Prólogo

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Há muito tempo 

  Um estranho silêncio havia se manifestado pela floresta nos últimos dias. Os animais estavam inquietos e amedrontados. O sol brilhava no céu azulado, trazendo calor para Waterfall, algo que não acontecia com frequência. As pessoas que lá moravam estavam alegres e contentes, não havia motivos para se preocuparem, diziam elas. 

— Você está distante hoje, Edur. Posso saber o que você está pensando? — indaga Luna, com a sua curiosidade de sempre. 

— Estou? 

Edur realmente estava com os pensamentos muito distantes, nos últimos dias. Ele não se conformava em como as pessoas da aldeia seguiam suas vidas despreocupadamente, depois do que fora  anunciado. Ele queria que elas acreditassem naquelas palavras tenebrosas sobre o futuro. 

— Deixa ver se adivinho, você segue pensando naquele discurso que Sky fez? "Dias de caos estão próximos'' — fala debochando, tentando imitar a voz do ancião. 

— E você não?! 

— E por que estaria? Nunca estivemos tão bem! Pense comigo. Temos comida para o inverno, os Filii Lunas estão se comportando e, não menos importante, eu vou ter uma irmãzinha! 

— Como você sabe que é uma menina? 

— A minha intuição nunca está errada. 

Ele não consegue deixar de dar um leve sorriso ao vê-la animada.Luna era amável, extrovertida e nunca deixava transparecer tristeza; todavia, azarada seria a pessoa que lhe deixasse irritada. Edur, por outro lado, amava aquela empatia. Era de se esperar que ele acabasse apaixonado pela menina de cabelos reluzentes. 

— Hey, não pense que esqueci do seu aniversário. O que você vai fazer? — Luna pergunta, ajeitando o cabelo para trás da orelha. 

— Eu estava pensando em chamar você para ir às cachoeiras. 

Ele pensou em dizer que havia lhe preparado uma surpresa, mas hesitou. 

— Hum... eu aceito. 

— Você não recusaria um convite meu — diz ele, lançando seu charme. 

— Não seja tão convencido, docinho. 

Ele sorriu, mas a ideia que eles estavam correndo algum perigo não o deixava sossegar. Ao contrário de Luna, já que nada parecia lhe tirar de sua tranquilidade. 

— Você pensa como todos os outros Mestiços, não é?! E se algo realmente acontecer, não seria melhor estarmos todos preparados?A menina suspirou, balançando a cabeça. 

— Entenda Edur, as pessoas acreditam no que acham melhor para elas. Não nos culpe por sermos esperançosos. Além disso, o ancião já está velho, nem sempre ele acerta tudo. Não ouviu o que ele disse, no outro dia, sobre pessoas virarem gatos? 

Ela deveria estar certa, pensou. Não havia nada que pudesse ser feito. Entretanto, a inquietude ainda o dominava. 

— Ei, docinho! — chama, tirando-lhe do transe. 

— O que foi, minha Luna? 

— Você me promete uma coisa? 

— Qualquer coisa. 

— Você promete que não vai me deixar sozinha? 

— Por que eu faria isso? 

— Só promete. 

Edur engoliu em seco. Ele lembrava do dia em que Luna havia perdido o irmão mais velho, que decidiu fugir com o circo em um ato de rebeldia. Quando a menina descobriu, o rapaz já havia partido há tempos. Ele entendia o porquê perdê-lo a assustava tanto. 

— Claro, eu prometo! Satisfeita? 

— Sim, melhor agora. 

Os dois adolescentes continuaram na companhia um do outro, deitados no gramado, sem terem ideia do que realmente estavam esperando. Se Edur soubesse que esse seria um dos últimos momentos juntos, jamais se permitiria ter ido embora. 

Então seu aniversário chegou e desgraçados foram aqueles que não acreditaram na palavra de Sky. O sol não brilhava mais no céu. A escuridão eterna havia tomado conta daqueles que não aguentaram o poder dos Corvins. Sua última recordação era ver Luna entre a multidão que gritava e corria, mas não havia mais nenhum sinal daquela garota sorridente à sua frente. Qual havia sido o destino dela, ele não sabia, pois, em um piscar de olhos, a menina havia sumido entre os corpos caídos e os miados assustados. No momento em que tudo foi tomado por um silêncio avassalador, foi que então Edur entendeu que aquelas centenas de pessoas caídas aos seus pés estavam mortas.  

Os Últimos MestiçosOnde histórias criam vida. Descubra agora