Seus dedo úmidos por saliva recolhiam os farelos do pão seco que guardava há poucos dias, trêmula e insaciável, passou o dedo fino pela abertura da máscara e logo, uma feição distante tomou conta de seu rosto quando percebeu que havia acabado e que seu estômago ainda estava dolorido de fome.
Davina se recolheu, sua magreza esculpida por músculos era flexível e ela podia se encolher como uma ratinha, pelo menos era essa a descrição que Cairn usava quando via a cena dolorosa. O movimento trouxe um choque de formigamento para todo seu corpo inerte, e o tilintar das correntes soassem como uma música horrorosa, provavelmente, suas mãos e tornozelos estavam sangrando, talvez seu pescoço ou os joelhos, era difícil saber distinguir o suor de sangue, as inúmeras correntes faziam essa confusão ficar viva em sua cabeça.
Havia apenas 30 minutos que foi liberada do treinamento, foi árduo, e cansativo como todos os outros, tanto que suor ainda escorria em gotas lentas por seu rosto, correndo por suas bochechas e travando na ponta do nariz, para finalmente cair nos lábios; Davina não reclamava, estava com uma sensação seca na boca, que se estendia por sua garganta de forma dolorosa, um pouco do seu suor pelo menos enganava sua cabeça.
Ela enterrou a cabeça entre o vão das pernas, não torceu o rosto como fazia no começo, ja estava acostumada com a dor do ferro por todas as partes do corpo, isso não era o que machucava, a dor física se tornou um alívio, tinha um significado enorme: Ainda estou viva, não morta. Porém, Davina não sabia se isso era o suficiente, ela não sabia se continuar viva era um grande significado, talvez sua morte significasse mais, só talvez, ela devesse implorar para que não a entregassem mais um pão por semana e o cantil com água; Assim seu estômago logo sofreria de fome, e ela secaria sem água.
Sede ou fome, não importava. Era a escuridão, a frieza e a solidão que tocavam sua alma como diversos espinhos que podiam perfurar sua pele. Agora, sua cela feita de ferro estava escura, sua minúscula abertura da porta estava fechada e os guardas lá fora estavam entretidos demais para atormenta-lá, era exatamente em momentos assim que as coisas vinham a tona, os sentimentos que mais escondia; sua dor e os sentimentos.
Parou de contar há muitos anos, as marcas envelhecidas na parede marcavam algo como 101, Maeve se certificou de retirar qualquer material que pudesse ser entretenimento, assim, Davina estaria mais inclinada a se envolver nas conversas, mas, Maeve não tinha vindo visitar sua sobrinha hoje e deixou Davina sozinha. Era terrível que Davina esperasse por uma visita? Eram os únicos momentos que sua mente era distorcida por momentos bons e antigos, e ela finalmente podia viver a paz de minutos mentirosos, mas parecia, que hoje não era seu dia.
Talvez Davina tenha zombado dos deuses sem intenção, talvez tenha feito algo de muito errado, quem sabe se não encobriu um assassinato sem perceber? Ou se até mesmo cometeu assassinato... Mas, assassinato era o suficiente para sofrer tanto? E, especificamente, era o suficiente para ver a garganta de seus pais serem abertas na sua frente e logo ser enclausurada em um inferno minúsculo feito de ferro fundido? Bom, no fundo, ela desejava ter feito algo grande, porque, manter uma garota de 10 anos presa por centenas de anos até parar de contar, era a coisa mais cruel que ela imaginava. Não as torturas, as dores, os treinos forçados, mas sim o cativeiro, sim a solidão, e sim o afastamento do sol, do ar, do céu, de quem ela era antes, de quem ela mais amou.
O mundo era bom e vivo, completo e significativo quando seus cabelos prateados ainda eram trançados pelas mãos habilidosas da sua mãe, quando ainda esperava o pai das caçadas e todos os dias, quando dormia no mesmo quarto que seu irmão... Não, ela pensou, não pense nisso. Mas como não pensar? Como negar a situação; seu suor e sangue logo se misturaram com breves e silenciosos caminhos de lágrimas.
Seu nariz tremeu quando o cheiro forte encheu suas narinas, a fazendo segurar a respiração e se arrastar para o chão, ambas as mãos estavam erguidas. Estou desarmada, era o que significava, não vou atacar, não me bata, não me torture. Não de novo. Ainda assim, mesmo que a presença masculina não a tocasse de fato, ainda era difícil conter o tremor.
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Império Das Sombras | 𝐅𝐞𝐧𝐫𝐲𝐬 𝐞 𝐆𝐚𝐯𝐫𝐢𝐞𝐥
Fanfiction"Até onde a escuridão pode levar uma alma?" Davina enfrentou uma prisão angustiante nas mãos impiedosas de Maeve por dois séculos. Dotada de um poder formidável capaz de desfazer e reconstruir o mundo, Davina viu suas esperanças se esvaírem quando A...