Seis

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Em uma preguiçosa tarde de sábado, quando eu conseguia ficar tranquilo em casa o dia todo, Seoltangie alternava seus cochilos entre o parapeito da janela e a minha cama. Era um alívio poder ficar sozinho com ele, em casa, enquanto meus pais cuidavam do negócio da família.

Eles tinham um pequeno restaurante que fazia certo sucesso entre os estudantes da região por servir refeições mais baratas no almoço e também no jantar. Minha mãe contribuía com seu talento na cozinha, e meu pai contribuiu dando a brilhante ideia de servir apenas o mesmo prato durante cada dia, para economizar nas compras. Ele era muito metódico, mas no final das contas as coisas acabaram funcionando muito bem, e logo ambos trocaram suas carreiras anteriores pelo restaurante.

Os dois haviam me criado muito bem, e agora que eu já tinha idade suficiente para cuidar de mim mesmo, era bem comum ficar sozinho em casa nos fins de semana. Às vezes eu passava algumas horas na casa de algum dos meus amigos, mas agora eu fazia questão de passar mais tempo com meu gatinho.

Já fazia semanas que ele morava escondido em meu quarto, e muito provavelmente as coisas melhorariam com um pouco mais de tempo. Jiwoo me enviou uma mensagem há alguns dias, dizendo que minha mãe já estava convencida de que eu teria responsabilidade para cuidar de um bichinho, mas meu pai ainda não gostava tanto assim dessa ideia. Ainda.

Nós já tínhamos toda a história ensaiada: em uma das tardes que eu saí com Taehyung e Namjoon, paramos para conversar e comer algo, e um gatinho branco começou a nos seguir. Nós brincamos com ele um pouco, e quando era hora de ir embora, ele não queria mais sair de perto de mim. O gatinho era tão tranquilo, e tão bonzinho, que acabei o levando para casa... e o fato de que ele já se acostumou em uma noite a ser chamado pelo nome que eu escolhi... não significa nada. Talvez signifique apenas que ele já tivesse se apegado. Só isso.

— Ei, como você está hoje? Quer sair comigo um pouco?

Seoltangie já havia dado uma volta ou outra pelos telhados das casas ao lado, e agora apenas observava o movimento da rua lá fora. Ele olhou para mim por um instante e soltou um profundo suspiro.

— Oh meu Deus, você é muito fofo, sabia? - Eu disse, indo até ele para lhe fazer um carinho.

Ao sentir dois de meus dedos coçando a parte de trás de suas orelhas, ele fechou os olhos e começou a ronronar. Eu sorria como um idiota enquanto ele fazia coisas extremamente simples como essa.

— Eu quero muito poder mostrar você logo para os meus pais. Acho que eles vão gostar de você quase tanto quanto eu, porque vai ser impossível alguém gostar de você mais do que eu gosto.

Dei um beijo em sua cabeça e ignorei sua vontade de continuar observando a paisagem lá fora, pois eu havia decidido que ele ficaria deitado comigo agora. Ao colocá-lo sobre meu peito, Seoltangie iniciou seu longo processo de tornar meu moletom o mais confortável para si usando suas pequenas patinhas. Cantarolei um pouco, com uma voz bem irritante para qualquer um que me ouvisse, mas era algo que parecia deixar Seoltangie feliz.

Quando ele finalmente se deitou sobre mim, com seu rosto de frente para o meu, voltei a fazer um leve carinho atrás de suas orelhas. Normalmente, ele fecharia seus olhos instantaneamente para aceitar o afago. Dessa vez, ele seguiu me observando de olhos bem abertos. Dois gigantes olhos amarelos, um deles adornado com uma cicatriz, me encarando bem de perto.

— O que foi? Você quer me contar alguma coisa?

Cutuquei seu focinho com um dedo e ele piscou, incomodado.

— Eu vou falar, então. Eu vou falar que eu gosto muito de ter te encontrado. Eu estava me sentindo bem sozinho antes de você aparecer... e acho que você também devia estar, não é mesmo?

Seoltangie miou em resposta, e acreditei que aquilo era um "sim".

— É claro que eu tenho os meus amigos, mas isso é diferente. Jiwoo não está mais aqui e eu nunca arranjaria um namorado pra me fazer companhia quando o dia acaba. Então eu acho que sobrou tudo pra você, não é mesmo? Acho bom você se acostumar a ser abraçado com força de vez em quando, pois é assim que vai ser aqui em casa se você realmente for morar aqui.

Seus olhos se fecharam e Seoltangie começou a ronronar.

Não era como se ele reagisse mal a ser abraçado, de forma alguma. Eu só ficava um pouco receoso de fazer algo que o desagradasse, já que ele era um gato tão pacífico, que nunca reclamava de coisa alguma...

Conforme os dias iam passando, Seoltangie ia ficando cada vez mais acostumado com nossa rotina de segredos e esconderijos, e muitas vezes parecia até entender exatamente o que eu falava. Ele usava as noites para passear pelos telhados apenas até onde eu poderia vê-lo, e voltava logo em seguida para jantar.

Quanto a meus pais... era quase a hora de revelar tudo. Minha mãe logo já estava ativamente em busca de um bichinho para mim, e meu pai... bem, ele teria que se acostumar com a presença de Seoltangie uma hora ou outra. Na verdade eu estava bem tranquilo pois quando ele percebesse quão inteligente e independente Seoltangie era, ele nem se importaria com sua presença em casa.

Enquanto essa hora não chegava, eu precisava ter certeza de que Seoltangie estava sendo bem cuidado, alimentado, e tratado com muito amor. Mesmo que ele fosse apenas um animal, eu sabia que palavras tinham seu valor. Então todos os dias, antes de pedir que ele ficasse bem quietinho dentro do mesmo lugar por tantas horas, eu segurava seu rostinho peludo para dizer a ele o quão amado ele era, mesmo dentro daquele espaço limitado que era o meu quarto e, logo logo, em todos os espaços que ele pudesse ficar por toda a casa.

climb to my roomOnde histórias criam vida. Descubra agora