Capítulo 13: Introversão

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Alatus sentia-se assim a maior parte do tempo, sua energia psíquica era toda voltada para dentro de si, e muito raramente exteriorizava qualquer coisa com outras pessoas além de seu irmão. Tinha um semblante sério, uma personalidade fechada, afora a falta notória de traquejo social. Por isso, não podia dizer que tinha amigos ou companheiros, e sempre julgou que não precisava de nenhuma daquelas interações, ou estivesse se esforçando para se convencer disso. Conforme os anos e décadas passavam, apenas se acostumou a evitar o contato direto com os mortais, o que conflitava com sua curiosidade natural de buscar entendê-los. Talvez fosse uma consequência natural para todo ser que vive rodeado por guerras e conflitos, era mais fácil ser distante, do que se deixar aproximar.

Afinal, naqueles dias qualquer existência era considerada efêmera e breve, lidar com a morte se tornava mais fácil quando seu coração estava distante da sensação de luto.

Naquela noite, em específico, Alatus tinha decidido não pensar em monstros, demônios ou qualquer outra criatura maligna. Tinha concordado com seu irmão em aproveitar a "folga" e "relaxar", seja lá como se fizesse isso. CiCi ao seu lado, caminhava em passos leves, harmoniosos e despreocupados, como uma brisa rasteira que traz o calor da terra e a faz dançar na altura dos seus tornozelos causando-lhe cócegas. Ao longe, as luzes do vilarejo humano quebravam a escuridão como um pontilhado amarelo radiante. As fagulhas vindas das muitas fogueiras pairavam no ar, ocupando o espaço que normalmente pertencia aos vagalumes. As vozes eram audíveis, riam alto, conversavam em vários tons: velhos e novos, sons de passos para lá e para cá, uma cacofonia de pessoas sendo apenas pessoas.

Quando passaram a estrada de terra e alcançaram o portal de entrada da vila junto à colina Wuwang, a presença dos imortais não passou despercebida para os humanos próximos, que gradativamente diminuíam o tom da conversa para espiar as duas figuras de beleza sem igual que tinham acabado de chegar. Como se a interação com mortais não fosse o suficiente para deixar Alatus desconfortável, a forma como eles reagiam à sua presença naquele momento o fez querer dar meia volta e retornar para o antro da floresta. O Imortal lançou um olhar de soslaio para o irmão mais novo, que lhe arqueou uma sobrancelha em resposta. Ele não precisou pôr em palavras, sabia que não podia voltar atrás no que tinha dito, mas saber não tornava a coisa toda mais fácil.

O adeptus mais velho ergueu o queixo e respirou fundo, como se o gesto lhe desse coragem para saudar as pessoas de forma mais apropriada, como seria esperado de um sábio imortal. Mas antes que pudesse falar qualquer coisa, uma voz infantil irrompeu da multidão:

- Eu disse que eles vinham! - A pequena Lou cortou como um relâmpago por entre os mais velhos, aproximando-se dos dois irmãos sem qualquer ressalva. A criança sorria amplamente enquanto erguia os braços e acenava animada - Ninguém acreditou, mas eu sabia! Vocês prometeram!

- Essa é uma noite única - outra voz se fez audível em meio aos demais, um tom mais pesado e carregada pela idade. A anciã da vila caminhava em passos curtos e cautelosos, e saudou a chegada dos dois imortais: - Não é sempre que temos a oportunidade de receber os adepti em nossa humilde vila, depositamos nosso respeito e lhes damos as boas vindas.

Tanto Alatus quanto CiCi acenaram em uma reverência sutil, aceitando a hospitalidade da anciã. E antes que as formalidade se seguissem, a pequena Lou diminuiu a distância e puxou os dois Adepti pelas mangas de suas vestes:

- Eu que chamei, sou anfitriã, vou mostrar tudo pra vocês! Venham! Venham!

Alatus sabia que essa postura descontraída não era apropriada para bestas míticas se portarem, mas estava ali para cumprir o que tinha prometido para a pequena Lou, então em sua cabeça desenvolvia um pequeno paradoxo que o fez demorar para reagir. CiCi, por sua vez, apenas seguiu o ritmo , mantendo o mesmo riso fácil de sempre:

O Bater das Asas DouradasOnde histórias criam vida. Descubra agora