Nos meus relatórios sobre minhas missões de guerra e espionagem, tratei dos fatos com mais objetividade possível. Contudo, somente no meu diário particular é que consigo expressar ou tentar expressar aquilo que eu realmente sinto.
Escrevo este diário no ano de 1970. Tenho hoje 44 anos de idade. Não consegui sair da minha rotina de espião durante meus últimos vinte e três anos, para conhecer outras coisas boas dessa vida. No entanto, fiz um grande amigo, Demetri Mendelev, ou como o chamo de Mendel. Participamos de muitos momentos marcantes. Só que quando penso na vida de espião que decidi seguir, minha mente ainda pesa muito. Exatamente pela arma que peguei há cerca de 8 anos atrás e tirei a vida de John Kenedy.
Isso não é o que mais dói, é o fato de eu ter pego em armas para tirar a vida de inocentes. Não mencionei nos relatórios que eu envio nenhuma dessas sensações que eu tenho, se expressar isso, serei expulso por incompetência. Pegar em armas, tirar vidas, é algo que me traz pesadelos todas as noites.
Eu não consigo dormir direito, ouço as vozes deles ecoando sob minha alma. Minha mãe apareceu em um sonho que tive, relembrando a seguinte experiência:
" - Kolosky! "
" - Sim, mamãe!"
" - Não bata no seu irmão mais velho! Vladimir vai ficar zangado! "
" - Mas, mamãe, ele que quebrou o trenó do papai e não eu! "
" - Cale a boca, Kolosky!, sabe que se falar vai apanhar de mim! "Naquele instante, eu havia jogado um pedaço de pau na cabeça de Vladimir, o qual no mesmo momento bateu em mim. A verdade era que nós estávamos brincando e vendo quem era mais rápido no trenó, quando havia chegado a vez dele, eu já havia batido em uma árvore, ele quebrou. A mamãe me viu logo de primeira e achou que fosse eu. Nós dois pegamos um castigo, porém, a mamãe nos deu um presente. Era um relógio de bolso antigo que ela guardava, ela deu um para mim e outro para Vladimir.
Fiquei imaginando os motivos da mamãe nos tratar tão bem, mesmo nós sendo tão rebeldes, ela era doce e gentil, sempre nos dava uma segunda chance. Quando dormimos, eu fiquei ainda remoendo a raiva do meu mentiroso irmão e não quis me desculpar.
Entretanto, no dia seguinte, dia 13 de setembro de 1942, Stalingrado estava sendo tomada, nossa casa foi destruída por um bombardeiro. Não esqueço que tentávamos fugir a cada instante, eu tinha apenas 16 anos de idade, um era um jovem com sonhos. Mas, naquele dia vi a face da morte sorrir diante de mim. Meus pais foram mortos, meu irmão foi levado capturado, nunca mais o vi, estima-se que o corpo dele tenha sido queimado pelos nazistas. Pois ele se recusava a falar onde eu estava me escondendo com o dinheiro que havia sobrado do meu pai.
Volodosk era o nome de meu pai, ele era um importante comerciante de Stalingrado. Eu não tive tempo de dizer adeus para nenhum deles. Nunca havia sentido tanto ódio como senti naquele momento, eu faria de tudo para matar aquele nazista alemão que fez aquilo.
A partir desse momento, o ódio me fez tolo e descontrolado. O ódio é uma espada de dois gumes, uma te faz ferir e a outra é que te fere.
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1001 Guerras
General FictionO livro é uma continuação ou um complemento essencial do livro "1001 reflexões ". Se passa alguns anos antes do outro, e o meio tempo em que o Protagonista Alexandre era criança. No ano de 1945 após o fim da II Guerra mundial, o mundo se divide em d...