Capítulo II

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Eram quase cinco da tarde quando finalmente consegui sair daquele abafado necrotério que ficava ao lado do prédio principal da Scotland Yard. Enquanto caminhava para casa, ouvia as estridentes buzinas dos muitos carros que trafegavam pelas ruas do centro e que deixavam um rastro de fumaça por onde passavam. Aquele era o horário onde as diversas fábricas espalhadas por lá acabavam os expedientes ou trocavam de turno; então as ruas estavam lotadas de pessoas sujas e suadas, que nem sempre respeitavam os carros que passavam, e se arriscavam atravessando na frente daqueles carros. Alguns porque se distraiam conversando com seus colegas na volta para casa e outros porque estavam simplesmente cansados demais para prestar a atenção na sinalização.

Conforme me aproximava do escritório, aqueles barulhos incômodos iam diminuindo, e outros começavam, antes mesmo de dobrar a esquina da Praça de Soho eu já conseguia ouvir os pequenos gritos e conversas sem sentido das crianças que lotavam a praça. Enquanto eles se divertiam correndo uns atrás dos outros, suas pomposas mães conversavam entre si com suas roupas finamente trabalhadas e confeccionadas em tecidos luxuosos. Eu sempre me perguntava onde que arrumavam tanto assunto para conversar, já que em alguma hora, as fofocas deveriam acabar.

Enquanto corriam que nem loucas, uma das crianças esbarrou em mim e olhou para minha cara fazendo uma cara assustada. Eu nunca fui muito fã de crianças, já que eu nunca tive nenhum irmão e durante minha infância eu raramente saía para brincar com as outras crianças, então eu não estava acostumada a lidar com elas. Eu não fiquei irritada por aquele esbarrão, uma vez que aquilo era o que eu imaginava ser natural esperar de uma criança: berrar, ser mal-educado, rolar no chão e sujar aquelas roupas que provavelmente custavam o salário de uma semana daqueles trabalhadores do qual eu cruzava enquanto caminhava até aqui.

Olhei para aquela criança e esbocei um sorriso e comecei a estender a mão em sua direção na tentativa de tranquilizá-lo, porém ele se se afastou. Seus olhos se esbugalharam e começaram a lacrimejar, então ele então correu em direção a um dos bancos onde estavam algumas mulheres. Enquanto corria ele dava pequenas olhadas para trás em minha direção, talvez temendo que eu o seguisse. Ele nem chegou a alcançar os bancos, quando ele foi chamado pelas outras crianças e logo a brincadeira recomeçou, mas agora ele poderia se gabar para seus amiguinhos do seu encontro com a terrível Lisa, que a julgar pelo cheiro, carregava pedaços de cadáveres dentro de seu sobretudo. Ele seria o herói que conseguira fugir do monstro que tentou agarrá-lo à força e raptá-lo.

Eu achei melhor simplesmente seguir meu caminho, ou se não, a próxima grande notícia do jornal seria: "Detetive Lisa ameaça crianças em praça tradicional de Londres...". Como eu gostaria de ter o jeito e a paciência da Macy para lidar com crianças, ela faria aqueles pirralhos mal-educados implorarem desculpas sem fazê-los derramar uma lágrima sequer.

Subi as escadarias do prédio e na metade do lance de escadas que levavam ao segundo andar, onde estava meu escritório, ouvi a voz de Ethan, mas não consegui entender o que ele conversava. Já estava quase na hora de fechar o escritório, e eu estava exausta, a última coisa que eu desejava naquele momento era mais um cliente para atender. Diminui o passo e caminhei lentamente pelo corredor curto e mal iluminado que levava ao meu escritório. Enquanto me dirigia para a porta que tinha meu nome e o da agência gravados nela, observei pelo vidro fosco da porta uma silhueta que passou pela porta. Parei a alguns passos da porta e dali eu já conseguia distinguir algumas palavras e percebi o entusiasmo no tom de voz do Ethan, abri a porta do escritório esperando saber quem era o visitante que estava deixando Ethan daquele jeito, porém não havia ninguém.

Ao invés disso encontrei Ethan com um sorriso de orelha a orelha sentado sobre a mesa da recepção, com o telefone em seu ouvido e segurando a base com outra mão, sem mencionar é claro, do fio que estava esticado até quase o meio da sala. Além de usar o telefone para conversas particulares, ele ainda estava andando pela sala enquanto falava.

Miss Lisa e o Mistério das Adagas Sumérias.Onde histórias criam vida. Descubra agora