20. Pressagio

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S/N
San Francisco, Califórnia
12 de janeiro de 1982, 21:13

 — Quem vai te querer? Olha só para você S/N! — Henry, meu namorado, diz em um tom irônico, mas, o que ele não diz é a pura verdade — Você é inútil, ninguém nunca vai se interessar por alguém tão nojenta como você! — berra e logo após, outro tapa que faz meu rosto virar violentamente para o outro lado.

 Sinto tudo doer apenas por me mover minimamente. Meus braços estão doendo, minha boca está sangrando e minhas pernas não se aguentam em pé. Ele me bateu tanto. Tanto. O amor não devia doer assim.

 Henry é meu primeiro e único amor. Só ele me conhece de todas as formas, tenho tanto medo de o deixar e ficar sozinha. Não quero ficar sozinha. Não de novo. Não depois da morte dos meus pais.

 — ME DIZ! QUEM MAIS AMARIA VOCÊ? — diz me agarrando pelos ombros — Quem mais aguentaria seu cheiro nojento, seu halito podre! QUEM? — berra fazendo a casa tremer. Cansado de olhar para mim, ele me joga no chão com tanto ódio.

 — Não vou fazer de novo — digo entre soluços — Por favor não me bate mais — sussurro e as lagrimas voltam.

 — Depois de tudo o que fiz, depois de ter abrigado e cuidado de você? — ele não me abrigou, apenas se mudou para a casa que era dos meus pais e se apossou de tudo — Eu te acolhi depois que eles foram assassinados e mesmo depois disso você quer me deixar?

 — Entenda Henry, por favor — digo entre lagrimas — Você vai acabar me matando — tento me colocar de pé bem devagar — Eu vou embora, eu vou! — digo determinada. Me coloco de pé e tento me endireitar. Ele avança para cima de mim e agarra meu cabelo.

 — Eu sou o único que te ama, ninguém nunca vai amar você. Olha bem para você sua imunda! OLHA S/N! TEM ORGULHOSA DA MERDA QUE VÊ QUANDO SE OLHA NO ESPELHO? VOCÊ É ASQUEROSA! Só eu te amo, nenhum homem vai amar você. Nojenta! — tremendo muito, tento conter o choro. Ele tem razão, nunca serei amada. Só ele me ama e me aguenta com todos os meus defeitos.

 — Me deixa ir — digo entre sussurros chorosos — Por favor, me deixa ir — reúno forças mais uma vez. Essa é a última vez que tento. A última. Levo minhas duas mãos até a mão dele e afundo minhas unhas nele que me da outro tapa no rosto e me solta. Corro para a porta e abro.

 — NÃO! SABE O QUE FIZ PARA TER VOCÊ? FIZ MUITAS COISAS PARA TER VOCÊ! EU TIVE QUE MATAR OS SEUS PAIS PARA TER VOCÊ E AGORA VOCÊ QUER ME DEIXAR? — ele tira uma arma da cintura e aponta para mim. O quê?

 Meu coração acelera e meu corpo começa a tremer de medo. Eu não sabia disso, não podia ser verdade. Ele matou meus pais? Como pude ser tão ingênua em não perceber antes? Minha mente está em um turbilhão de emoções enquanto observo a arma apontada para mim.

 — Henry, por favor, não faça isso — digo com a voz trêmula, minhas mãos levantadas em sinal de rendição. Eu só queria sair dali, ir embora e nunca mais voltar. Mas agora, eu não sabia se iria sair dali com vida.

 — Você é minha, S/N. Não vou deixar você ir embora — ele diz com um olhar frio e calculista. Eu nunca vi esse lado dele antes. Nunca imaginei que ele seria capaz de matar alguém, muito menos meus pais.

 Eu tento me afastar lentamente, mas ele se aproxima de mim com a arma ainda apontada para minha cabeça. Meus pensamentos estão confusos, não sei o que fazer. Tudo o que quero é sair daqui com vida.

 — Por favor, Henry. Eu não quero morrer — digo com lágrimas nos olhos. Ele está olhando para mim com uma expressão de raiva e desespero.

 — Eu te amo, S/N, mas você não pode me deixar — ele diz, hesitante.

 Engulo em seco, tentando encontrar uma maneira de acalmá-lo. Mas minha mente está em branco, não sei o que dizer ou fazer. A arma continua apontada para mim e o tempo parece estar parado.

 — Henry, nós podemos resolver isso juntos. Não precisa ser assim — tento convencê-lo, mas minhas palavras parecem ter pouco efeito.

 — Não há nada para resolver, S/N. Você é minha e de mais ninguém. Não vou deixar você ir embora — ele repete com mais firmeza.

 De repente, um barulho alto vem da porta da frente, e os dois olhamos em direção ao som. Henry parece surpreso e nervoso, o que me dá uma oportunidade de tentar escapar. Com um movimento rápido, eu me afasto dele e corro em direção à porta, que parece estar aberta.

 Aproveitando a distração de Henry, corro em direção à porta, com meu coração batendo tão forte que parece que vai saltar do meu peito. Minhas pernas estão tremendo e minha mente está em um turbilhão de pensamentos. Eu não sei o que vai acontecer a seguir, mas sei que tenho que sair daqui o mais rápido possível.

 Eu me aproximo da porta e vejo que ela está aberta. Ainda não entendo o que está acontecendo, mas não importa agora. Eu preciso sair e encontrar ajuda. Eu corro para fora da casa, respirando com dificuldade, continuo correndo e me apoiando na casa enquanto tento chegar na garagem.

 Olho para trás e vejo que Henry não está atrás de mim. Eu não sei se ele ainda está na casa ou se está me seguindo. Minha mente está em alerta máximo, e cada som me faz pular de susto. Chego na garagem e procuro desesperadamente pelas chaves do carro.

 Finalmente as encontro e rapidamente entro no carro, trancando as portas. Ligo o motor e ao olhar para a frente, lá está ele com a arma apontada em minha direção. Ele admitindo que assassinou meus pais está ecoando por minha mente. Sem pensar, acelero e passo por cima dele.

 Meu corpo está tremendo e minha mente está em choque. Eu acabo de passar por cima de Henry, que estava apontando uma arma em minha direção. Eu não sei se ele está vivo ou morto, mas não vou parar para descobrir.

Presente
Mansão Hichello-Richards, Los Angeles
6 de março de 1987, 15:19

 Me inclino completamente para frente e vomito. Estou sentindo uma avalanche de sensações. É como se eu estivesse dormente por anos. Como se meu coração não existisse. Meus sentimentos estavam adormecidos e com razão. Mas agora, tudo isso está voltando. As memórias e as emoções. Fiquei com tanto medo de ficar sozinha que acabei me esquecendo de pensar além de mim mesma e agora? Tudo veio a tona em minha mente.

 Respiro fundo e me coloco de pé e caminho lentamente pelo campo em direção a casa principal da propriedade. Preciso pensar direito. Caramba! Que porra eu estou fazendo?

 Dou meia volta e caminho em direção ao piquenique. Michael ainda está lá, chorando e soluçando muito. Ele está com as duas mãos tampando o rosto. Não sei lidar com choro de ninguém. Eu nunca sei o que fazer.

 Me aproximo e me sento novamente na toalha. Me inclino até Michael e o abraço fortemente. Ele me abraça de imediato me apertando em seus braços como se eu fosse a única coisa que importasse nesse mundo para ele.

 — Eu escolho você — sussurro a ele com o coração doendo. Agora preciso ser razão. Se eu seguisse minha emoção, eu não sei o que Michael poderia fazer. Ele sem dúvida se enterraria em remédios, como em 1984, quando ele quase se viciou em anestésico. Sem contar que sou a única calmaria que ele tem em meio a todo esse caos que é a vida de Rei do Pop. 

18:32

 Enquanto caminhamos lado a lado de mãos dadas, sinto o perfume suave das flores e o som dos pássaros cantando. É um lugar tranquilo e bonito. Eu tento me concentrar no presente, na beleza do campo e na paz que sinto aqui.

 Tento a todo custo afastar as lembranças do passado da minha mente. Tudo veio a tona muito fortemente, por quê? Será que meu cérebro me odeia? Ao chegar na casa principal, abro a porta principal e entro. Está silencioso.

 — S/N! — River entra em minha frente empolgada — Chegou na hora certa! — ela fala empolgada — Vem conhecer o meu namoradinho! — diz entre pulinhos e risadinhas. Ela segura minha mão e me puxa até a sala de estar. Tento controlar minha respiração e manter a calma enquanto River me puxa pela sala. Eu sinto meu coração batendo forte no peito e minhas mãos ficam suadas enquanto River me leva em direção a Henry.

EximioOnde histórias criam vida. Descubra agora