Sobre vazio e crescer

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Caro recém estranho,

Vazio.
Oco.
Escuro.
Vazio.
Sem cor
Vazio
Sem gosto
Vazio
Sem brilho
Vazio
Sem vida

Um ciclo sem conteúdo, desprovido de cor e vida. Eu acordava, que horas eram? Eu dormia, o dia tinha amanhecido. Nem o amor mais forte pode te salvar quando te partem ao meio. Ele segura uma metade, segura o que pode e tenta curar com amor. A outra parte se perde em um infinito vazio.

Quando eu tinha 15 anos, idolatrava o amor romântico. Para mim toda dor seria consequência de um coração partido por amor. Que esse amor poderia te arrancar tudo e te deixar no vazio infinito, o qual não se sai a não ser que pule. A minha eu de 15 anos subestimava o fato de que outros amores podem te quebrar bem mais. Que um amigo pode te fazer uma cicatriz tão feia quanto sua mãe pode te arrancar cada sentimento de amor próprio da sua alma. Todos os amores podem te destruir. Todos podem te jogar para o vazio, todos podem te tirar de si mesmo, te deixando perdida, sangrando e oca. As pessoas têm esse poder, de te marcar tão profundamente que você não consegue sequer se alcançar. Crescer não te impede de se magoar, crescer não te blinda a essas dores. Você cresce e acha que todos os seus sentimentos estão protegidos, porque você é maduro, porque pode lidar com isso. Mas aí te abandonam, aí te dizem adeus e uma coisa feia começa a crescer no seu coração. Você sorri, diz que vai ficar bem, que já consegue lidar com isso. Então, no meio de um dia qualquer, você desmorona. A coisa feia agora é seu coração e você não consegue mais ignorar. Você não pode ignorar velhas feridas sendo reabertas, você não consegue mais ignorar seu eu perdido onde você não pode colocar a mão. Então, acaba, o seu choro te parte mais uma vez, o vazio te toma, oca, sem brilho é o que você se transformou. Porque você cresceu, mas ainda é medrosa e machucada. Acabou, você se olha no espelho, seu disfarce sumiu, seus olhos são os mesmo de quando tinha 14 anos. Cheios de medo, insegurança e culpa. Sem brilho, sem cor. Você se olha de volta, implora baixinho para que sua máscara se refaça, mas já era, ela quebrou assim como as suas costuras. Você olha e cada linha se desfez, agora estão expostas. Você é como uma boneca de pano descosturada, mas dentro de ti não tem algodão, só dores feias que te destruíram. Você sente vergonha delas porque te tornam fraca, porque não é mais uma adulta com elas expostas.

Então, volta a odiar seu reflexo como antes, volta a ser igual a mesma pessoa que você lutou para não ser novamente. Então, se lembra que não são suas costuras, que você se deixou ser costurada por outro. Ele te costurou, ele te montou novamente e agora ele puxou a linha antes de ir porque você não era mais sua responsabilidade. Você foge do espelho, com vergonha de si mesma, se esconde, não consegue mais se olhar. Dói demais se ver, dói demais ser assim novamente. O que você não daria para ser confiante como sempre? O que não daria para se preencher novamente?

Não consegue lidar com isso, o vazio não vai embora. Deita no chão e sente você ir embora, suas partes irem embora, pedaço por pedaço, depois de tanto trabalho para se montar. Você deixa porque não tem mais nada que possa fazer, não pode pular, não pode gritar, não pode pedir ajuda como uma criança. Só sente se esvair e se torna o vazio de quem fugiu por tantos anos.

Com vazio infinito, ninguém.

Palavras CansadasOnde histórias criam vida. Descubra agora