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     Escuridão, lar de monstros, devaneios e histórias de terror. Marlett e sombra sentiam-se confortáveis ao adentrar aquele porão completamente apartado da luz.

(Quanto é 60 vezes 5 mesmo?)

299.

298.

297.

Marlett desceu às escadas. Encontrou uma tocha apagada no chão e começou a andar ao redor do calabouço, procurando aquele garoto irritante. As enormes quimeras trancafiadas de seu pai rugiam ensurdecedores gritos de horror, que cessavam sempre que Marlett encarava uma delas.

224.

223.

222.

- RAVI! – Ela gritou, esperando ouvir algum suspiro assustado. Ainda nada. Marlett murmurou como um cachorro enraivecido.

- CARAMBA RAVI! – Ela continuou – MAS AONDE INFERNOS VOCÊ SE METEU!? Eu juro que você não vai se queimar Ravizinho. Nananinanão, mocinho! Você vai implorar pra morrer queimando! OUVIU!? VOCÊ NÃO VAI DEIXAR SUA IRMÃ MAIS NOVA TRISTE E SOZINHA NO ESCURO DE NOVO! NUNCA-MAIS!

179.

178.

(De novo?)

177.

- Ouviu Raviii?

(É por isso que você está fazendo isso?)

176.

- Eu sei que você está aí, escondido em algum tipo de... buraco idiota...

(Mas quando foi que eu fiz algo pra você, loka!? Do que é que ela...)

17

(Droga, perdi a conta... cento e setenta e quê?)

- ...com esse medo hipócrita de olhar nos olhos daquela que você matou DUAS VEZES!

Ravi perdeu o fôlego por alguns instantes. Ele não a matou, ele não a matou, foi um acidente, ela era a verdadeira vilã. Ela! Não Ele! Mas qual era mesmo a droga do número, caramba!?

(Dane-se, 150, 149, 148, 147...)

- Hipócrita. Hi-pócrita. Hi-pó-crí-ta. Hipopócrita! Acho que gostei dessa palavra. Combina muito com uma certa sombra que prometeu me dar tudo que eu quisesse e se recusa a me contar aonde o chato do meu irmão está!

Ela murmurou e continuou a vasculhar, olhando entre as válvulas, e baús e canos enferrujados.

Vamos, sai daqui, sai logo! São quantos agora?

81.

80.

79.

- Estou ficando impacienteee. Você não quer me ver impaciente, Ravi!

Não quero te ver de jeito nenhum, bruxa. Só vaza logo daqui! O tempo já está acabando!

43.

42.

41.

- Quer saber, cansei. Eu vou fazer você vir até mim.

Marlett sentou-se na escada e a sala começou a esquentar, atingindo temperaturas elevadíssimas. Os animais rugiam e enlouqueciam, balançando suas jaulas, e as fórmulas chegavam a ferver e até a estourar seus frascos.

Trinta segundos se passaram, até que Marlett ouviu um barulho. Um rangido, vindo lá de cima.

Era a entrada do porão sendo fechada.

9.

8.

7.

O efeito acabou. Ravi foi cuspido de uma sombra na parede. Ele pensava que transformar-se numa sombra jamais funcionaria, mas para sua surpresa, deu certo. Agora a bruxa estava presa e ele livre. Tudo que ele precisava fazer era alcançar a porta da frente. Então ele correu com toda a velocidade em direção à luz, à libertação, à felicidade, à tudo que há de bom e à tudo o que importava! Estava tudo tão perto, Deus, ele estava tão perto quando ouviu aquela voz infantil, estridente e enlouquecida:

- RAVI!

A estante e a parede que escondiam o porão explodiram em pedaços flutuantes que pareciam assustados com a presença daquela criatura hedionda. Dessa vez ela não estava sorrindo.

- Merda! – Disse Ravi, tossindo a seguir. A fumaça parecia tão densa quanto um muro e ainda havia aquele cheiro horrível de madeira queimando, aquele calor, as gotas de suor em seu rosto.

Ele tampou o nariz com a camisa, apertou os olhos e a respiração e correu. Correu o mais rápido que podia, correu alucinadamente, correu sem se quer perceber o quão ferida estava sua perna, sangrando, com uma viga enorme atravessando os músculos de sua panturrilha. O desespero agia em Ravi tal como um veneno que cegava seus olhos, sua mente e seu corpo, trazendo o mesmo impacto nocivo que fazia a esperança.

Marlett soltou um rugido e lançou os estilhaços da parede destroçada em Ravi. Ele foi acertado nas costas, no ombro e na cabeça. Ravi começou a sangrar e quase caiu, mas manteve o equilíbrio. Tudo o que importava era sair dali, e ele estava na entrada agora. A porta estava aberta. Só mais um pouco, só mais um pouco.

Então outro barulho. O teto estava prestes a desmoronar, mas Ravi iria alcançar a porta antes. Ele tinha de alcançar, não existia um não! Aquela era sua única chance! Se ele não conseguisse fugir ali, nunca mais conseguiria. A Bruxa! A Bruxa! Ela não iria vencer desta vez! Não! O Deus Sol não permitiria isso! Ela iria queimar em chamas negras assim que ele atravessasse aquele espaço escuro e adentrasse o assombroso mundo onde ratos andavam em duas patas e recitavam terríveis aclamações de violência, ódio e superioridade.

Queimem! Queimem! Queimem! Queimem! Queimem!Queimem! Queimem! Queimem! Queimem! Queimem! Queimem! Queimem! Queimem! Queimem!Queimem! Queimem! Queimem! Queimem! Queimem! Queimem! Queimem! Queimem!

Se Estrelas Não Fossem EstrelasOnde histórias criam vida. Descubra agora