Fiz uma viagem muito tranquila de Garulhos até Luanda. O voo com a TAAG ocorreu sem problemas, mas infelizmente não consegui dormir. Ah, também conheci um casal de baianos que vieram sentados ao meu lado durante o percurso e foi muito legal. Nos separamos no aeroporto pois eles iriam pra Portugal e minha conexão era menor e pra outro país. Só que acontece uma coisa em Luanda rsrsrs que é surreal: faz muito calor.
Gente, eu juro: é muito quente. E o aeroporto não tem ar condicionado. Foi surreal e pra piorar eu fui uma grande otária e Garulhos tomou meu desodorante e hidratante. Como isso aqui é um registro bem informal, vamos falar a língua do povo: eu tava fedida. Mas, como a democracia é algo incrível e universal eu não era a única a cheirar mal. Morte ao capitalismo, grande causador das mudanças climáticas.
Bom, mas não para por aí. Como diz Bia, minha colega de trabalho: desgraça pouca é bobagem. O voo Luanda - Cape Town também não tinha ar condicionado. Foram as 3 horas e 45 minutos mais longas da minha vida.
Como era sábado, eu estava tentando ler a bíblia, estudar a lição da escola sabatina, mas não estava conseguindo. Foi aí que eu pedi uma coisa a Deus pois o céu estava sem nenhuma nuvem e dava pra ver todo o trajeto pela janela. Pedi pra ver a Namíbia, país que eu sou apaixonada. E quando eu olhei pra baixo, um misto de emoção e agradecimento vieram até mim pois eu vi o deserto da Namíbia de lá de cima. É muito louco quando Deus responde uma oração do jeito que a gente pede, não é?
Depois desse voo, de passar piscando pela imigração e de pedir um uber, finalmente cheguei a acomodação e meu maior medo se confirmou: meu inglês estava péssimo. Juntou a ansiedade, o cansaço e me dei conta de que o sotaque sul africano era muito diferente. Consegui me comunicar com a querida da portaria (juro, top 10 pessoas que conhecemos lá) e quando subi ao meu quarto mais outra surpresa que Deus preparou pra mim: a minha colega de quarto era do jeito que eu pedi a ele. Mais tarde eu vou falar sobre ela, porém, era a segunda oração, só no sábado, que Deus respondia do jeito que eu pedi.
Mas, eu falei a vocês: essa viagem não é sobre as grandes coisas, mas sim sobre as pequenas que a gente também precisa viver.
Em resumo, fiz amizade com uns brasileiros do andar e fomos almoçar.
Eu estava cansada, fedida, minha pele começava a dar os sinais que ela ia pipocar todinha durante a viagem e meu vestido preto havia pegado todo o pelo do mundo. Mas, mesmo assim saímos e o primeiro lugar que fomos foi o Waterfront. Foi um baque.
A cidade estava lotada porque além do jogo de rugbi (a paixão nacional) estava acontecendo a parada gay no centro. Quando eu cheguei ao Waterfront, uma lágrima caiu: onde estavam as pessoas negras? Muitos brancos e eu, inclusive, fui atropelada por uma apresentação de escoceses. Essa não era a África do Sul que eu queria ver. Demoramos muito pra achar um local pra comer e quando finalmente chegamos, fui me acalmando e olhando ao meu redor. Percebi que tinham muitas pessoas negras, famílias, muçulmanos, indianos e outras nacionalidades. Olha só: tinha diversidade. Finalmente, um descanso da vida mono em Pinheiros, onde homens brancos de 1m70 iguais desfilam com seus coletes pretos e calças com barra até a panturrilha.
Nosso almojanta no Balthazar foi uma delícia. Nosso garçom falava até em português conosco, mas não dava mais pra aguentar tantas horas sem tomar banho. Precisávamos ir pra casa. Por causa dos grandes eventos, estava tudo um grande caos e o uber demorou demais. Estávamos em frente ao hotel chique do Waterfront e eu precisava muito fazer xixi. Logo, eu raciocinei com esses anos e anos que tenho morando no Brasil que nunca iam me deixar entrar daquele jeito em um hotel que a diária é caríssima. Foi aí que eu vi que havia um restaurante ao lado do hotel e fui arriscar.
Quando eu cheguei lá o rapaz do caixa me explicou que o banheiro era de uso exclusivo dos hóspedes. Mas, ele se compadeceu muito de mim, viu que eu era estrangeira (Mateus 25 corre aquiiiii) e falou o seguinte:
- O banheiro é no final do corredor a esquerda. Se alguém parar você, diga que é uma hóspede.
Agradeci e sai andando pelo restaurante. Meu Deus, que lugar chique. O costume de contar negros na Faria Lima me fez sorrir pra todas as mulheres negras do caminho e agora eu entrava no restaurante sorrindo pras pessoas estranhas rsrs. Um restaurante bonito, chique, com pessoas negras sentadas e apenas vivendo. Mas, o melhor ainda estava por vir. Enquanto eu andava pelo corredor do restaurante, os funcionários me cumprimentavam. Eu fedia, minha roupa estava um caos, minha cara cansada e eu recebi sorrisos.
Ninguém desconfiou que eu não era hóspede. Ninguém me barrou. Usei o banheiro e descobri, para minha surpresa, que ele também era o banheiro do hotel chique. Voltei, e mais uma vez passei sublime pelo corredor e agradeci ao atendente pela gentileza.
Que mundo é esse que eu estava prestes a conhecer? Que mundo é esse em que eu me pareço hóspede de um hotel no Waterfront? Que mundo é esse em que eu não sou a babá das crianças? Sou só uma turista, de 26 anos, que queria fazer xixi. Voltei aos meus amigos brasileiros e contei encantada o que eu vivi. Cheguei no meu hotel, tomei um banho e no dia seguinte fui ao mercado ficar besta com eles vendendo cabelo.
Porque, afinal de contas, eu falei pra vocês que essa viagem era sobre os micro momentos.
Uma foto mal tirada rs do hotel em que tudo aconteceu
Aviso: este é um registro das minhas memórias de viagem a África do Sul, em março de 2023. Se você gostou do conteúdo e quer apoiar meus escritos, fique a vontade para me dar um feedback em uma das minhas redes sociais. Obrigada <3
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Um Extraordinário ordinário: Meus Dias na África do Sul
Non-FictionNesta autobiografia de viagem (esse gênero existe?kkk), conto a vocês um pouco do que eu vivi na Cidade do Cabo e Johanesburgo em março/abril de 2023. Cheguei ao país para estudar inglês por um mês, mas vivi histórias simples, porém que me trouxeram...