Não tenciono ser escritora nem saber nada da arte de
escrever. Traço estas linhas só porque o dr. Reilly me pediu.
Não sei explicar direito, mas quando o dr. Reilly nos pede para
fazer alguma coisa, é impossível recusar.
- Mas, doutor - argumentei -, eu não faço o tipo literário...
não sou nem um pouquinho literária.
- Conversa fiada! - estimulou. - Finja que está escrevendo
o histórico de um paciente, se preferir.
Claro, é possível encarar assim.
Dr. Reilly não parou por aí. Afirmou ser mais do que
necessário um relato direto e sem enfeites dos episódios
acontecidos em Tell Yarimjah.
- Se uma das partes envolvidas escrevesse o texto, não seria
convincente. Diriam que é tendencioso.
Claro, isso também era verdade. Participei de tudo, mas na
condição de intrusa, por assim dizer.
- Por que o senhor mesmo não escreve, doutor? - indaguei.
- Eu não estava no local... você sim. Além do mais -
acrescentou com um suspiro -, minha filha não ia me deixar.
O jeito com que ele se submete àquela mocinha mimada é
vergonhoso. Eu cogitava dizer isso quando notei o brilho maroto
no olhar dele. Isso é o pior do dr. Reilly. A gente nunca sabe
quando ele está brincando ou falando sério. Sempre diz as coisas
do mesmo jeito vagaroso e tristonho - mas na metade das vezeshá uma pitada de bom humor por trás.
- Bem - ponderei em tom de dúvida -, acho que eu seria
capaz.
- Claro que seria.
- Só não sei como estruturar.
- Há uma boa tradição nisso. Comece pelo começo,
continue e só pare quando chegar ao fim.
- Não estou bem certa nem de onde nem de quando tudo
começou - comentei, cética.
- Acredite em mim, enfermeira: a dificuldade de começar
não é nada perto da dificuldade de saber a hora de parar. Pelo
menos comigo é assim quando tenho que falar em público.
Alguém tem que me agarrar pela gola do casaco e me fazer sentar
à força.
- Ah, não brinque, doutor.
- Não podia falar mais sério. Então, o que me diz?
Outra coisa me preocupava. Vacilei por breves instantes e
fui sincera:
- Sabe, doutor, tenho medo de às vezes... bem, ser um
pouco pessoal.
- O diabo que me carregue, mulher, quanto mais pessoal
melhor! Esta história trata de seres humanos, não de bonecos!
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Agatha Christie - Morte na Mesopotâmia
Mistério / SuspenseA enfermeira Amy Leatheran é contratada para se juntar a uma expedição arqueológica no Iraque. Mas sua função ali tem bem pouco a ver com ruínas e artefatos: ela deve vigiar de perto a bela Louise Leidner, que está cada vez mais apavorada com a idei...