No dia do crime - Capítulo 8.

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Rafael,

Era tarde quando eu me levantei da cama com os gritos da minha mãe. Ela estava tendo um daqueles ataques de pânico que tinha desde a ida da minha irmã. Era tão triste a ver tão abalada, como se não conseguisse fazer nada por si mesma ou pelos outros. Mas eu sei que ela tenta de todas as formas não ceder as suas "fraquezas", mas isso definitivamente estava fora de seu controle.

Ela tinha uma papelada enorme nas coisas sobre a volta às aulas,  era muita pressão, minha irmã sempre ajudava ela nisso. Eu sou péssimo mas tento ao meu máximo para conseguir dar a mínima assistência. Eu ainda me culpo tanto. Deveria saber que não tive controle na doença dela nem na separação dos meus pais, mas é impossível não carregar esse fardo.

Fomos até a escola lá para de tardezinha, ficamos a maior parte na diretoria, ela precisava de alguém para dar apoio moral – até porque eu não tinha muito o que fazer – e eu estava lá para isso. Não gostava de a ver triste. A escola trazia muitas lembranças ruins para nós dois, foi lá que minha irmã lecionou suas últimas aulas de português. Além de que foi nesse mesmo estabelecimento que ela começou a apresentar os primeiros sintomas de câncer no fígado.

Saímos de lá umas dez e meia, mas antes ouvi muitos barulhos no fundo, fui checar o que estava acontecendo.

Um poste estava incendiando.
Pensei se tratar da agonia da vizinhança, mas agora eu sei que foi a morte do Pedro, se eu tivesse ido mais fundo, será que teria coragem de descobrir o assassino? Talvez a mesma coisa poderia ter acontecido comigo.

Morte a facadas. Brutal e cruel.

– Vamos mãe? – ela estava sentada na calçada, fumando um cigarro.

Um dos vícios proibidos por todos os seus médicos, mas depois de tudo que aconteceu, eu não a culpo por isso. Meu pai tinha problemas com bebidas por muito menos, ninguém o culpava. Então quem sou eu para dizer que é fraqueza?

Olívia,
Eram oito horas da noite, eu estava muito ansiosa para finalmente mudar de escola e não ter o Pedro sempre me cobrando coisas, que não eram minha responsabilidade. Agora me culpo tanto por tudo isso, realmente não queria que isso tivesse acontecido. Ele poderia ser o pior namorado do mundo, mas ninguém merecia isso.

Ninguém.

Fui andar com meu cachorro, estranhei o fato de Pedro não estar respondendo minhas mensagens desde cedo, pensei que provavelmente era porque eu tinha saído da casa dele, mesmo ele pedindo para eu ficar.

Mimado.
Eu pensei. Mas agora meio que o motivo está mais claro que nunca, não era o que eu pensei, era dez milhões de vezes pior.

Acabei passando pela calçada da escola por volta das dez e meia, tinham câmeras na frente, mas infelizmente, não haviam câmeras atrás. Me viram passeando com meu bixinho, que se recusava a voltar para casa, parecia até que sabia o que estava acontecendo e queria me contar de alguma forma.

Até que eu perdi o controle da guia, me fazendo ir até os fundos da escola. Estava um breu, pois o poste da estreita rua havia queimado. Peguei meu animal, até que briguei com ela, dizendo coisas como: "Você não pode fazer isso." Até que ele era educado, mas não podia se soltar da dona assim.

Encontrei o Murilo um pouco alterado na volta para casa, ele parecia bêbado. Mas não me importei muito. Era o último dia de férias, ele tinha o direito de passá-lo como preferisse. Acho que ele não me viu. Deve ter saído com alguns dos milhares de amigos que ele têm.

Murilo,

Sendo bem sincero não me lembro muito da noite retrasada, era comum eu beber muito mas dessa vez colocaram alguma coisa na minha bebida. Certeza. Eu tenho resistência, mas teve uma hora que eu não sabia mais o que estava fazendo, então resolvi ir embora, alguns dos meus amigos insistiram para eu ficar ou me deixarem em casa.

Mas eu já estava muito puto.
Amigos de balada me faziam ficar feliz pelos primeiros vinte minutos, depois era um saco continuar com eles. Eu só queria esquecer de tudo que tinha acontecido mais cedo, mas acabei lembrando mais disso do que o que realmente eu deveria.

Lembro que sim, vi uma movimentação atrás da escola, meio estranha, mas mal estava conseguindo ficar de pé, não acho que ajudaria muito.

Sendo sincero, não ajudaria em nada.

Sei que pode parecer que estava alcoolizado o suficiente para não perceber a Olívia. Mas isso era meio impossível. Só fingi que não a vi, era melhor.

Para nós dois.

Amanda,

Meu dia foi de mudança, bem cheio e bem corrido. Mas queria dar uma volta pela rua que eu morei por tantos anos da minha vida. Me mudei faz algum tempo e queria refrescar a memória. Era tão lindo, eu amo cidade pequena, tive que me mudar pois minha "mãe" – madrasta, mas a única figura materna que eu já tive – insistiu.

Ela queria que eu tivesse novas experiências na cidade grande.
Bobagem.

Mas depois do que aconteceu aqui, sinto que seria mais seguro morar por lá mesmo.

O Pedro foi meu primeiro namorico, lembro que ele me deu meu primeiro beijo e eu fiquei completamente obcecada por ele, tanto, que chegava a ser meio doentio. Ele não tinha a beleza de um Deus tipo o Rafael, mas era bonitinho. Rafael não sabia disso, pois antes de me mudar eu o disse que gostava dele, mas era uma tentativa desesperada de fazer ciúmes ao Pedro. Mas acabei me encantando.

Ele tinha uns olhos lindos, um cabelo encaracolado que eu poderia me perder nas curvas e surfar uma maratona.

Com minha mudança tive que deixar os dois amores para trás.

Agora um deles estava...
Morto.

No dia da desgraça, eu passei sim pela escola, por volta de umas dez e trinta e cinco, corri pois a rua detrás estava sem energia, e eu morro de medo do escuro. Foi por isso que apareci nas câmeras de segurança.

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⏰ Última atualização: Jun 03, 2023 ⏰

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