Capítulo 40

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Sentada ali sozinha, com músicas sobre dinheiro berrando no meu ouvido, porque eu não queria escutar os meus próprios pensamentos, eu me sentia como uma casca vazia.

Meu rosto estava inchado e meus olhos vermelhos. Nem se eu tivesse toda a maquiagem do mundo ao meu dispor, eu evitaria de parecer abatida.

Eu poderia ter ido para a Escola de Música, mas aquele lugar não me pertencia. Eu poderia ligar para os meninos, mas comecei a ponderar se eles não pensavam exatamente como Ben. Não sabia o que estava fazendo quando comprei a passagem de trem para Sydney. Eu tinha tantos lugares para ir. Tantas pessoas que me ajudariam, mas eu simplesmente queria fugir de novo.

Queria deixar tudo para trás. Porque era isso o que eu fazia. Essa era quem eu era. Uma fugitiva do Destino.

Um medrosa sem alma, que não pertencia a lugar nenhum.

Como se eu estivesse em uma casa mal assombrada, as paredes da minha mente começaram a desbotar e a descascar em câmera lenta. A tristeza me inundando como se eu jamais tivesse sentido felicidade na vida, e tudo não passou de um sonho cruel.

As relações que eu construí, o caminho que eu percorri, e os sentimentos que eu adquiri. Tudo parecia um borrão. Se apagando, se desfazendo. Desaparecendo.

Na primeira ligação de Kate, eu coloquei o celular em modo avião – teria desligado se não precisasse checar a hora do embarque. Ela poderia me convencer a voltar rapidamente, mas eu não queria isso.

Todos estariam tão melhor sem mim. Aposto que a vida deles foi ótima quando eu não estava por perto, e até a minha fuga no passado fez Kate se apaixonar por Mark, então era o certo a se fazer. Ir embora.

Eu só precisava acreditar nisso. Não sabia o que esperava por mim longe, mas agora eu sabia como cuidar razoavelmente da minha vida. Daria um jeito.

Já eram 16 horas quando o som das engrenagens do trem começou a soar, indicando que ele estava chegando. Havia poucas pessoas na estação. O trem parou e abriu as portas. O embarque começou, e eu me levantei, pronta para seguir em frente.

Eu achei que tivesse dado os passos necessários até estar do lado de dentro, mas tinha parado antes. Os outros entraram, uma senhora curiosa olhou para mim, questionando se eu entraria ou não.

Eu não sabia. Não queria. Mas deveria.

Tentei forçar minhas pernas a prosseguir, tentei fazer o meu cérebro dar o comando certo, mas de alguma forma era meu coração batendo freneticamente no peito que me ordenava a não ir.

A porta se fechou. E eu fiquei.

Era isso. Estava feito. Eu escolhera ficar, e não sabia o porquê, mas não podia imaginar a minha vida longe das pessoas que eu amava. Não agora quando eu conhecia o gosto da felicidade, da alegria e da realização.

Eu queria viver. Quero viver.

Viver com a minha família, viver com meus amigos e viver com...

— Por um momento achei mesmo que você fosse entrar no trem — a voz se anunciou atrás de mim, e eu não precisava me virar para saber quem era.

Meu coração bateu ainda mais forte. Com dor, remorso e culpa.

Não deixando que minhas emoções transbordassem, me virei para encará-lo. Eu não sabia se ainda conseguiria chorar depois de derramar rios de lágrimas, mas já estava cansada demais para isso. Eu queria paz apenas.

— Eu também. — Dei de ombros, ressentida demais para dizer qualquer outra coisa. Segurei a alça da bolsa, soturna, e levantei o olhar até o dele. Vivido e quente, e afiado como uma agulha. — O que está fazendo aqui?

Singularidades de um Amor (sem cerimônias) ✔Onde histórias criam vida. Descubra agora