente. Não vou demorar.
Vesti a roupa, que de fato era bem quentinha e totalmente
preta, aparentemente como todos os looks de Lobo.
Sondei a cabana e me encolhi sobre a cama pelos minutos
que se passaram. A adrenalina estava começando a deixar meu
corpo quando Lobo saiu do banheiro já vestido, com os cabelos
úmidos caídos na testa e uma roupa similar à minha, porém, em vez
de camisa, ele usava uma camiseta que me permitia ver melhor o
machucado.

SOB A Proteção do Lobo Onde histórias criam vida. Descubra agora