Capítulo 5

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EMMA D'ARCY

"Onde há desejo, haverá uma chama

Onde há uma chama alguém está sujeito a se queimar

Mas só porque queima não significa que você vai morrer

Você tem que se levantar e tentar, e tentar, e tentar."

Muito a contragosto, fui obrigada a ficar trinta dias praticamente trancada em casa na companhia da minha mãe. Até que foi divertido e muito bom. A gente nunca mais esteve tão juntas desde que, sei lá, eu tinha dezessete anos. Ou até menos, porque naquela época eu não desgrudava da Liv, quando não estava aprontando por aí.

Eu amo muito minha mãe. Ela é uma mulher excepcional. Bonita, elegante, inteligente, sincera mas sem ser cruel, diplomata. É a mulher que mais admiro depois de Liv. Dona Martha é americana, filha de pais conservadores. Nasceu rica, mas ficou ainda mais quando se casou com meu pai, um cara bastante complicado e que foi infiel mais vezes do que ela poderia contar nos dedos.

Acho que uma das razões para ter me afastado dela, mesmo com todo o seu jeito atencioso e a sua vontade de ficar perto de mim, é que eu comecei a ter vergonha. Vergonha de mim. Por causa dos meus erros. Quando cai na bebedeira, na vida de farra e consequentemente traí Olivia, eu também trai minha mãe. Porque eu sempre soube que suas expectativas em relação a mim eram altas. E no fundo acabei por decepcioná-la tanto quanto o estúpido do meu pai.

Durante essas quatro semanas, me comuniquei algumas vezes com Liv através de mensagens e ligações pontuais de menos de cinco minutos. Eu não queria nem podia invadir demais o seu espaço, só que também precisava me certificar de que ela e nosso bebê estavam bem. Nas ligações, podendo ouvir sua voz, tive a sensação de que Liv ficava contente por falar comigo. Não conversamos nada demais. Ela tentava evitar muita intimidade. Está sendo difícil para mim assimilar isso. Assimilar que a mulher que amei a vida inteira, que sempre foi minha melhor amiga e namorada agora é "quase" uma estranha, por minha causa.

Olivia não quer deixar a intimidade entre nós aparecer porque tem medo. Medo de me dar espaço e eu foder tudo novamente. Eu a entendo. Porque até mesmo eu - que não tenho medo de nada - teria medo disso. Na verdade, se eu for verdadeira comigo mesma, se eu ousar olhar no espelho, terei de confessar que tenho medo de mim mesma. Medo de realmente ser tão ruim quanto penso que sou e nunca conseguir realmente mudar. Medo de ter perdido para sempre a única coisa boa que realmente tive. Medo de perder a melhor coisa que ainda terei - o meu filho.

Eu, tão corajosa, disposta a loucuras a vida toda, sou uma covarde destroçada pelo medo. Carrego tantos medos dentro de mim que fica difícil caminhar. Acho que a maneira que encontrei de lidar com o medo foi bebendo, por isso me tornei alcoólatra tão cedo, tão rápido. Eu mergulhei na bebida como quem mergulha numa piscina rasa: sem medo de me afogar. E cá estou eu, lutando para não morrer debaixo d'água.

Matt veio me visitar algumas vezes e me levou ao AA uma vez por semana, praticamente me carregando até o carro e do carro até a cadeira das reuniões. Em um único mês conseguimos nos aproximar ainda mais, coisa que não achei ser possível, porque éramos colados naturalmente. Mas foi uma proximidade diferente. Talvez eu estivesse mudando e ele também, mas senti em nossos encontros que éramos mais dois adultos tentando ficar bem do que dois eternos adolescentes apertando o foda-se para o mundo.

O meu pai, por incrível que possa parecer, veio me visitar uma única vez. Àquela altura da minha vida, com trinta anos e com o histórico que eu tinha, não deveria me surpreender. John D'Arcy sempre foi relapso com a família. Preferia trabalhar, ir ao clube e curtir com suas vagabundas do que desfrutar da companhia da esposa e do filho que posteriormente se tornou uma filha - um escândalo e uma decepção, obviamente.

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