A Melhor Amiga Que Eu Já Tive, parte 2

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É importante saber, antes de tudo, que meu pai era ateu e minha mãe, agnóstica. Até hoje ele deve se arrepender, aquele filho da puta (te odeio, vó) é obcecado com garantir o lugarzinho nojento dele no paraíso. Também tinha o meu irmão mais novo, o Gabe. Ele era tão bonitinho... queria tanto os genes dele, daria tudo pra mudar de lugar com meu irmão. Fui eu que destruí toda minha família e isso não me deixava dormir. Minha primeira vítima foi minha mãe que teve a infelicidade de morrer ao me dar à luz.

Eu tenho problemas, na verdade um problema gigante, eu chamo de "episódios". Não sei quando começaram, mas quando aconteciam eu apagava; quando acordava, qualquer amigo ou conhecido próximo de mim estava sangrando no chão. Eu mudei de escola tantas vezes.... Foi nessa época que meu pai então ateu virou um fanático religioso, fazendo de tudo pra se livrar da filha demoníaca dele. Meu irmão, que era tão próximo de mim, passou a ter medo da irmãzinha, o monstro gigantesco, horroroso e que não merece o mínimo de piedade. Toda noite meu pai rezava pela minha morte, ele parou de esconder depois de um tempo.

Os episódios começaram a ficar mais frequentes até que

Eu odeio falar desse dia, mas é importante. Espero conseguir dessa vez, preciso tirar a pior parte do caminho. Meu irmão morreu; eu matei o Gabe, a pessoa mais inocente nessa história toda. No primeiro dia que meu pai tentou me matar, me escondi no quarto do Gabe junto do próprio. Eu, apavorada, tranquei o quarto. Apaguei. Gabe não tinha como fugir. A carinha dele foi... todo aquele sangue das minhas mãos... Merda! Eu odeio esse dia! Eu não denunciei meu pai pra polícia, por mim ele poderia me matar ali mesmo! Mas deve ter se acovardado, incapaz de vingar o próprio filho ou sequer morrer tentando. O que eu tô falando? Tudo isso foi culpa minha, pra início de conversa...

Eu tentei me matar naquela noite, mas eu não consigo, sou estranhamente resistente, o melhor que consegui foi desmaiar e acordar com o pulso intacto; o pior é que eu já fui no médico e não tem nada de anormal com o meu corpo. Nesse dia eu considerei a possibilidade de que eu seja uma punição divina aos meus pais, um demônio enviado pra dar uma lição a um casal profano de infiéis. Sei lá, é o que mais fez sentido, foi por isso que mantive distância das pessoas.

Hoje em dia meu pai me bate e é até catártico, é bom saber que estou tendo o que mereço, mas ao mesmo tempo eu nunca consigo evitar de chorar. FRACA. Ele nem bebe, ele tá sempre sóbrio, às eu queria que ele (restante borrado)

Isso não importa, o que importa é que eu vivi minha vidinha de merda sem Mika por algumas semanas. Aqueles alunos nojentos e pervertidos olhavam feio pros meus ferimentos e as professoras intrometidas fingiam preocupação.

Mas eu decidi ver a menina de novo, na época eu não entendi por quê. Ela é um paradoxo; se por um lado é impossível entende-la, por outro é muito menos misteriosa que qualquer pessoa normal. Eu juro que isso faz sentido, digamos que ela é simples.

Eu comecei pedindo desculpa pelo que tinha acontecido e depois de (recorde) cinco minutos inteiros de silêncio constrangedor, tudo o que conseguiu me dizer foi:

"Por quê?"

Ela não lembra de nada... ou talvez não se importe o suficiente pra lembrar ou, talvez só não compreenda...? Eu não sabia e até hoje não sei muito bem. Alguns alunos suspeitavam que Mika fosse autista, o que nunca foi diagnosticado, mas vai ver ela é mesmo, esses caras são tão estranhos.... Enfim, hoje em dia eu sei que o cérebro dela funciona bem melhor que uma pessoa normal, ainda mais que o de um autista. Talvez seja uma pegadinha maldosa? Não, não poderia ser, é real demais, uma vida inteira de atuação não vale uma piada sem graça.

Eu perguntei se ela gostaria de ir pra minha casa. Meu pai ia trabalhar até tarde, e por um momento eu senti que ia chorar se a loira esquisitona fosse embora. Cansei do silêncio e dei a ordem.

A Tragédia de Mika Sem Sobrenome e a Maldição dos PequenosOnde histórias criam vida. Descubra agora