Uma mulher

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Lucas veio até Pedro e disse, depois de mais de dezessete anos de amizade, sem mais, nem menos.

- Eu estou indo para a Indonésia. 

- Caralho. Que foda. Vai quando?

- Em duas semanas.

- Porra, maneiro. E vai quem? Tu vai sozinho?

- Vou com minha irmã.

- Caralho, ela vai pirar nas praias lá. Mas dizem que lá é poluído também, cheio dos plásticos medonhos na água. 

- Eu vou para fazer uma operação de redesignação sexual. 

- Que porra é essa?

- Tu sabe que porra é essa. A gente falou disso não tem nem uma semana.

- Tu vai fazer essa porra por quê?

- Por que tu acha?

- Caralho, cara. Que doidera. 

- Doidera é continuar desse jeito. Cê entende?

- Entendo, mas cê entende que cê tá matando meu amigo?

- Sim. Desculpa.

- Tá tranquilo. Bora beber hoje, então? A última. 

- Bora.

Saíram e beberam bastante. A música alta confundia a fala. Pedro conheceu Bianca e eles ficaram. Lucas já sabia que não gostava de meninas e naquele lugar não havia meninos para ele. Quer dizer, havia o garçom. Ele percebeu. Houve um olhar e o funcionário do estabelecimento fez um sinal, na direção dos fundos. Pedro se enfiava na boca de Bianca, como Lucas se enfiava na boca de Alejandro. Os dois obtinham prazer vindo dos corpos que gravitavam ao seu redor. Lucas, porém, não queria mais sentir prazer através daquele corpo. Queria habitar um novo casulo e fazer uso de uma identidade mais em harmonia com as suas vontades de se expressar. Havia muito conflito com aquelas formas e o que ele queria dizer. 

A viagem de Lucas demorou. Pedro perdeu a conta do quanto esperou o amigo voltar. Achava na verdade que aquilo tudo era uma loucura passageira. Não havia se dado conta de nada, naquela noite da festa. Começou a andar de patins para jogar hóquei com os caras do Aterro. Comprou um par de inlines estilosos e começou a patinar de duas a três vezes por semana, pra pegar ritmo, controle e habilidade. Foi numa dessas noites, patinando com o povo de Botafogo, que Pedro reconheceu Mirela, a irmã de Lucas, sentada no bar do ringue de patinação. Fez um giro e rapidamente mudou o curso, dirigindo-se para a mureta. Quando parou o próprio corpo com as duas mãos, fazendo barulho na estrutura de ferro, gritou.

- MIRELA! 

- OI!

- CHEGA AÊ!

- Oi!

- Tu tá aqui desde quando?

- Chegamos na semana passada.

- Lucas também?

- Então, a gente tem que falar sobre isso. Mas primeiro deixa eu te apresentar minha amiga do curso de inglês. Ela é daqui também. CAMILA!

- Tu conheceu ela na Indonésia?

- Não, em Israel. Claro, né. Oi. Amiga, esse aqui é o Pedro.

- Oi, Pedro.

- Oi, Camila. Prazer.

Trocaram beijos nas bochechas e começaram a conversar. Os três deixaram o lugar e foram comer em uma lanchonete, que não era nem o McDonald's ou qualquer outra dessas que se conhece o nome. Nenhum sinal de Lucas. Ele provavelmente tinha ficado em Jacarta e não voltaria até concluir o que tinha ido fazer.

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