Capítulo 2

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Na entrada da enorme estrutura de pedra, Davina recebia vangloriações em forma de flores, aplausos e gritos estrondosos do povo, a guerreira vestida em uma armadura e montada em um exuberante garanhão branco sorria e acenava com elegância, fazendo sua montaria trotar mais rápido para que logo chegasse ao encontro daqueles que a esperavam.

Ao descer do cavalo, a feérica caminhou pelo pátio, um sorriso enorme desenhando sua bela feição, iluminando o olhar esverdeado.

— Ouvi as notícias — Rowan disse, pegando a espada já limpa de Davina.

— Eu sei — ela respondeu dando de ombros, inclinando lentamente a cabeça.

Eles caminharam para dentro do castelo, sendo cumprimentados por servos e soldados que ficavam na propriedade, Davina no entando, começara a sentir uma inquietação subindo por sua espinha, trazendo uma sensação molhada para suas costas.

— Nossa rainha não está muito feliz — ele anunciou, e o pequeno caminho que faltava para percorrer, em segundos, tornou-se um corredor interminável.

— Quando ela está feliz? — Questionou Davina, mas, sua voz que antes era cheia de petulância, saiu com hesitação.

Rowan parado à sua frente, balançou a cabeça em negação, algo como decepção tomando o rosto do guerreiro. Isso trouxe uma sensação gelada para a alma de Davina, que deu passos na direção dele, mas, o caminho que os separava parecia aumentar.

— Davina — ele grunhiu como um aviso. — Você sabe.

— Rowan, por que você está assim? — Sua pergunta saiu com toque de aflição.

— Maeve quer o seu dom, quando vai entender?

— Acabei de derrubar o reino vizinho, trouxe comigo as coroas nas cabeças dos governantes. — De súbito, Davina sentiu uma sensação amarga. — Maeve não está feliz com isso?

— Não é o suficiente — respondeu o guerreiro. — Ganhar guerras e trazer coroas para uma rainha como a nossa, lutamos por ela, damos tudo para ela. Mas você nega o que ela mais quer.

— Rowan — Davina o chamou, tropeçando nas palavras. — Eu não consigo... Esse poder, é fundo demais, não deve ser...

E ele a tocou, as mãos fortes e grandes apertando ambos os braços, de olhos arregalados, Davina sentiu sua respiração sumir, como se não existisse ar.

— Ela ficaria feliz... Eu ficaria feliz — ele murmurou.

Davina negou, balançando a cabeça, tentava falar, mas palavras não saíam. Solte-me, pensou, um grito na escuridão, não me toque.

Por favor, Dav.

Um estalo, e então, o choque subindo por todo seu corpo. O chicote de seis pontas rasgou outra parte de suas costas e Davina jurou ouvir um pedaço de carne cair, porém, ela continuou os repetitivos movimentos de guerra. Em suas mãos tinha uma espada de madeira, nunca ousaram a dar armas de verdade, mas, seus oponentes, eram 10 homens armados com espadas de aço. E só então Davina voltou para a realidade.

Outra ilusão.

Do outro lado da sala, Maeve ergueu o queixo com um sentimento sombrio no olhar, encarando Davina se esquivar dos adversários. Não era graciosa na luta, seus movimentos eram horripilantes, monstruosos, e, destrutivos, poderia acabar com 10 homens em cinco minutos, mas quando Maeve estava por perto, o treinamento era interrompido diversas vezes por ilusões assim, e quando Davina se negava novamente a ligar esse lado sombrio de poder, era retirada com um estímulo; na maioria das vezes eram chicotadas, facadas, cortes, e golpes, Davina agradecia quando o estímulo eram só esse tipo de coisa, e não os toques... No entanto, sangue escorria livremente, e o chicote não poupava as faixas que escondiam seus seios.

Davina se moveu, cada esquiva melhor que a outra, esperando, apenas mínimas palavras...

— Acabe com isso — a voz de Maeve era fria como a morte.

Com 10 golpes sujos e drásticos, Davina derrubou todos em três minutos.

××××

Fenrys havia sido liberado para fazer suas necessidades, esses minutos, apesar de essenciais, eram uma das torturas que tinha que passar, a maneira como sua dignidade tinha sido tirada à força, o jeito que seu orgulho estava recaindo. Mas, mesmo que isso queimasse no fundo do seu âmago, era deixado de lado quando podia oferecer algo para Aelin... Aelin, o lobo se levantou, as orelhas baixas enquanto voltava. No entanto, sons vieram do corredor, sua atenção foi puxada para o risco das correntes, os ecos que se misturavam na propriedade.

Impossível, ele pensou. De olhos arregalados e orelhas erguidas, Fenrys encarou a figura coberta por metal, puro ferro ardente, correntes nos tornozelos, braçadeiras de ferro nos joelhos, grilhões em seus pulsos e cotovelos cobertos, a coleira que era puxada... O ferro ligado a máscara que cobria toda a cabeça, existia pouco daquele corpo que não era tocado por ferro, quase nada, toda e qualquer parte estava enrolada por mais correntes. Como aquela feérica conseguia andar sem tropeçar? Ela sequer estava cambaleando, ao contrário, estava altiva, e a postura impecável, apesar do cheiro de sangue que todos podiam sentir, as gotas que marcavam seu caminho.

— Sabe o que são cinco minutos, Fenrys? — Cairn grunhiu da porta, o guerreiro feérico olhou na mesma direção que o lobo, mas não parecia tão surpreso quanto.

Outro soldado que Fenrys nunca ouvira falar, estava a puxando pela coleira, ele era diferente e sua aura parecia morta enquanto entregava a corrente à Cairn como se não fosse uma vida ali entre eles.

Silêncio absoluto, não existia nenhum ruído dela, nada que demonstrasse dor ou desconforto, isso aguçou ainda mais sua curiosidade latente. Quem seria ela? E por qual motivo Cairn estaria a colocando perto de Aelin? Uma armadilha talvez... O lobo deu um passo para ir ao encontro, porém, para sua surpresa, Cairn empurrou a feérica para dentro e as fechou sozinhas, um choro saiu de seu focinho quando arranhou a porta. 

— Fique, Fenrys — Cairn ordenou.

Mais do que nunca, ele odiou Maeve, mais do que nunca, Fenrys queria entrar.

××××

Desconforto era a principal palavra que descreveria Aelin. O sangue, a dor, a saudade... Dentro do caixão, ela respirou fundo, e ao inspirar o cheiro de ferro tão forte, era como ser nauseada por drogas. Ela queria chorar, não pelo pequeno espaço, não pelas ilusões que acabam com sua mente, e muito menos pelas torturas, mas, era ele... O que ela perdeu, o tempo emprestado que ela usou com tanto fervor.

E agora, com Cairn a rondando como um animal predatório, ela queria agir, porém, sabia que não poderia. Manteve os olhos abertos quando o caixão foi aberto, engolindo em seco quando as correntes foram presas com mais força aos pulsos e tornozelos, qual vai ser a tortura hoje? Ela pensou, mas, Cairn se afastou e a próxima coisa que Aelin viu entre os pequenos furos nos olhos da máscara, foi outra figura aprisionada.

Ela se lembrava. O olhar escurecido com um brilho opaco encarou Aelin através da máscara mais grossa e pesada, fazendo com que um questionamento queimasse livremente em sua cabeça: é uma ilusão?

A feérica ficou parada perto da porta, quieta, imóvel, segurando as correntes com seus dedos livres, não parecia se queixar de dor, mas, o brilho doloroso que tremia em sua garganta em pequenas gotas de suor, mostravam a dor que a marcavam não só fisicamente, mas também, dentro da alma.

Aelin piscou três vezes, você está bem? Era o significado. O cheiro de sangue era perceptível e o breve tremor nos músculos também, quem ela era? Por que estava ali? E o mais importante, por qual motivo Maeve tinha aquela feérica? Aelin esperou alguma coisa, encarando a feérica com olhos atentos, mas não houve resposta. Seu coração se encheu de um sentimento assustador, sentia que não estava mais conseguindo separar a realidade das ilusões... Fechou os olhos com força, e permaneceu assim, por quanto tempo fosse necessário.

O ar estava ficando pesado sempre que abria os olhos e aquela figura permanecia parada e estática, imóvel em sentimentos amargurados. O quanto Maeve queria brincar com sua cabeça? O quanto Aelin aguentaria.

Na próxima vez que abriu os olhos, a figura acorrentada havia sumido.

Império Das Sombras | 𝐅𝐞𝐧𝐫𝐲𝐬 𝐞 𝐆𝐚𝐯𝐫𝐢𝐞𝐥Onde histórias criam vida. Descubra agora