Senhor Dennier

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-Deam, venha cá! - assim que o chamei, Deam trancou a porta e veio ao meu encontro. Quando viu o que tinha lá dentro, ficou tão surpreso quanto eu.

A sala era pequena e tinha suas paredes pintadas de um amarelo vivo. Estantes de madeira iam do chão até o teto, e todas estavam cheias de jóias, livros, armas e quadros. Mas não era isso que me chamava a atenção, e sim uma mesa dourada posicionada no centro da sala. Em cima da mesa, havia uma majestosa maquete, que julguei ser do bairro, pois o casarão vermelho se encontrava no fim de uma rua. Ali na maquete ele não parecia tão assustador.

-Mas o que é isso? - Deam se aproximou e passou a mão em torno da mesa.

-Uma maquete Deam...

-Eu sei Meri - ele olhou para mim e logo voltou a olhar para a mesa - essa coisa toda, digo, o que é isso tudo? - Deam abriu os braços e deu meia volta, o olhar atento. Está aí uma coisa que não sei responder.

Entrei mais na sala e observei os quadros, todos mostravam famílias e todos tinham um homem de paletó ao centro. Cada quadro possuía em sua moldura o nome da família que retratava e uma data.

Família Tenner, 1974

Família DiPaulo, 1984

Família Cullen, 1997

Família Lorence, 2003

Família Dennier, 2009

 

 Observei o quadro onde se lia "Família Dennier", prestando atenção no homem, ao centro. Ele tinha os cabelos grisalhos, mas uma aparência incrívelmente jovem e o corpo bem moldado.

-Deam, olhe - apontei para o homem no quadro. Deam se aproximou e avaliou o homem.

-Já vi ele... Esse homem aqui - ele apontou para o homem sorridente e continuou - tem outros quadros dele. Aqui no escritório mesmo tem um.

Me lembrei de um quadro que vi quando cheguei ao escritório. De fato, havia outros quadros desse homem espalhados pela casa.

-Acha que ele é o cara, América?

Encarei o quadro alguns segundos antes de ouvir vozes vindo do lado de fora.

Sai da sala e fui em direção a janela do escritório, abrindo a cortina branca. Dois homens de paletó e calças sociais conversavam alegremente no jardim. Ao se cumprimentarem, um deles se virou para o lado e pude ver seu rosto. Era o mesmo homem do quadro.

Uma mulher apareceu ao lado dos homens e falou algo para o Homem-do-quadro. Ela usava o uniforme verde, e assim que se virou vi que se tratava de Sophi. Ela esperou apenas que o Homem-do-quadro a acompanhasse e caminhou para dentro do casarão.

-Deam, fecha a porta. - no mesmo instante que Deam fechou a porta da sala, ouvi vozes do outro lado da parede. Corri para abrir a porta, na esperança de ver mais uma vez o rosto daquele homem. Assim que abri a porta, o Homem-dos-quadros surgiu, e ficou ali parado na minha frente.

Eu o encarei alguns segundos antes de Sophi pigarrear e pedir licença com um gesto. Abri passagem para o Homem-do-quadro e seu companheiro entrarem e voltei ao "meu trabalho". Peguei alguns panos e vi Deam sair da sala, me lançando um aceno com a cabeça. Sophi o acompanhou e fechou a porta atrás de si.

O Homem-do-quadro se sentou em uma cadeira vermelha atrás da mesa, e seu amigo alegre se sentou em outra, de frente para o mesmo.

-Então, - o amigo do Homem-do-quadro começou a falar - qual é o plano para a grande noite, senhor Dennier?

[...]

Algumas horas mais tarde, encontrei Deam na frente do casarão e fomos para um hotel. Fizemos nossas reservas e subimos para nosso quarto. Deam jogou as malas em um canto do quarto e se atirou na cama, que rangeu com seu peso.

-Então o Homem-do-quadro é o cara? O tal de Dennier?

-É, ele é o Senhor Dennier - me joguei na cama ao lado de Deam, exausta. Sophi me fizera limpar sete cômodos diferentes, todos amplos e bem empoeirados. Alguém fala pra essa mulher que meu trabalho não é esse?

-E o que fazemos agora?

-Voltaremos ao casarão. - tirei um papel que peguei na recepção do hotel no bolso e o entreguei para Deam. - Estávamos arrumando a casa para uma festa, um jantar entre famílias. Vamos voltar lá e pegar o Dennier.

-Mas a casa vai estar cheia Meri.

-Exatamente, tem uma loja de ropas sociais perto da praça que vimos, e tenho uma peruca loira na mala. Vamos nos passar por convidados, atrair Dennier para um dos quartos, pegar seu coração e ir embora.

-Vamos mesmo pegar o coração do cara?

-A pergunta certa é: o que faremos com 100 milhões de reais?

Encarei Deam. Sua expressão era preocupada e cansada. Seu rosto ainda estava um pouco sujo e seus lábios vermelhos agora estavam rachados. Eu sabia o que ele estava pensando. E eu pensava o mesmo.

Pensava no que estava prestes a fazer, pensava no que se passara na minha cabeça quando aceitei o trabalho do Mr. C, pensava em quem poder saber quem era Mr. C. E também pensava no dinheiro, nas férias planejadas com Deam. Não podia acreditar na decisão que eu tinha tomado, nem ao rumo que minha vida tinha levado. Mas agora já é tarde demais para voltar atrás.

-Vou estar do seu lado América. Em qualquer situação. Não importa o que seja, sempre vou estar com você. Sempre te apoiarei. Mas tem certeza que quer fazer isso?

-Não, eu não tenho certeza se quero matar um homem. Mas sim, tenho certeza que quero ficar com você pra sempre.

-Eu te amo Meri - Deam se aproximou de mim, fazendo o coxão da cama se mexer com seu peso. Ele me envolveu em seus braços fortes e me beijou, seus lábios rachados se umedecendo com o toque. - E se você quer fazer isso, vou te ajudar. Vamos trabalhar juntos. E o principal: não seremos pegos.

A CaçadoraOnde histórias criam vida. Descubra agora