Traumas

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Tóquio, mesmo dia 6:00 P.M.

— Não acredito que você mora sozinha! De jeito nenhum.

Nomu Chi e Aiko voltavam do trabalho na livraria juntas. Após um dia ocupado, Aiko finalmente estava voltando para casa. Nomu Chi a perguntou onde morava e fez questão de acompanhá-la até lá. No meio do caminho, o assunto sobre com quem Aiko morava surgiu e apesar da ruiva ficar desconfortável sobre ele, se esforçou para poder responder à Nomu Chi.

— É sério... minha mãe não está mais lá. — Aiko pois as mãos no bolso para poder esquentá-las.

Na visão de Nomu Chi ela estava extremamente fofa. Os cabelos ruivos soltos enfeitados por um aquecedor de orelha cor de rosa em formato de coelhinho. Estava com um casaco de moletom branco com detalhes em rosa, uma saia rosa e polainas brancas peludas. O rosto, rubro pelo frio e a respiração leve a deixavam com um ar de fofura. Nomu Chi desviou seu olhar e começou a fitar as vitrines.

— Não precisa falar sobre isso comigo... Se te faz sentir melhor, também não tenho muito contato com minha família. — Nomu Chi fala friamente sem olhar ou prestar atenção em nada.

— Primeiro, não fale isso!!! É muito triste não ter contato com sua própria família. — Aiko interrompe a caminhada de Nomu Chi, se posicionando em sua frente — E segundo, não importa o que diga, eu sei que posso confiar em você.

A expressão de raiva deixava Aiko ainda mais fofa na opinião de Nomu Chi, que não pode se segurar e começou a rir. Aiko ficou mais irritada, mas começou a reparar novamente na beleza natural de Nomu Chi. Era magra e mais alta que Aiko e mesmo no frio usava uma camiseta regata preta, com uma calça cargo estilo Y2K e um colar de rubi. Não tinha como ficar brava com Nomu Chi enquanto ela estava tão feliz.

— Um dia, quando cheguei em casa depois da escola, achei um bilhete em cima da bancada da cozinha. Era um bilhete de despedida. — Aiko começou a falar e Nomu Chi não a interrompeu — Jamais pensei que minha mãe me deixaria, mesmo após nossos longos anos de maus entendidos e brigas diárias. A verdade é que meu pai a abandonou durante a gravidez e mesmo que ela tenha cuidado de mim durante meus primeiros anos de vida, sempre me pareceu que ela me culpava pelo fim trágico de seu relacionamento.

— No verão do ano passado ela conheceu um cara em algum café ou algo do tipo e eles começaram a se encontrar e logo passaram a namorar. Ele também era viúvo e tem uma filha alguns anos mais velha que eu, da qual minha mãe sempre me implorou para que eu mantivesse um bom relacionamento. Nunca me coube decidir qualquer coisa sobre a relação deles, mas se eu soubesse que eles se casariam, poderia ter impedido que ela fosse morar com ele e me deixado aqui. Ela nem ao menos fez questão de me avisar com antecedência...

— Apesar de eu ter 18 anos, nunca me dei ao trabalho de montar uma lista de compras e nem de decorar as seções do mercado para já saber onde tudo está de cabeça. Fui pega de surpresa pela notícia e não tive nem tempo de me preparar. No início era um horror, eu sempre acordava atrasada por ir dormir tarde e consequentemente chegava atrasada na escola. Durante a tarde, me concentrava em fazer o máximo de lição de casa possível, mesmo tendo tantas que estavam com um mês de atraso e cada dia tenho uma tarefa doméstica diferente; amanhã farei compras... Sem contar o fato de que cozinho todo dia e lavo louça sem parar, como se tivesse um poço gigante produtor de sujeira, porque nem parece que eu moro sozinha com o tanto de louça que eu sujo. — Aiko finalizou com pesar e humor.

— Haha... Desculpe!

— Não tem problema. Gosto quando você ri... — Aiko disse virada para frente, sem se atrever a virar o rosto vermelho apesar de saber que estava sendo observada.

— Aiko... Aiko! — Nomu Chi chamou-a até ter sua atenção — Eu estou aqui, ok? Estou aqui e vou ficar aqui sempre que você precisar de mim...

Aiko parou de caminhar e Nomu Chi parou a sua frente. Elas se encararam por um tempo e Nomu Chi estendeu a mão em direção a Aiko, que observou a proposta tentadora à sua frente: Ter alguém para me apoiar? Ter alguém em quem confiar... eu posso?

Ela pegou na mão de Nomu Chi que a puxou para um abraço enquanto grossas lágrimas faziam caminho pelo rosto rubro de Aiko.

— Está tudo bem. Eu estou aqui agora... — Nomu Chi a reconforta enquanto acaricia os cabelos ruivos.

ฅ^•ﻌ•^ฅ 

Gota de sangueOnde histórias criam vida. Descubra agora