Descobrindo o amor com Você

1

I

Aconteceu, naquela noite tórrida de sexta-feira, exatamente como teria acontecido na TV, em um filme, no momento de conflito de uma comédia romântica — ou em literalmente qualquer novela mexicana. O momento e a circunstância do flagra tão perfeitos que não conseguiriam repetir nem se tivessem ensaiado. Todos os personagens no lugar certo, na hora certa...
fazendo a coisa errada.

“Calma, amor, eu posso explicar”, Langjiao disse, com calma simulada, levantando-se da cama, ajeitando a roupa amarrotada no corpo, adiantando-se um passo em direção ao marido, Wang Yibo, que permanecia imóvel na porta do quarto, bem no limiar.
Sobre a cama, abotoando a camisa às pressas, estava o amante, Xiao Zhan, que por sorte ainda não tinha chegado a abaixar as calças para piorar a situação.

“Ah, pode?”, o marido perguntou sem alterar o tom de voz.

“Eu e o Zhan, a gente... A gente só tava... ahm...”

Fazendo gestos desconexos, buscando algo em que pudesse sustentar qualquer mentira, procurando um álibi nos olhos do amante constrangido, Wang Lingjiao não quis dar o braço a torcer; ela acreditava mesmo que, se tivesse tempo o bastante, conseguiria encontrar uma justificativa para o injustificável e fazer aquela cena, um flagra gritante, parecer um mal-entendido. Mas ela falhou.

“Eu vou embora”, Xiao Zhan, o amante, disse, sentando-se à beira da cama para calçar os sapatos.

“Não, não: eu  vou embora. Divirtam-se”,
Yibo respondeu. Deu meia volta, deixou sua maleta e o paletó em cima do sofá e saiu do apartamento.

Sem briga, sem choro, sem drama.

Aquilo era o típico Wang Yibo: o homem sóbrio, que saía de cena para não agir com a cabeça quente e se arrepender depois; aquele que, em uma situação em que qualquer homem  teria feito um escândalo e partido para a briga, fosse com a mulher ou com o amante ou os dois, simplesmente batia em retirada sem causar nenhuma comoção. Extremamente pacífico; extremamente frouxo.

Langjiao respirou fundo, levou uma mão à têmpora e com a outra cobriu os olhos. Não sabia se se sentia mais nervosa pelo flagra ou pela falta de reação do marido. Não que estivesse fazendo aquilo de propósito, esperando uma reação, mas algo dentro de si, em seus instintos femininos mais ardilosos e vingativos, que a desafiavam a agir de forma inconsequente, só pelo prazer de provocar; algo dentro de si fazia ecoar uma voz malévola que sussurrava “E se ele descobrir?” .   Bem, ele descobriu, e nem assim deu a ela o que ela queria.

O que ela queria era que o marido fosse um homem de verdade, com H maiúsculo, alguém como Xiao Zhan, o amante: forte, viril, alguém que a comesse e a bebesse, que a fodesse de verdade, para valer, que tirasse seu fôlego e a fizesse gozar até pedir chega; e não alguém que fizesse amor  com ela uma vez por semana antes de dormir.

“Me desculpa”, ela disse, voltando-se para o amante, “ele falou que tinha reunião até tarde hoje, não imaginei que...” — e deixou a justificativa incompleta.

“Você é maluca, Langjiao?!” Xiao Zhan se levantou de supetão. “Você é casada?! E nunca me falou nada?!”

“Bom... Agora você sabe.” .

Um erro atrás do outro: ter enganado o marido, ter mentido para o amante, ter se casado... Se ela tivesse dito a verdade desde o início, no entanto; se Xiao Zhan soubesse que ela era casada, talvez ela jamais tivesse tido a chance de se deitar com ele. Era uma oportunidade boa demais para desperdiçar assim, colocando todas as cartas na mesa, contando a verdade, a verdade, sempre A Verdade. Que se danasse a verdade: ela precisava correr o risco, viver a aventura.