Noite dos Mascarados

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13 de fevereiro de 65,

Era uma noite quente de verão, estava nos bastidores do espetáculo musical "Opinião", Nara, a protagonista desse show havia se ausentado por motivos de não sei o que (não me recordo),em sua ausência a própria tinha escolhido uma substituta a altura,uma menina nova de uns 18 anos, que veio de Santo Amaro para o Rio só para esse espetáculo.

A baiana se encontrava encolhida no canto da sala,já maquiada e vestida no figurino,só esperando para entrar em cena, um observador notaria que ela tremia levemente:

- Meu irmão vai me ver hoje, ele tá na plateia.- a garota tira os olhos antes fixos no chão e me olha.

- Seu irmão? Legal.- respondo sem ter o que dizer.

- Não é de falar muito né bonitão? - posso ver um sorriso aberto no seu rosto.

Antes que possamos trocar mais alguma palavra um dos produtores entra na sala e a puxa pelo braço. O espetáculo iria começar, as cortinas se abrem e é possível ver a casa de shows cheia, é totalmente visível a tensão nos ombros da garota, durante toda a duração da apresentação eu internamente, a desejava boa sorte.

A baiana cantava em altas vozes as 24 músicas que compunham a peça,era claro que os espectadores a observavam atentamente enquanto acompanhava com a voz o violão.

Quando menos espero as cortinas se fecham e Bethânia sai saltitante do palco,tenho que admitir que fiquei impressionado com sua performance. Com o tempo a plateia ainda aplaudindo se retira do teatro,sobrando somente,na primeira cadeira, um moreno cacheado e sorridente. A garota ao vê-lo pula em sua direção, o abraçando.

Nara então chega subitamente e, subindo em uma cadeira ela começa a bradar:

- Pessoal, foi pelo sucesso de hoje e pela participação da Bethânia que eu organizei uma festa pra gente, um baile de máscaras!

Todo o pessoal do espetáculo comemora e Nara me puxa pro lado:

-Chico se você aparecer sem fantasia nessa festa juro que te mato!

-Pois eu vou indo,para ter certeza de ir fantasiado. -dou um tapinha no ombro dela e me viro.

Dou uma última olhada no povo comemorando, principalmente na festa de Betânia e seu irmão que se abraçam e falam muito alto, ao sair passo por eles e solto um "parabéns" baixinho mas acho que eles não escutaram.

Entro no meu carro pronto pra ir quando escuto um toque na janela ao meu lado, ao olhar encontro o mesmo moreno cacheado e sorridente:

- O seu casaco! -ele ergue a vestimenta, me mostrando ainda pela janela- Você esqueceu e Nara mandou entregar.

- Ah..Obrigado..

- Caetano.

- Obrigado Caetano. -falo meio constrangido.

O moreno acena e eu passo a marcha, ainda posso jurar que vejo seus olhos grandes e castanhos me olharem avenida a fora e, depois de virar uma rua qualquer se apagando em minha memória fraca. Finalmente,chego em casa, soltando um suspiro pesado ao trancar a porta atrás de mim. Logo de cara vou ao banheiro, eu me despi jogando as roupas em qualquer canto e de repente um sentimento vem em mim. Posso jurar que os mesmos olhos que antes desapareceram em minha mente me observam, selvagens e incontroláveis. Balanço minha cabeça afastando os pensamentos mas, mesmo longes eles ainda são presentes.

Me troco colocando um terno e uma máscara, a mesma que usei em um baile de carnaval a alguns dias atrás, a máscara brilha em tons de preto e azul, mesmo achando suas cores e formato muito chamativos os que a vêem dizem que a cor combina com meus olhos.

Depois de percorrer um caminho de mais ou menos 20 minutos finalmente chego ao meu destino final. Copacabana palace, por um segundo duvido do endereço que Nara tinha me passado, se tratava do hotel mais fino do rio. Mas logo a vejo correndo em direção do meu carro:

- Tá bonitão em Chico, e aí gostou do lugar?

- Estou impressionado em Nara,juro que estava esperando menos. - A expressão dela muda de um sorriso aberto para um misto de riso e raiva.

- Deixa disso Chico! Somos o maior sucesso nos teatros, claro que tinha que ser grande.

Saio do carro e a garota me acompanha até o salão de festas. O ambiente estava meio escuro, somente com luzes coloridas iluminando alguns trechos do salão que estava completamente decorado com fitas, flores e tecidos coloridos. Meus olhos tentam se acostumar com a iluminação e, na maioria das vezes falham em me guiar até onde meus pés querem ir, não posso negar que tropeço várias vezes.

Em volta vejo rostos conhecidos e desconhecidos, e muitas conversas rolando soltas. me encontro sentado na mesa perto de um barzinho dentro do próprio salão, peço uma dose de whisky e acendo um cigarro, pelo menos estando de máscara eu posso ficar no meu canto sem que me atrapalhem. Em minha volta as pessoas dançam e se divertem, fico girando a cadeira, alternando entre olhar para a parede de bebidas do bar e para a folia dos convidados. Não sei ao certo quantas doses eu tomei para chegar a esse ponto, só sei que em algum momento daquela noite eu levantei daquela cadeira e comecei a dançar, dancei com pelo menos umas 10 pessoas antes de tomar consciência dos meus atos e voltar pra minha cadeira que agora estava tomada por Bethânia e seu irmão:

- Desce mais uma dose aí,campeão. -sinalizei ao garçom na minha frente antes de deitar minha cabeça na mesa.

De repente escuto uma voz que reconheço, se tratava do moreno de hoje mais cedo:

- Cê tá tentando esquecer quem? - ele pergunta tocando no meu ombro,acho que me arrepiei todo.

- Ninguém -falo meio enrolado e vejo, de relance, Bethânia chegar mais perto.

- Oh meu deuso, Chico, se preocupa não, esse palhaço aqui vai te animar. -levanto minha cabeça e vejo ela apontar para Caetano, solto uma risadinha.

- Só tu mesmo Bethânia, não ligue não Chico,ela é assim mesmo. -posso vê-lo rindo.

Minha bebida chega e a tomo em um gole rápido, agora com a cabeça levantada eu consigo ver o rosto dos dois, Caetano vestia uma camisa azul e calça branca, que realçava sua magreza, ele usava também uma máscara azul com detalhes roxos que se encontrava meio coberta por seus cabelos volumosos. Já Betânia usava um vestido estampado e uma máscara igual a do irmão. Por um minuto fiquei meio estático olhando para o baiano, seus traços marcantes transparecem sobre a máscara e, os seus olhos de vez em quando se viravam em minha direção e depois focavam em Bethânia:

- Como vão suas composições?- a cacheada me pergunta.

- Vão bem, já participei de alguns festivais esse ano.

- Não sabia que você compunha. - Caetano me pergunta com um tom de voz curioso.

-Componho sim. - falo desconcertado- mas não é nada de mais.

E assim ficamos conversando até os convidados irem saindo do salão, já eram por volta das 3:20 da manhã e naquela sala do Copacabana palace só restavam nos 4, eu, Bethânia, Caetano e Nara. Ainda conversávamos esperando a sobriedade chegar para dirigirmos até nossas casas, por ter passado quase toda a noite bebendo e conversando com os baianos, já me sentia mais a vontade em sua companhia e acho que podia dizer que até gostava da presença dos mesmos.










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