Tocar na cafeteria no domingo à noite foi quase tão cansativo quanto nos outros dias, mas eu não podia negar que estava me divertindo mais do nunca. E quando me deitei na cama às 2 da manhã, o som acústico dos instrumentos ainda parecia bem vívido e aconchegante.
Fechei os olhos, dessa vez pronta para dormir sem receios. Estava sorrindo e cantarolei um pouquinho, lembrando da sintonia que eu e os meninos tivemos a cada música.
Eu realmente podia me acostumar com isso.
No passado, eu sempre toquei sozinha, com exceção de alguns concertos nas filarmônicas que eu participava. Mas tudo ocorria de modo tão individualista e competitivo que não gerava a sensação de conjunto verdadeiro. Agora, eu fazia parte de uma banda. Damian ainda não gostava de mim, mas Jackson e Micah sorriam e brincavam comigo como se já fossemos amigos – ou pelo menos como se não me odiassem.
Adormeci com o embalo da harmonia de Euterpe ainda soando no ar. E acordei em meio ao tremor do caos de Éris.
Uma tremenda balburdia acontecia do lado de fora. Gritos e gargalhadas infantis e sons que imitavam ursos e leões estavam sendo reproduzidos, como se uma perseguição teatral estivesse em andamento.
Levantei sem pensar, não tendo certeza se estava assustada ou irritada – uma mescla dos dois sem dúvida. Escancarei a porta para avistar duas crianças correndo pela sala seguidas por Kate, dando risadas.
Minha irritação foi diminuindo para dar lugar a surpresa. Pisquei repetitivamente, lembrando-me de onde eu estava e tentando assimilar a cena.
— Kaila? Te acordamos? — Kate parou quase sem fôlego quando me viu de pé ali.
Ao invés de responder, franzi as sobrancelhas e encarei a minha irmã, e depois as crianças que também pararam de correr. Um menino e uma menina de no máximo 4 anos de idade se esconderam atrás do sofá, apenas as cabecinhas erguidas para me esguelhar, de repente tímidos.
— Quem é ela, tia? — foi a menina quem perguntou, a voz um doce de curiosidade. Ela ficou em pé no sofá, colocando as mãos na cintura em uma pose de autoridade – muito fofa pra ser levada a sério.
— Essa é a minha irmã. Kaila — Kate me apresentou, se colocando ao meu lado e sorrindo para a criança.
— Como o tio Karl? — O menino se levantou também, interessado.
— Exatamente como o tio Karl. — Kate se aproximou dos dois, e eu já sabia quem eram antes mesmo de ela revelar. — Esses são os filhos da Mel, Kaila. Essa menininha adorável é a Millicent, e esse menininho encantador é o Dennis.
Kate começou a dar beijinhos nos sobrinhos e eles gritavam e riam outra vez, implorando para que ela os largasse, mas parecendo se divertir muito com a brincadeira. Ela os deixou em paz depois de mais algumas cócegas e apertos nas bochechas, ainda sorrindo e exalando alegria.
Era uma visão e tanto, uma que eu nunca pensei em ver na vida. E a prova concreta de que minha irmãzinha era a tia mais babona do mundo.
Prestei atenção nos dois, que agora pulavam no sofá, e concluí que eles eram mini cópias de Melissa e Dillan pra ninguém botar defeito. A garotinha, que parecia bem menos acanhada que o irmão, sorriu para mim. Seu cabelo era um arranjo de cachos castanhos embaraçados e ondas bagunçadas, por brincar com Kate e correr pela casa.
— Você é bonita — ela disse. Millicent saltou do sofá para o chão e chegou mais perto de mim.
Abri a boca, mas não tinha nada que eu pretendesse dizer, eu só estava deslumbrada demais. Nunca soube lidar com crianças, porque eu nunca tive que lidar com crianças.
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Singularidades de um Amor (sem cerimônias) ✔
ChickLitSegundo livro da trilogia Os Collards Status: Concluído Classificação indicativa: +14 Design de capa por @EfitiaLexa #1 em ficçãofeminina (15/05/2023) #1 em chick-lit (02/09/2023) #8 em piano (15/06/2023) #10 em completo (07/08/2023) Mimada desde se...