Capítulo 14

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A noite caíra nos moors. Bem alto no céu, a lua estava cheia, e feixes de luz desciam iluminando o solo verdejante. O ar estava parado e silencioso. A maioria das criaturas dos Moors estava adormecida, algumas enfiadas em folhas no chão enquanto outras repousavam nas árvores. Em meio a tudo isso, um adormecido Harry flutuava. Severus caminhava alguns passos atrás enquanto Sirius voava adiante. Enquanto o trio avançava, algumas fadas curiosas espiaram, desejosas em saber quem ousava perturbar os bosques tranquilos àquela hora. Chegando ao pequeno vale em meio ao qual um pequeno riacho gorgolejava, Severus abaixou Harry com suavidade até o chão. Depois, escondeu-se nas sombras. Inspirou fundo e sussurrou:

_Acorde.

Severus aguardou com o coração batendo forte. Estava começando a lamentar a decisão de levar o garoto até ali. O que deu nele? Pareceu-lhe uma boa ideia na hora, mas, agora, enquanto as pálpebras de Harry farfalhavam até se abrirem, Severus começava a pensar de maneira contrária. Lentamente, Harry se sentou. Observou o ambiente com tranquilidade com seus imensos olhos verdes, como se despertar em um bosque desconhecido fosse um acontecimento corriqueiro para ele. Ao observar Harry olhando os Moors pela primeira vez, Severus sentiu uma dor no peito. Nunca se sentira à vontade fora do seu ambiente familiar. Todavia, Harry, que passara a vida toda num chalé com três pessoas, não parecia intimidado.

Virando a cabeça na direção de Severus, Harry disse:

_Sei que está aí. - Atônito, Severus se escondeu mais. – Não tenha medo – Harry acrescentou.

_Não tenho medo – Severus disse defensivamente. Cobriu a boca com a mão. Assim que as palavras escaparam, desejou não tê-las dito. Agora não havia como se esconder.

_Então apareça – Harry pediu. Severus sorriu. Ah, talvez existisse uma escapatória para aquilo afinal.

_Mas então você sentirá medo – replicou. Mas Harry balançou a cabeça.

_Não, não sentirei – disse com teimosia.

Ao que tudo levava a crer, Severus não tinha escolha. Não pensara no que aconteceria depois que Harry estivesse nos Moors, mas, definitivamente, não pensara que conversaria com o principe. No entanto, se Harry fosse como qualquer outro humano, o garoto fugiria assim que o visse. Saindo das sombras, Severus se aproximou. Um facho de luar o iluminou, produzindo uma sombra alongada no chão atrás dele. À noite, seus chifres pareciam maiores e mais escuros, e ele não se surpreendeu quando os olhos de Harry se arregalaram de medo. Mas o que o surpreendeu foi que Harry não fugiu. Em vez disso, falou:

_Sei quem você é – disse, fazendo com que Severus erguesse uma sobrancelha. – Você é a minha fada-madrinha. - Um riso se formou na garganta de Severus.

_A sua… o quê? – perguntou em voz alta, tentando não rir. Ignorando a reação de Severus, Harry assentiu.

_Fada-madrinha – repetiu lentamente. – Você tem cuidado de mim a vida inteira. Sempre soube que você estava por perto.

_Como? – Severus perguntou, sua curiosidade levando a melhor. Harry apontou por cima do ombro de Severus Virando-se, ele viu sua distinta sombra chifruda.

_A sua sombra – Harry explicou. – Ela tem me acompanhado desde que eu era pequeno. Para onde quer que eu fosse, a sua sombra estava sempre junto a mim. - Ouvindo isso, Sirius emitiu um grasnido alto. Por mais que Severus soubesse que ele, em sua língua de pássaro, estava dizendo como “eu sabia!”, Harry só ouviu o típico grasnar de um pássaro e sorriu. Vendo Sirius pousar sobre o ombro de Severus, Harry fez uma pausa e se aproximou. – Eu me lembro de você! – Caminhando lentamente, esticou a mão e acariciou Sirius – Passarinho bonito.

Severus tentou não se retrair quando a mão pequena do garoto resvalou em  seu ombro. Fazia muito, muito tempo que não ficava tão perto assim de um desconhecido. Para sua surpresa, não foi tão terrível quanto pensou que seria. E o mais surpreendente foi quão à vontade Harry parecia se sentir no vale. Afastou-se de Sirius e perambulou ao redor, abaixando-se de vez em quando para dar uma espiada mais de perto nas flores e nas plantas diferentes das do outro lado da Muralha. Conforme ele explorava, fadas dos Moors, tendo sido despertadas, começaram a aparecer, curiosas em ver o humano entre elas. Quando Harry viu as criaturas aladas, seu rosto se iluminou de admiração.

Severus se viu sorrindo quando diversas corajosas fadas do orvalho farfalharam até perto do principe, suas asas translúcidas reluziam sob a luz do luar. Fazia muito tempo desde que Severus olhara com atenção para o seu lar. Era verdade, esforçara-se para defendê-lo e o amava profundamente, mas, com Harry ali, ele o via com olhos renovados. Era belo e misterioso. Tranquilo, contudo vivaz. As árvores protegiam as plantas, e as plantas abraçavam o solo. Havia um lar e um lugar para tudo e para todos. Era por isso, Severus pensou, que se esforçava tanto para mantê-lo a salvo. Desconhecendo as reflexões de Severus, Harry passou a mão com suavidade sobre a superfície de uma planta.

_Sempre quis vir aqui – disse –, mas as minhas tias me disseram que era proibido. – Levantou os olhos e se deparou com os de Severus – Como passamos pela Muralha? - A pergunta fez com que Severus retornasse à realidade. Uma coisa era ter o garoto ali por um breve período de tempo, mas não seria nada bom tê-lo fazendo perguntas e querendo retornar.

_Está na hora de levar você para casa – disse em vez de responder.

_Mas já? – o principe perguntou, evidentemente desapontado. – Posso voltar outra noite?

Em vez de responder, Severus enfiou a mão em suas vestes e pegou outra flor amarela. Uma vez mais assoprou o pólen no ar diante de Harry. E, de novo, as pálpebras dele tremularam e seu corpo relaxou. Enquanto as outras fadas observavam, elevou Harry no ar. Em seguida, em silêncio, saíram do vale. Pouco tempo depois chegaram ao chalezinho. Silenciosamente, Severus fez Harry entrar no quarto flutuando e, gentilmente, o abaixou na cama. Inclinando-se sobre o principe, Severus começou a sorrir com o canto dos lábios.

_Boa noite, praga – disse com suavidade, antes de se virar para partir.

Parou à porta para dar uma última olhada em Harry. No fim das contas, não foi tão ruim assim tê-lo por perto no vale. Mas seria um evento isolado. Isso nunca mais voltaria a acontecer. Jamais.

The Sleeping Beauty - DrarryOnde histórias criam vida. Descubra agora