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|| Vitória Nascimento||

📍Rio de Janeiro, Rocinha, Domingo, 20:00.

A vida é feita de escolhas. Quando você dá um passo para frente, alguma coisa fica para trás.

Encaro o espelho a minha frente, enquanto passo os dedos entre os fios de cabelo liso da minha lace loira, e retoco o gloss. Decidi ontem aceitar o convite do pagode, afinal, não tem mal em querer curtir com alguém casualmente.

Augusto não quis ir, disse que tá cansado demais pra ir pra rolê hoje, então programou uma noite de filmes e besteiras com a ayla, que me fez prometer que o João Vitor não vai ser meu namorado.

Ajusto minha calça e minha sandália de salto no pé, e jogo a bolsa no ombro, tirando uma foto pra atualizar o feed. Não tenho um número exorbitante de seguidores, média de 300.000, então costumo postar mais reels dando dicas de como colar as laces, ou até mesmo mini tutoriais de maquiagens.

Saio de casa me despedindo dos meus amores, e desço a ladeira indo em direção ao bar do Juca. No meio do caminho faço uma careta por perceber que o JV nem se ofereceu em ir me buscar, e suspiro não sabendo se isso me deixa aliviada ou irritada.

Chego no bar já cumprimentando o pessoal que eu conheço, os meninos da boca que o Augusto era responsável e sempre estavam lá pela casa dele, e dou um beijo no rosto do seu Juca, indo me sentar no balcão conversar com ele enquanto o abençoado não chega.

José Carlos, vulgo Seu Juca, foi o homem que me acolheu quando cheguei nesse morro, um senhorzinho adorável de 65 anos que tem uma péssima mania de fumar igual um condenado. Ele me deu um emprego, vários adiantamentos e todo o suporte financeiro que precisei para dar à luz a minha filha. Fez o papel que meu genitor não quis assumir. Não é atoa que minha pequena chama ele de vovô. Tá pra existir ser humano que mima mais aquela garota.

- Juca: e como anda a vida minha filha? - pergunta enquanto seca alguns copos e guarda no balcão na nossa frente - soube que teve um super evento ontem no teu salão, não se fala de outra coisa nessa favela - diz admirado me fazendo rir e ele levanta me fazendo o encarar, enquanto me alcança uma garrafinha de ice.

- Vitória: tá tudo na maior paz graças a Deus, tudo fluindo como sempre quis que fosse, o movimento no salão tá aumentando cada dia, a demanda de cursos parece que vai explodir nos ares a qualquer momento, enfim - suspiro escorando uma mão no meu queixo e ele franze o cenho me encarando de forma suspeita.

- Juca: tá com carinha de confusa, o que minha neta aprontou dessa vez? - pergunta enquanto joga o pano de prato no ombro e me encara esperando uma resposta.

Antes que eu possa explicar que a ayla tá apaixonada pelo russo, e que me faz escutar todos os dias o quanto o tio dela é um homem incrível, sinto um braço rodear meus ombros e um beijo ser depositado no topo da minha cabeça. A cara de insatisfação do meu velhinho já me fala exatamente de quem se trata. É inacreditável a implicância que ele e a minha filha tem com o Vitor, coitado.

- JV: eai seu Joca - é, deve ser esse o motivo, ele sempre chama errado pra provocar - me manda uma gelada ai, que hoje eu preciso comemorar, já que esse monumento tá no meu porte - diz me fazendo levantar bruscamente e quase virar a ice da minha mão e me girando.

Arregalo os olhos quando percebo todas as atenções viradas para nós, e tenho vontade de esganar esse desgraçado, odeio ser o centro das atenções. Pelo menos propositalmente, tô acostumada com geral me encarando pela minha cara fechada, mas isso aqui parece um show de circo.

Marginal AladoOnde histórias criam vida. Descubra agora